Viver melhor vale mais do que qualquer IPO 

O futuro não será dominado por quem implementa tecnologia, e sim por quem souber equilibrá-la com humanidade

Marc Tawil

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

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O futuro nunca foi tão promissor – e tão perigoso. De um lado, avanços que prometem nos fazer viver mais, trabalhar melhor, ganhar mais dinheiro e até reinventar o que significa ser humano. Do outro, um mundo acelerado que corre o risco de trocar profundidade por eficiência, presença por produtividade, humanidade por algoritmos.

Nunca houve tanta tecnologia disponível. Nunca fomos tão inteligentes. Mas… será que estamos ficando mais sábios? 

No SXSW 2025, maior festival de inovação criatividade e tecnologia que acontece aqui em Austin, no Texas, uma coisa ficou clara: o futuro não será dominado por quem implementa tecnologia, e sim por quem souber equilibrá-la com humanidade.

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Inicialmente, três validações importantes:

  1. A Inteligência Artificial não é apenas um assistente digital, mas um ecossistema vivo que aprende, se adapta e toma decisões.

2. A computação quântica não é mais um experimento de laboratório. É uma revolução capaz de dobrar as leis da física e resolver problemas que hoje parecem impossíveis.

3. A fusão entre IA e biotecnologia não é uma possibilidade distante. Se trata de uma nova fronteira que pode redefinir a longevidade humana.

Sim, tudo isso é fascinante, contudo, a pergunta que realmente importa não é o que a tecnologia pode fazer, e sim “o que ela deve fazer”. 

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Enquanto o mundo se deslumbra com o que a tecnologia pode fazer, a questão real continua sem resposta: para que serve tudo isso?

A futurista mais festejada de Austin, Amy Webb, CEO do novíssimo Future Today Strategy Group, introduziu o conceito de “The Beyond”, um espaço de transição tecnológica e social em as regras tradicionais deixam de se aplicar para elevar a IA e a biotecnologia a um novo patamar de aplicabilidade. “O maior erro das empresas é reagir às tendências em vez de antecipá-las. A visão estratégica não pode ser um luxo – deve ser um hábito”, disse ela. “The Beyond não é uma metáfora, é uma inteligência viva. E essa inteligência viva vai reescrever as regras da nossa realidade como a conhecemos hoje — e nós não estamos preparados.”

Forte.

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Ian Beacraft, CEO e Chief Futurist da Signal and Cipher, resumiu a questão sem rodeios: “O trabalho, como conhecemos, está morrendo”. E ele não estava falando apenas de empregos que serão automatizados. O que está morrendo é a ideia de que basta aprender uma profissão, seguir uma carreira linear e se manter relevante.

Se antes uma habilidade técnica durava 30 anos, hoje dura dois. O futuro pertencerá a quem souber aprender, desaprender e reaprender rápido, a quem entender que não basta ser eficiente – é preciso ser criativo.

A IA gera relatórios, escreve códigos, cria campanhas e negocia contratos. O que ela ainda não consegue fazer é sonhar, conectar pontos improváveis, ter intuição. Isso significa que o diferencial humano não será a execução, e sim a imaginação. E, no entanto, estamos criando um ambiente de trabalho onde a criatividade está sendo sufocada pela avalanche de notificações, pela cultura do multitasking, pela ilusão de que ser produtivo o tempo todo significa estar um passo à frente. 

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Assisti igualmente Jay Graber, CEO do Bluesky, uma das poucas que provocaram abertamente Mark Zukerberg, usando uma camiseta que ele usou tempos atrás, e que alertou para outro sintoma dessa disfunção moderna: nunca estivemos tão conectados e nunca estivemos tão sozinhos. Para ela, não devemos apenas reclamar das plataformas, mas criar alternativas. “Se algo não funciona, as pessoas devem se sentir empoderadas para construir o que querem.”

As redes sociais foram criadas para aproximar, todavia, hoje são máquinas que transformam interações humanas em métricas de engajamento. O resultado? Uma Epidemia de Solidão, trazida em vários painéis e palestras.

Será que são as redes que precisam mudar ou somos nós que precisamos aprender a nos relacionar de outra maneira? Se a forma como interagimos com o mundo digital nos afasta das conexões reais, o problema não está só na tecnologia – está no uso que fazemos dela. 

