Fechar Ads

A Olimpíada da humanidade

Tóquio 2021 entrará para a história como outras edições fizeram, por motivos humanitários, como Rio 2016, Sidney 2000 e Barcelona 1992
Por  Fernando Scherer (Xuxa) -
info_outline

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Estamos há poucos dias dos Jogos Olímpicos, e Tóquio está novamente em estado de emergência. O que significa que não teremos público nos estádios, arenas e ginásios, e certamente os realizadores da competição, patrocinadores e o próprio país sede neste momento ainda contabilizam o prejuízo monetário — turismo, relacionamento, ativações, publicidade etc.

Mas, então, por que manter a realização da Olimpíada que já havia sido adiada em um ano? Muito provavelmente essa é a pergunta que muitos se fazem ao olhar pelo prisma do negócio — e em curto prazo. E o que eu quero fazer aqui, na minha estreia como colunista do InfoMoney, é te convidar a refletir e, de repente, enxergar este momento por um ângulo diferente.

Para isso, vale fazermos um rápido passeio pelo tempo. Historicamente, os Jogos passaram por diversos momentos difíceis e controversos. Em 1936, a Alemanha de Adolf Hitler com o propósito de promover a supremacia ariana e a ideologia do partido nazista sediou a Olimpíada. Mas, as quatro medalhas de ouro de Jesse Owens, velocista americano neto de escravos, não só calaram o ditador alemão, como também se tornaram o símbolo da luta contra o racismo e reforçaram um dos pilares olímpicos, a igualdade.

Em 1960, Cassius Clay, um pugilista até então desconhecido, conquistou o ouro nos Jogos de Roma. Depois de ser celebrado como herói em sua terra natal, o americano teve seu pedido recusado por um garçom em um restaurante frequentado por brancos e, decepcionado, atirou sua medalha olímpica no Rio Ohio.

Anos depois, em 1996, o discurso de Martin Luther King Jr. surge no estádio olímpico de Atlanta. “I have a dream…” e a fala do pastor falando sobre seu sonho de direitos iguais e sobre respeito — mais um dos valores do Olimpismo — toma todo o estádio, emocionando a plateia, quando de repente surge Cassius Clay.

Ou melhor, Muhammad Ali, com 54 anos e já lutando contra o Mal de Parkinson, ao lado da pira olímpica, iluminado por um holofote, no aguardo da tocha. Ele acende a pira. Dias depois, recebe uma réplica da medalha que havia se perdido nas águas do rio Ohio, devolvida pelo Dream Team americano.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

Barcelona, 1992: o que dizer sobre o retorno da África do Sul aos Jogos, ao fim do Apartheid. Ou ainda, da presença da Alemanha unificada. Sidney, 2000: aborígenes e colonos brancos se juntam em uma das cerimônias mais emocionantes.

E por que não falarmos sobre Rio 2016, quando pela primeira vez na história dos Jogos tivemos um time de refugiados. Rose Lokonyen, corredora do Sudão do Sul entrando no Maracanã ovacionada pela multidão, com a bandeira do Comitê Olímpico Internacional, na cerimônia de abertura, liderando a primeira equipe olímpica de atletas refugiados vindos da Síria, Congo, Etiópia e com histórias impressionantes de superação. A mensagem de encorajamento de gerações de refugiados em campos de que sim, eles também podem chegar onde almejam.

A Olimpíada ultrapassa a barreira do esporte. A realização dos Jogos vai além do entretenimento. É sobre posicionamento como humanidade. Desde as lendas sobre sua origem na Grécia Antiga, que remontam por vezes trabalhos de Hércules, por vezes homenagem aos deuses, e desde sempre na busca por inspirar a humanidade, como o surgimento maratona — quando um soldado teria corrido 40 quilômetros com o objetivo de chegar em Atenas para dar a notícia da vitória dos gregos sobre os persas.

Ou já na era moderna, com o Barão de Coubertin, que resgatou os Jogos por entender a importância da cultura esportiva na educação e no desenvolvimento da sociedade. A mensagem da realização desses Jogos é única: de que podemos vencer, como sociedade, a pandemia.

Com os valores olímpicos de amizade, igualdade, respeito e sim, fair play, o jogo justo. Essa não é a Olimpíada da queda de recordes (apesar de pessoalmente eu acreditar que teremos alguns novos). Essa definitivamente é a Olimpíada da humanidade — e estar ao lado da humanidade, a longo prazo, certamente será de um valor agregado imensurável.

Fernando Scherer (Xuxa) É nadador, duas vezes medalhista olímpico (bronze nos 50m livre em Atlanta-1996 e bronze no 4x100 livre em Sidney-2000). Foi eleito o melhor nadador do mundo em 1998, campeão e recordista mundial, além de deter sete medalhas de ouro em Jogos Panamericanos. Fora das piscinas, atua como empresário, apresentador, comentarista e palestrante. Também dá cursos digitais sobre excelência, performance e expansão de consciência

Compartilhe

Mais de Opinião - Especialistas convidados