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Liam e Noel transformaram peças comuns em códigos de estilo. Anoraques, tênis Adidas, parkas e referências Mod saíram das ruas de Manchester para virar identidade visual global. O “estilo Gallagher” não nasceu de uma construção fashion, mas de escolhas consistentes e de marcas que acompanharam a dupla desde o início. Adidas, Umbro, Stone Island, CP Company, Fred Perry e Kangol moldaram essa estética ao longo dos anos 90.
Três décadas depois, jaquetas jeans, buckets e Samba Adidas voltam ao ciclo cultural. É um retorno ancorado por nostalgia e estilos que nunca foram enterrados.
As referências acima se apoiam no ensaio de Karl PM no Fashion Thinking publicado há mais de três meses. “Working Class Heroes: How Oasis Shaped Fashion Forever” revisita a relação dos irmãos com a moda e cultura em meio ao revival da banda e de seu Britpop.
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Dados do The Fashion Law mostram que as buscas por “Oasis merch” no Google dispararam a partir de agosto. Na semana passada, o Daily Mail projetou que os irmãos Gallagher podem garantir até £400 milhões com os 41 shows globais.
Quando 25 apresentações foram completadas no fim de setembro, o Celebrity Netwhorth estimou algo em torno de US$ 30 milhões em venda de produtos, com cerca de 25 milhões de lucro líquido até o fim do tour, encerrado ontem depois da segunda apresentação no MorumBIS.
Os Gallaghers nunca se posicionaram como pop stars polidos. Surgiram como torcedores de futebol com guitarras, parkas, humor agressivo e a autoconfiança da classe trabalhadora. Uma imagem que gerava identificação imediata porque era familiar e transmitia pertencimento.
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A leitura mais precisa desse fenômeno está no relato de Ross Taylor, da Havas Play UK, em artigo no The Drum após um dos shows em Wembley, em julho. Ali, Taylor sintetizou o sentimento mais profundo da legião mais fiel:
“O Oasis deu aos fãs de música a mesma identidade tribal que o futebol dá aos seus torcedores: lealdade, rivalidade, caos, pertencimento, com uma dose monumental de emoção.”
Para Taylor, “o fandom não tem a ver com gosto. Tem a ver com tribo”. E o merchandising participa diretamente desse processo ao oferecer códigos de identidade prontos para adoção e expressão coletiva.
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O comeback histórico do Oasis e os shows derradeiros deste fim de semana em São Paulo, somados à repercussão global da turnê, representam um dos raros momentos de monocultura na era do algoritmo e da mídia fragmentada.
Escolhi a colaboração dos irmãos com a Adidas para ilustrar a dimensão midiática e social desse evento. A marca acompanhou Liam e Noel por três décadas e soube ocupar o espaço emocional dessa volta.
Oasis & Original Forever é uma conversa legítima. Ela amplifica o simbolismo, resgata códigos e se conecta a um dos poucos eventos culturais capazes de unificar experiências e mobilizar as massas.
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A monocultura possível
“Haverá algum momento cultural global mais impactante em 2025 – ou além – do que a reunião do Oasis?”
A Johannes Leonardo já havia identificado o potencial monocultural do reencontro dos Gallagher em julho, ao detalhar os bastidores da campanha da Adidas Originals para o Oasis.
Em artigo no Little Black Book, a agência de Nova Iorque contratada deixou claro que a Adidas não entrou na fila das marcas que tentaram surfar a turnê.
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“Basta olhar para o catálogo antigo e a infinidade de imagens da banda tiradas nos anos 90 e início dos anos 2000 para perceber que a Adidas é uma constante ao longo do tempo.”
A prova de continuidade histórica mencionada por Steve Marks, diretor sênior de comunicação da Adidas no Reino Unido, é fundamentada por meio da coleção de 26 peças que se apoia “em um DNA cultural comum, onde futebol, música e moda coexistem sem esforço.”
E esse é o ponto central. A campanha parte de uma legitimidade já estabelecida. Jeph Burton, diretor executivo de criação da Johannes Leonardo, reforçou a vantagem competitiva desse contexto:
“Grande parte da publicidade consiste em fazer com que as pessoas se importem. Com esta campanha, tivemos o raro privilégio de contar com um público que já se importava. Profundamente.”
Ou seja, não é um público em processo de convencimento. Eles estão trabalhando para uma base de fãs pré-disposta, que atribui significado tanto ao Oasis quanto à Adidas.
