Reputação, a métrica silenciosa da boa governança

No Brasil, onde predominam empresas de controle familiar, o valor da governança ainda divide opiniões

Juliana Schincariol

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Reputação é o ativo mais caro de construir e o mais fácil de perder. Governança dá lastro a essa reputação ao transformar princípios em prática diária, com processos, controles e prestação de contas que tornam o comportamento da empresa previsível. Não aparecem no balanço, mas orientam preço, acesso a capital e licença social para operar. No Brasil, onde predominam empresas de controle familiar, o valor da governança ainda divide opiniões. Parte do mercado a enxerga como alavanca de valor; outra parcela ainda a trata como custo ou burocracia.

Em períodos de bonança, o mercado costuma ser mais benevolente com quem não prioriza a governança. Quando o ciclo vira, o escrutínio aumenta. Como observa Alessandra Gadelha, conselheira com duas décadas em finanças e RI em casas como Springs, Enauta e Mills, hoje em conselhos fiscais de Vale e Eletrobras, essa dinâmica não é teoria. Ela se repete sempre que faltam processos e evidências capazes de sustentar a narrativa nos momentos difíceis.

Da sala de conselho, o antídoto é pragmático. Governança não é checklist. Sem aderência ao dia a dia, comitês e políticas viram peças decorativas. “Transparência não é ornamento, é método”, diz Alessandra. Método significa ritos de decisão, documentação, métricas e prestação de contas que sobrevivem a agendas pessoais e trocas de gestão. Significa também escuta ativa. A pressão por relatórios de sustentabilidade já obriga a mapear materialidade com investidores, clientes, colaboradores e fornecedores. O ganho reputacional vem quando essa escuta sai do PDF e entra na priorização estratégica.

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Outra peça essencial é a diversidade de competências. Não como bandeira, mas como mecanismo para reduzir vieses e enriquecer o debate. “A diversidade que muda a sala é a de experiências e competências”, diz Alessandra. Quando trajetórias distintas olham o mesmo problema, surgem riscos e oportunidades que o grupo homogêneo não enxerga. Reputação também se protege assim, elevando a qualidade da deliberação antes que o mercado precise “descobrir” os pontos cegos.

Perder reputação é fácil. Um deslize, ou um ato bem-intencionado mal interpretado, pode corroê-la. A governança é a ferramenta central dessa gestão, reforça Alessandra. “Não basta entregar resultados. Em fases de boa performance, a tolerância aumenta, mas isso não substitui processos, evidências e prestação de contas.”

O primeiro passo é reconhecer que aprimorar a governança eleva o valor da empresa e, por consequência, do patrimônio. Não há fórmula mágica. Faz-se com transparência, escuta ativa e rotinas claras que definem papéis e responsabilidades.

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No fim, gestão da reputação é disciplina, não discurso. Empresas que entregam resultado com coerência, que parecem e provam o que são, constroem um colchão de confiança para atravessar crises e ciclos. Não existe “nível máximo” de governança; existe constância. Processos geram previsibilidade e respeito pelos diferentes públicos. É dessa matéria que se faz reputação, e é ela que, silenciosamente, multiplica valor no longo prazo.

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Juliana Schincariol

Juliana Schincariol é jornalista especializada em mercado de capitais, com experiência na cobertura de finanças, negócios e governança corporativa. É sócia da Ânima Comunicação em Governança e editora do Boardwise.