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A inflação dos alimentos é transitória e o governo não precisa intervir

Os preços voltarão ao normal. Não adianta apelar ao populismo ou ao “patriotismo”. O que ajuda, e muito, são contas públicas numa rampa de melhora contínua
Por  Octaciano Neto -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

As últimas semanas foram marcadas pela ampliação do debate público em torno da inflação dos alimentos.

O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), considerado a inflação oficial do país, subiu 0,24% em agosto. No acumulado de 12 meses, aumentou 2,44%, enquanto a inflação dos alimentos subiu 8,83% no período.

Em agosto, segundo o IBGE, o índice foi puxado pelo tomate (12,98%), o leite longa vida (4,84%), as frutas (3,37%), as carnes (3,33%), o óleo de soja (9,48%) e o arroz (3,08%).

Há, é claro, o outro lado da moeda. Houve quedas de preços em itens como cebola (-17,18%), alho (-14,16%), batata-inglesa (-12,40%) e feijão-carioca (-5,85%), além da refeição fora de casa (-0,11%).

Mas, em meio a tudo isso, o arroz é o novo símbolo dos preços altos. O Indicador do arroz ESALQ/SENAR-RS fechou nesta quarta (9) em R$ 102,20 a saca de 50 kg, novo recorde real na série histórica do Cepea.

Em setembro de 2019, a mesma saca era comercializada pelos produtores rurais por R$ 45,40. Uma valorização de 125% em 12 meses.

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O dólar valorizou 40% nos últimos seis meses e isso também influenciou o aumento dos preços, já que o dólar mais caro estimula as exportações.

Segundo análise feita pela Cogo – Inteligência em Agronegócio, o volume mensal de arroz embarcado (exportado) aumentou quase 100%, se compararmos agosto/2019 com agosto/2020.

De forma mais ampla, as exportações do agronegócio registraram US$ 10,0 bilhões em julho de 2020, segundo os dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. O valor exportado em produtos do setor respondeu por 51,2% do total exportado pelo Brasil.

A China é um capítulo especial para o agronegócio brasileiro. No ano 2000, a China representava apenas 2,7% das exportações do agro brasileiro. Em julho de 2019, correspondia a 32%. Em julho deste ano, 38,4%.

De acordo com boletim da balança comercial do agronegócio produzido pela Fiesp, em julho de 2020, o Brasil exportou US$ 593,6 milhões em carnes para a China, o equivalente a 39,5% do valor total exportado para o mundo.

A carne bovina brasileira representa mais de 20% do consumo interno da China. A soja importada do Brasil representa a metade da demanda chinesa.

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Outros motivos também ajudam a explicar a alta dos preços dos alimentos: demanda aquecida no mercado interno, redução da área plantada no Brasil (em algumas culturas, como o arroz), preços altos (mesmo em dólar) no mercado internacional e aumento do consumo em vários países do mundo.

A boa notícia é que o aumento dos preços dos alimentos é transitório. Afeta muitos brasileiros, é verdade, sobretudo os mais pobres, que utilizam a maior parte da sua renda em alimentos.

Mas o aumento é conjuntural e específico nos alimentos. A inflação não é estrutural e generalizada na economia. Os fundamentos econômicos do Ministério da Economia estão mantidos desde o governo Temer. Pelo menos até o momento.

Com o aumento da produção e o dólar mais baixo, os preços voltam ao normal. Não será pelo agronegócio que haverá descontrole inflacionário no Brasil.

O risco de aumento estrutural da inflação depende quase que exclusivamente das decisões de política econômica do governo federal, como manter o teto dos gastos públicos.

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O roteiro de controle inflacionário é claro. Segundo ex-secretária do Tesouro Nacional do e atual economista chefe do Santander, “a deterioração aguda das contas públicas é o único risco relevante para o controle da inflação.”

Caso o país venha a perder sua âncora fiscal, situação que não é o cenário base do Santander, o câmbio avançaria ainda mais e a piora do risco país levaria à saída de investimentos do Brasil.

Também não faz o menor sentido uma intervenção do governo federal na política de preços. Enviar fiscais do Ministério da Justiça para notificar donos de supermercado lembra mais a época dos “fiscais do Sarney” do que o liberalismo defendido pelo ministro Paulo Guedes, sobretudo na campanha eleitoral.

Nesta semana, a Câmara de Comércio Exterior (Camex) decidiu zerar a tarifa de importação do arroz. O governo estabeleceu uma cota de 400 mil toneladas do produto até o fim do ano que pode entrar no país sem a taxa. Isso é razoável, pois é uma medida também transitória e limitada.

O dever de casa na inflação dos alimentos é muito mais do governo federal do que dos produtores rurais e donos de supermercado. É uma combinação de controle das contas públicas (principalmente) e não de interferência do governo federal no mercado de produtos alimentícios – e, consequentemente, no agronegócio.

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Os preços voltarão ao normal. Não adianta apelar ao populismo ou ao “patriotismo”. O que ajuda, e muito, são contas públicas numa rampa de melhora contínua.

Para isso, segundo Paulo Hartung, ex-governador do Espírito Santo e presidente da IBA – Indústria Brasileira das Árvores, “é urgente a aprovação de reformas estruturantes para ancorar o endividamento e aumentar a produtividade da nossa economia”.

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Octaciano Neto É associado da área de agronegócio da consultoria EloGroup, um dos líderes do RenovaBr, produtor rural e apresentador do podcast 4.0 no Campo. Foi secretário de Agricultura do Espírito Santo e presidente do Conselho dos Secretários de Agricultura do Brasil

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