A construção criativa foi organizada em três frentes: “alegria” para quem viveu a primeira fase; “recordação” para quem ficou fora naquele período; e “reimaginação” para a nova geração que encontra o Oasis agora.
Essa divisão orientou tanto o produto, conectado a momentos reais da trajetória da banda, quanto a comunicação, que precisava equilibrar nostalgia com contemporaneidade.
A operação criativa
Agência e marca precisaram alinhar-se para debater sobre o significado cultural de reunir Oasis e Adidas neste momento.
O curta principal, de três minutos, usa um novo arranjo de “Live Forever” como trilha e percorre momentos-chave da história da banda. Do presente a Knebworth e Wembley, a narrativa acompanha fãs atravessando diferentes eras. A intenção foi recuperar a experiência emocional que sustenta o imaginário em torno do Oasis.
A frase de Noel — “As pessoas jamais esquecerão como você as fez sentir” — funcionou como norte criativo. Ela desloca o foco do retorno presencial para o valor simbólico acumulado ao longo de três décadas. A campanha minimiza o passado para mirar a continuidade de um sentimento que permanece ativo.
Esse raciocínio se conecta ao posicionamento de Adidas Originals, “The Original”, que celebra quem segue seu próprio caminho. A imagem dos fãs em crowd surfing ao longo das décadas simboliza como é atravessar o tempo mantendo o mesmo impulso emocional.
Foi desta maneira que Adidas e Oasis transformam a colaboração em um dos poucos momentos recentes em que uma experiência coletiva volta a ter escala global.
A operação no Brasil
No Brasil, a coleção adidas Originals x Oasis LIVE’25 chegou às lojas no dia 14 de novembro, com distribuição concentrada em São Paulo. A demanda foi imediata, e na semana que antecedeu aos shows, as principais peças já estavam esgotadas. Hoje, os itens restantes podem ser encontrados na recém-inaugurada loja adidas Originals em Pinheiros.
Pedi dados de vendas, mas a marca não informou. A Adidas reforça que a colaboração nasce de uma relação cultural construída desde os anos 90 e que a campanha “Original Forever” busca atualizar essa conexão para um público que redescobriu o Britpop. Segundo a empresa, o desempenho no Brasil seguiu o padrão de outros mercados, onde os produtos também ficaram indisponíveis rapidamente.
Embora a loja oficial da turnê não seja operada pela Adidas, a marca destaca que a procura por agasalhos Firebird, camisetas retrô e acessórios clássicos sustentou o fluxo elevado nas lojas físicas e no online durante o período do lançamento.
Com a turnê mobilizando fãs novos e antigos, a coleção encontrou terreno natural no Brasil, impulsionada pela combinação de nostalgia e oferta limitada.
O que resta da monocultura
Voltei ao tema da monocultura no universo Oasis mais de um ano depois de ter escrito sobre o impacto imediato do anúncio dos shows no Brasil, quando a confirmação da turnê dominou as conversas sociais.
O retorno dos irmãos para um último rock também marcou a maior busca global da história da banda, reforçando a trégua pública iniciada para celebrar o retorno triunfal.
Ao usar o Google Trends como um proxy para medir a repercussão de momentos monoculturais, Nick Susi trouxe a reconciliação dos Gallagher como um case isolado de um evento midiático e social criado não por causa de uma guerra, mas pelo fim dela.
Entenda a monocultura descrita pelo estrategista como um acontecimento unificador de experiências culturais e que é compartilhado pelas massas.
Em junho do ano passado, o VISIONS Summit: NYC reuniu 150 futuristas para explorar a interseção entre comércio e cultura, analisando como a monocultura determina um novo cenário para o consumidor no que chamam de “era moderna.”
Assim como Susi, os especialistas reconhecem a fragmentação dos meios, mas apontam que certos fenômenos ainda furam esse ruído e recuperam algo muito próximo de uma experiência coletiva.
A monocultura não desapareceu. Ela emerge quando certos eventos rompem a lógica de nichos e se tornam pontos de atenção inevitáveis. A volta de Oasis, impulsionada pela parceria com a Adidas, mostra como marcas atemporais carregadas de história conseguem atravessar plataformas e concentrar conversas.
Quem esteve no MorumBIS no sábado e no domingo viu uma Adidas & Oasis mania estampada em roupas e adereços. A prova cabal de que tudo ali foi, de fato, biblical.