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Negociações de atletas e a regra de empréstimos da FIFA: atenção ao mercado

Estar atento ao mercado é fundamental, mas especialmente às regras. Quem tem um olhar mais apurado é capaz de bons negócios.
Por  Cesar Grafietti -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Dia 31 de agosto é uma data marcante no futebol. Todos os anos, as cinco maiores ligas de futebol europeias encerram sua janela de contratações mais relevantes para a temporada. É uma correria danada nos últimos dias para fazer aquela contratação que falta ou vender aquele atleta que trará um respiro financeiro.

O futebol ainda sente os efeitos da pandemia e isso pode ser sentido nos números da janela de 2021. Por mais que algumas contratações tenham sido bombásticas, pelos nomes e pelos valores, o mercado seguiu abaixo do que vinha operando e com características diferentes, que tem a ver também com outro tema que tratarei mais adiante.

Ainda assim, convenhamos, está longe de ser terra arrasada. Não existe um “novo normal”. Considerando que as competições estão recebendo público novamente e que as economias europeias iniciaram um processo de recuperação econômica impulsionado pela vacinação e controles razoáveis da pandemia, é como se tivéssemos retomado o caminho após pararmos no acostamento.

Sobre os números da janela, a Deloitte trouxe alguns dados de fechamento de mercado que mostram essa queda de valores. Veja o quadro abaixo:

As cinco principais ligas europeias movimentaram um valor de vendas de atletas ligeiramente inferior à janela passada. Chama atenção a redução de € 300 milhões da LaLiga, ao mesmo tempo em que a Premier Legue movimentou mais atletas. Essas são informações referentes a todas as negociações, internas e com outras ligas. Veja, por exemplo, que a Serie A vendeu menos atletas, mesmo tendo as negociações relevantes de Lukaku (cerca de € 120 milhões) e Hakimi (€ 60 milhões).

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Outro aspecto interessante a analisar é o de compras. Daí a Premier League mostra sua força, representando 45%, ligeiramente superior aos 43% de 2020.

Curioso observar a balança comercial, que é o saldo entre compras e vendas. A Premier League segue sendo compradora líquida ou, ao menos, movimentando mais contratações que vendas. Na outra ponta, a Bundesliga segue vendendo mais do que comprando. Por que isso é importante? Porque significa que os clubes da liga, no consolidado, receberão mais do que pagarão, e é uma forma de manter o equilíbrio financeiro.

Agora, vamos fazer um detalhamento dos dados de movimentação dos seis maiores clubes ingleses:

A Deloitte apresentou os dados de investimento líquido, que é a diferença entre o que gastou e o que recebeu com negociações. Pois bem, o Arsenal foi o clube que mais gastou, seguido do Manchester United. O terceiro foi o sempre criticado Manchester City, por conta de ser um clube-estado, multibilionário e tudo mais. Mas o clube dirigido por Pep Guardiola investiu € 82 milhões líquidos, o que é 58% do Arsenal e 70% do rival United. E contratou apenas dois atletas.

Enquanto isso, Tottenham, Liverpool e Chelsea foram bem mais contidos, a ponto do último desses times, que investiu € 140 milhões em Lukaku, ter saldo positivo nas negociações.

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Lembra aquela história de que os clubes de bilionários russos e árabes estão destruindo o futebol? Pois é, talvez esse seja um processo menos agressivo do que parece.

Agora, vamos analisar pela quantidade de atletas negociados. Isso nos levará ao segundo tema da coluna: a nova regra da Fifa para empréstimos de atletas. Ela vai mudar muita coisa, com impactos em todos os mercados.

Primeiro, a regra: a partir da temporada 22/23, os clubes de todos os países poderão emprestar no máximo oito atletas acima de 22 anos para ligas estrangeiras. Ou seja, um clube da Premier League poderá emprestar até oito jogadores para as demais ligas europeias, Brasil, MLS e etc. A partir da temporada 23/24, esse número cai para seis.

O objetivo dessa regra é reduzir a influência de clubes ricos sobre atletas e, consequentemente, sobre os adversários. Um clube que tem 30 atletas sob contrato, mas emprestados, tem a capacidade de dizer onde esses atletas jogarão, reforçando ou não possíveis rivais.

Não é à toa que vemos clubes como Arsenal e Chelsea emprestando quantidades significativas de atletas, ao mesmo tempo em que a maioria dos grandes ingleses dispensou vários. É o enxugamento necessário dos elencos, já de olho na regra da próxima temporada. Se não conseguir colocar esses atletas agora, eles perdem valor na próxima janela, dado o limite de empréstimos. Ou serão obrigados a emprestarem para rivais diretos da liga onde atuam.

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Um caso curioso que vimos recentemente é o do francês Bakayoko, do Chelsea. Ele foi contratado em 17/18 junto ao Monaco. Desde então, foi sempre emprestado. Passou por Milan, voltou ao Monaco, Milan novamente, Napoli e agora retorna ao Milan. Estima-se que o Chelsea tenha recebido € 12 milhões pelos empréstimos, depois de ter pago € 40 milhões pelo atleta. Nesta janela, ele retornou ao Milan por empréstimo com obrigação de contratação ao final, pelo valor de € 20 milhões. Ou seja, o clube inglês apenas retirou o atleta de mercado, sem nunca o utilizar.

Esse é um efeito ruim do excesso de dinheiro. E é justamente isso que a Fifa quer combater com essa regra. Menos operações desse tipo significam uma oportunidade de reduzir valores de negociações. Sem contar que isso vai aumentar a quantidade de atletas disponíveis no mercado assim que a regra estiver em vigor.

Isso tende a ter impacto no Brasil sob diversas formas. A primeira é que os clubes europeus devem seguir com suas políticas restritivas de contratações, aumentando ainda mais a cautela. Afinal, contratar atletas abaixo de 22 anos, sem o tempo de emprestá-los para ganharem experiência, será um risco enorme. Ou compram ainda mais cedo ou a demanda por atletas acima dessa idade será ainda mais restrita do que já é.

Em contrapartida, é possível que surjam mais possibilidades de acesso a atletas sul-americanos vindos da Europa. Na impossibilidade de emprestá-los, é razoável supor que muitos terão seus contratos rescindidos, e isso pode abrir possibilidades para clubes contratá-los sem investimento na rescisão.

Agora, quem cria a regra tem que estar atento para a criatividade dos clubes. Por exemplo, hoje já existe a figura do empréstimo com direito de recompra. Por exemplo, o Napoli empresta um atleta para o Liverpool com obrigação de compra ao final por € 20 milhões. Mas tem um direito de recompra por € 22 milhões. A lógica é: se o atleta seguir não interessando, o clube que emprestou recebe € 20 milhões. Agora, se ele performar bem e passar a interessar, o clube paga € 2 milhões para tê-lo de volta.

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Nada impede que o termo “empréstimo” seja substituído por “compra com direito de regresso”. Registram a venda com valor a pagar no futuro, e registram a possibilidade de recompra ao fim do período. Por isso que eu digo que o legislador e quem monitora precisam estar nos calcanhares de quem é monitorado.

Estar atento ao mercado é fundamental, mas especialmente às regras. Quem tem um olhar mais apurado é capaz de bons negócios. Só precisa ter cuidado para não esperar que o coelho saia da cartola para conseguir pagar a conta depois.

Cesar Grafietti Economista, especialista em Banking e Gestão & Finanças do Esporte. 27 anos de mercado financeiro analisando o dia-a-dia da economia real. Twitter: @cesargrafietti

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