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Todo dia elas estão lá, piscando na nossa frente: 10k visualizações, 3mi impressões, “bateu 1 bilhão de alcance”. Sem pedir licença, estes indicadores viraram árbitros de sucesso, seja você um especialista ou não em digital: eles decidem quem merece holofote, quem recebe verba de publicidade, quem passa pela porta giratória da fama relâmpago. Mas o que, afinal, cada uma dessas métricas mede e, sobretudo, o que elas não medem?
Um guia de bolso para não se perder
| Métrica | Em miúdos | Onde mora a pegadinha |
|---|---|---|
| Impressão | Contar que o conteúdo foi servido na tela de alguém. Nem precisa ter sido visto. | A régua de “visível” aceita tudo: basta 1 segundo com 50 % dos pixels na tela para o carimbar como impressão. |
| Alcance | Pessoas (contas únicas) expostas a pelo menos uma impressão. | Se você abre o mesmo anúncio no celular e no notebook, pode virar “duas pessoas”. |
| Visualização (views) | Vídeo passou 3s ou mais (Instagram, Facebook); no TikTok e nos Shorts, basta começar a tocar. | Plataformas contam repetição, início automático e até rolada rápida na timeline. |
| Engajamento | Soma de curtidas, comentários, compartilhamentos, cliques. | Bots entram na conta e estima-se que são 23% das interações nas redes. |
Quando o número engana
Um terço do que chamamos de “impressão” nunca esteve visível. A Integral Ad Science calculou que 33 % dos anúncios digitais seguem invisíveis; o índice global de viewability parou em 76 % no fim de 2023. Já o relatório da DoubleVerify mostrou que os agentes automáticos feitos por AI cresceram 86% no segundo semestre de 2024, empurrando mais de 2 bilhões de solicitações de anúncio que nunca chegaram a gente de carne e osso.
Este fenômeno é mais interessante ainda quando olhamos seguidores e influencers: uma pesquisa do Yougov buscou capturar uma espécie de “índice de conhecimento real” dos influenciadores com dezenas ou centenas de milhões de seguidores: Charli D’Amelio – 157 milhões de seguidores; só 44% dos americanos sabem quem ela é. Khaby Lame – 162 milhões; 48% de reconhecimento. Addison Rae – 88 milhões; e popularidade de 24%.
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Em outras palavras: muita vitrine, pouco rosto conhecido na rua. O mesmo acontece quando as empresas entram no jogo: a varejista indiana Meesho empilhou 1,2 bilhão de impressões com a ação #WaitNahiVoteKaro em 2024; mesmo assim, o nome da marca não aparece entre as 20 mais lembradas no país, segundo YouGov BrandIndex. No meu artigo mais recente sobre bebês reborn, somavam-se 840k posts no TikTok, mas marketplaces não viram pico de venda e o Ministério da Saúde registrou zero atendimentos reais. A nuvem de posts gritava alto; o caixa permanecia quase mudo.
Por que continuamos hipnotizados?
Porque números grandes são fáceis de mostrar e difíceis de contestar. Eles funcionam como a altura de um arranha-céu: impressionam de longe, mas não contam quantas salas estão vazias. Na TV dos anos 90, quinze pontos de audiência significavam que milhões estavam simultaneamente no sofá. Logo, tendemos a transportar o conceito de “gente” para o digital, onde um view soa como pessoa, um seguidor soa como fã, uma impressão soa como olhar. A tradução é tentadora, mas, frequentemente falsa.
Na internet de 2025, cinquenta milhões de impressões podem resultar em:
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- 17 milhões de banners jamais vistos (o terço invisível);
- 20 milhões servidos a bots;
- 10 milhões repetidos para as mesmas pessoas;
- e apenas uns poucos milhares que de fato lembram da marca ou sacam o cartão de crédito.
Antes de acreditar no placar
Compare. Um influenciador de 50 milhões de seguidores pode ter engajamento menor que uma conta de um jornal de bairro com 50 mil seguidores.
Pergunte “quem viu?” Humanos únicos ou telas duplicadas?
Procure o delta. Houve venda? Se a resposta for “ninguém sabe”, talvez o impacto seja tão virtual quanto a métrica.
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Termino com um convite: na próxima vez que alguém brandir milhões de impressões ou seguidores como prova definitiva de sucesso, respire. Métricas são mapas, não o território. Métricas são úteis, mas só quando você sabe o que elas significam, onde elas falham e qual ponte real existe entre o dado e o objetivo. E, se você se sente menor por não colecionar números gigantes, fique tranquilo: o que persiste é a métrica de quando as telas se apagam, a influência que dispensa contagem, mas permanece na memória de quem foi tocado.