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E o preço dessa desconexão já está sendo pago. Kasley Killam, especialista em Saúde Social, e palestrante de abertura do evento, trouxe um alerta que deveria estar no topo da agenda das empresas: “O Futuro do Trabalho está em criar rituais e uma cultura que apoiem a saúde social dos colaboradores, porque as pesquisas mostram claramente que, se uma organização não prioriza os relacionamentos, ela tem muito a perder”.

Não adianta falar em inovação se os times estão exaustos, se a cultura de trabalho gera isolamento, se os ambientes são tóxicos. Empresas que não investirem em conexões humanas vão perder talentos, produtividade e dinheiro. E não é só uma questão de retenção de funcionários – é uma questão de longevidade. 

Para mim, uma das três TOP palestras do SXSW 2025, a de Peter Attia, autor de “Outlive” e um dos maiores especialistas em longevidade da atualidade, trouxe um dado assustador: “A solidão reduz a expectativa de vida tanto quanto o tabagismo.”

Estamos vivendo mais, entretanto, estamos vivendo pior. A medicina está estendendo nossos anos e se não cuidarmos da qualidade desse tempo, de que adianta?

Trabalhar até os 80 pode ser um privilégio ou um pesadelo, dependendo de como estruturamos nossas vidas hoje. Viver bem será o maior diferencial competitivo das próximas décadas. Não basta acumular patrimônio se você não acumula experiências, não basta ter sucesso profissional se sua vida pessoal está desmoronando, não basta ser tecnicamente brilhante se você não construiu relações que sustentam seu crescimento ao longo dos anos. 

E aí entra um ponto crítico que Cheryl Miller Houser, da Creative Breed, destacou: “As histórias que contamos hoje moldam as sociedades de amanhã”. Ou seja, o futuro não será apenas definido por avanços tecnológicos, e sim pelas narrativas que escolhemos construir.

Aqui em Austin, assisti ao mesmo tempo a conversas que só aconteceriam aqui, nesse caldeirão onde quase todos se encontram. Vi Michelle Obama falar sobre resiliência e liderança em tempos incertos. O astro de Hollywood Ben Stiller, que dirige a série “Ruptura”, na Apple TV, discutir os paralelos entre ficção e o mundo do trabalho.

Lars Ulrich, do Metallica, e Tom Morello, do Rage Against The Machine e Audioslave, refletirem sobre o impacto da música na resistência cultural. E, como se não bastasse, John Fogerty, a lenda viva que escreveu “Have You Ever Seen the Rain?”, lembrar a todos que a paixão pelo que ele faz segue a mesma, prestes a chegar aos 80 anos, independente da época.

O que significa então “sucesso” em um mundo onde o tempo se tornou o ativo mais valioso? O que significa qualidade de vida quando o trabalho se confunde com lazer, quando o descanso precisa ser justificado, quando a rotina de alta performance nos transforma em operários digitais?

Se não soubermos responder essas perguntas, a tecnologia continuará avançando, ao custo daquilo que nos torna humanos. 

A equação é simples: não adianta viver mais, se você não souber viver melhor. Não adianta ter acesso a todo o conhecimento do mundo, se você não souber o que fazer com ele. Não adianta ser um profissional brilhante, se sua vida está no automático e sua rotina é pautada por métricas que não refletem felicidade real.

Estamos entrando em uma era onde dinheiro pode comprar anos a mais de vida, onde carreiras podem ser reconstruídas inúmeras vezes, onde a Inteligência Artificial pode fazer o trabalho pesado e nos deixar tempo livre para aquilo que realmente importa.

Estamos prontos para isso? Porque se a resposta for não, o problema não está no futuro. Está em nós.  Viver mais será uma conquista da ciência. Viver melhor será uma escolha pessoal. E essa escolha, no fim, vale mais do que qualquer IPO.

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Marc Tawil

Eleito em 2025 Nº 1 Especialista em Comunicação do LinkedIn Brasil pela plataforma francesa de dados Favikon. É Nº 1 LinkedIn Top Voices, Creator e LinkedIn Official Instructor com mais de 135.000 alunos treinados na plataforma e outros 50.000 alunos em outras Edtechs. Quatro vezes TEDxSpeaker e duas vezes TEDxMC, e membro do Conselho de Reputação da Ipsos. Prêmio Especial Vozes Influentes da Comunicação pela Aberje. Publicará, em 2025 pela HarperCollins, segundo maior grupo editorial do mundo, o livro “Seja Sua Própria Marca”.