Com IAs de vídeo, realidade vira design e gera desafio ético para jornalismo e plataformas

Entenda como as IAs de vídeo estão mudando a percepção da realidade, desafiando o jornalismo e plataformas digitais a lidar com a verdade e a ética na era da desinformação

Flávio Moreira

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

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A ideia de uma imagem como evidência de um fato está chegando ao fim. Ferramentas de inteligência artificial como Veo 3 (Google), Sora (OpenAI) e Runway estão deixando de ser apenas geradores de vídeo. Elas estão desfazendo a fronteira entre real e o artificial. A partir de agora, realidade virou design.

Por muito tempo, a gente confiou na imagem como testemunha. Era o “vi com meus próprios olhos” do jornalismo. De um jeito que hoje parece quase inocente, há alguns anos, Photoshop matou a foto como prova. E agora a IA está matando o vídeo como verdade.

E tudo isso com uma eficiência assustadora que muda muita coisa para o jornalismo e plataformas de conteúdo.

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O impacto da IA no jornalismo e na apuração de fatos

Como denunciar abusos se uma cena de violência pode ser fabricada com perfeição? Como registrar a história se o presente pode estar sendo inventado com qualidade de Hollywood?

Não é um debate futurista. Já está acontecendo.

Redações vão precisar de um novo tipo de profissional que saiba identificar artefatos digitais, checar procedência visual, interpretar imagens sintéticas.

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Ao mesmo tempo, a própria imprensa será tentada a usar essas tecnologias. Vai ser aceitável gerar simulações com IA para ilustrar crimes ou guerras? Se sim, como deixar claro que aquilo é uma reconstituição e não um registro? É um dilema urgente.

A confiança vai passar a ser habilidade crítica. Um novo tipo de educação vai ser essencial: aprender a ler imagens como linguagem.

C2PA na tentativa de garantir autenticidade

O padrão C2PA (sigla para Coalition for Content Provenance and Authenticity) é uma iniciativa criada por grandes empresas de tecnologia e mídia para combater a desinformação visual. A ideia é que imagens e vídeos venham com um tipo de “histórico de origem” embutido: quem criou, quando foi feito, se passou por edições. Como um RG digital.

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Isso facilita para plataformas e usuários saberem se aquele conteúdo é autêntico ou manipulado.

Plataformas digitais: vitrine neutra ou curadoras de verdade?

Uma outra saída pode ser obrigar plataformas a sinalizar conteúdo gerado por IA. Mas isso depende de regulação e vontade política. Coisa que quem lucra com desinformação sabe explorar.

TikTok, Instagram, YouTube… são apenas vitrines onde qualquer um pode expor o que quiser? Ou essas plataformas têm obrigação de cuidar do que estão entregando para bilhões de pessoas todos os dias?

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Durante anos, essas redes se posicionaram como canais neutros, apenas conectando quem publica com quem consome. Mas quando o conteúdo distribuído pode ser uma mentira realista gerada por IA, a responsabilidade muda de patamar.

Se elas têm algoritmos para escolher o que vai aparecer primeiro no seu feed, por que não teriam também a obrigação de filtrar o que pode causar dano real?

Não se trata só de moderação de conteúdo. Trata-se de responsabilidade editorial. E talvez esteja na hora de plataformas serem cobradas como tal.

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Flávio Moreira

Flávio Moreira é jornalista especializado em estratégia e inovação no mercado de mídia. Atualmente, atua como Coordenador de Parcerias e Estratégia no InfoMoney, tendo passado por posições de liderança como Editor-chefe de Assinaturas e Novos Projetos no UOL, Head de Conteúdo no Torcedores.com e Gestor de Comunidades FIFA na Electronic Arts. Além de sua trajetória profissional, Flávio é autor de uma newsletter sobre tendências e inovação para publishers, que conta com mais de 6 mil assinantes em busca de insights sobre o futuro da comunicação.