Fim da cidadania italiana? Veja quem será impactado e o que ainda é possível em 5 pontos

Em maio, o governo italiano aprovou mudanças que restringem o acesso à cidadania; novo decreto-lei visa reduzir o número de descendentes elegíveis

Euro Dicas

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*Por Giovanna Mauro, do Euro Dicas

Em maio de 2025, o governo italiano aprovou uma série de mudanças que restringem o acesso à cidadania italiana por descendência (jus sanguinis). O novo decreto-lei visa reduzir o número de descendentes elegíveis, afetando diretamente cerca de 95% dos brasileiros que buscavam o direito de reconhecer a dupla nacionalidade.

1. O que diz o decreto-lei que pretende limitar o direito de sangue na cidadania italiana? 

O Decreto-lei 36/2025 que restringe a cidadania italiana por descendência entrou em vigor no dia 28 de março. Após ser aprovada em votação final na Câmara dos Deputados, a nova lei se tornou uma legislação definitiva

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Antes das mudanças, não existia limite geracional para a cidadania italiana. Dessa forma, todo estrangeiro que comprovasse o parentesco direto com um cidadão italiano vivo após 17 de março de 1861, ano da Unificação Italiana, poderia solicitar a dupla nacionalidade.

Com uma das maiores comunidades de descendentes de italianos fora da Itália, o Brasil é um dos países mais afetados pelas mudanças. 

Os objetivos do Decreto-lei

O Decreto-lei 36/2025 restringe a cidadania italiana por descendência às duas primeiras gerações, com o objetivo de conter abusos no sistema, como pedidos baseados em laços familiares distantes.  

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O aumento de pedidos sobrecarregou consulados e o sistema judiciário. Na América do Sul, o número de reconhecimentos saltou de 800 mil para mais de 2 milhões em 20 anos. 

Para o ministro, o direito jus sanguinis não deixará de existir, mas será restrito para valorizar o vínculo efetivo entre a Itália e o cidadão residente no exterior e combater o que o ministro chamou de “comercialização” de passaportes italianos.

Principais pontos da proposta

O texto original previa que um dos pais ou avós do requerente deveria ter nascido na Itália para ter direito à nacionalidade. 

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Após uma alteração feita pelo Senado, a lei passou a permitir que solicitem a cidadania italiana aqueles com um dos pais ou avós que, no momento do falecimento, possuísse exclusivamente a cidadania italiana. 

Também podem solicitar a dupla nacionalidade os requerentes cujo pai ou mãe, embora não nascido na Itália, tenham morado no país por ao menos dois anos consecutivos antes do nascimento ou adoção do filho – e após terem adquirido a cidadania italiana. 

Impacto sobre a transmissão da cidadania por jus sanguinis

As mudanças impactarão os descendentes de italianos em todo o mundo, sobretudo na América Latina. No Brasil, estima-se que mais de 30 milhões de descendentes poderão perder o direito à dupla nacionalidade.  

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Após a aprovação do decreto, os Consulados da Itália no Brasil suspenderam o recebimento de novos pedidos de cidadania via descendência. Os agendamentos para envio dos documentos também foram suspensos. 

2. Quem ainda terá direito à cidadania italiana?

O princípio jus sanguinis foi mantido, mas agora é restrito a um grupo limitado de descendentes.

O reconhecimento da cidadania italiana ainda é um direito dos filhos ou netos de italianos que se encaixem em ao menos uma das situações:

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Também foram estabelecidas novas regras quanto à transmissão da cidadania para filhos de italianos por parte dos pais com dupla nacionalidade. Filhos nascidos/adotados antes de 27/03/2025 devem ser registrados até 31/05/2026; os nascidos depois, até completarem um ano.

Em ambos os casos, os pais devem ter obtido a cidadania antes do nascimento ou adoção  

Documentos exigidos e prazos para protocolar o pedido

A documentação básica permanece a mesma, mas deve comprovar o cumprimento dos novos critérios de 2025. 

Os principais documentos são as certidões de todos os familiares da linha colateral – do requerente até o antepassado italiano.

A lista de documentos atualizada está presente neste artigo do Euro Dicas.

Todos os documentos em português devem ser traduzidos para o italiano por um tradutor juramentado. Os documentos também precisam ser apostilados com a Apostila de Haia.

3. Quem perderá o direito à cidadania italiana?

Com a nova regra, bisnetos, trinetos e as gerações seguintes perdem o direito. Agora, a dupla cidadania passa a ser um direito de filhos e netos de italianos.

Todavia, filhos e netos também estão sujeitos a restrições, pois um dos critérios é a exclusividade da cidadania italiana pelo antepassado. Dessa forma, os requerentes cujos antepassados se naturalizaram em outro país ou tinham dupla cidadania estão excluídos da possibilidade de reconhecer a nacionalidade italiana. 

Impacto nas famílias que já estavam na fila dos consulados no Brasil

Pedidos entregues até 27 de março de 2025, às 23h59 na Itália, seguirão as regras antigas, mesmo que ainda estejam em andamento.

O que acontecerá com quem está com o processo em andamento?

Pedidos protocolados até 27 de março, tanto no Brasil como na Itália, não serão afetados e prosseguirão normalmente, incluídos os requerentes que já haviam entregue a documentação obrigatória para o pedido presencialmente no Consulado ou que já haviam protocolado a ação no sistema de justiça italiano.

Brasileiros que estavam na fila aguardando agendamento podem ter seus pedidos cancelados. 

4. Será possível recorrer ou reverter a situação?

Ainda é possível que o novo decreto seja revertido por meio do questionamento de seu aspecto inconstitucional, já apontado por especialistas no Brasil e na Itália. 

Como a cidadania é um direito de todo descendente de italiano desde o nascimento, as novas mudanças retiram direitos já adquiridos por esses cidadãos, o que não é permitido pela Constituição do país. 

A lei é criticada por criar desigualdades: filhos de italianos nascidos na Itália mantêm direitos, enquanto outros os perdem. 

Nesse sentido, a lei recém-aprovada ainda pode enfrentar resistência judicial, o que pode levar a novas revisões

Há possibilidade de recurso ou exceção prevista no decreto-lei?

Sim. A via judicial é a principal exceção, devendo ser conduzida por um advogado na Itália.

Ações coletivas por parte de associações de descendentes italianos

A aprovação do novo decreto gerou reações imediatas entre membros da comunidade italiana. Em todo o mundo, organizações estão promovendo ações coletivas como tentativa de reverter as mudanças. 

Um abaixo-assinado criado por Fabíola Leardini já reuniu mais de 100 mil assinaturas. Segundo a petição, o decreto representa “uma traição à herança italiana”, caracterizada por séculos de emigração. 

Os Conselhos de Italianos no Exterior e o Conselho Geral dos Italianos no Exterior também divulgaram uma nota de repúdio. Conforme o documento, a nova lei institui uma “violação do princípio da igualdade entre os cidadãos”, ao estabelecer diferenciações entre os próprios cidadãos italianos.

5. O que as famílias podem fazer?  

O governo italiano deverá se manifestar para esclarecer a situação dos requerentes que aguardavam na fila dos Consulados pela convocação para entrega dos documentos. Neste caso, a recomendação é aguardar com paciência. 

Famílias que iniciaram a busca de documentos devem seguir o processo, diante da possibilidade de contestações ao decreto.

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Euro Dicas

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