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Esporte já perdeu dezenas de bilhões, mas ficar em casa é a melhor solução

Por  Cesar Grafietti -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Começaremos esta coluna com uma recomendação: fique em casa. Quanto mais eficiente for esta quarentena, menor será seu tempo e seus impactos.

Impactos que já são vistos em toda a economia, no mundo todo. Paralisação de comércio, indústrias, serviços. Gente que trabalha e se arrisca para manter funções básicas da vida, para que quem consiga possa ter acesso a alimentação, demanda básica do ser humano.

Aqui falo de esporte e finanças, mas preocupado com o que se passa na economia e no mundo, com os dilemas entre a convulsão social pela doença ou pela falta de dinheiro. Primeira lição que me vem à mente é aquela de nunca comparar países e economias diferentes. O que acontece na Itália, na Alemanha, na Inglaterra, nos EUA é diferente do que se passa no Brasil. Portanto, soluções europeias e americana não cabem a um país que tem tamanha desigualdade e massa de pessoas tão grande em situação de risco e informalidade. Por isso, dependemos mais e mais de ações coordenadas e eficientes de governos.

Os impactos da Covid-19 no esporte serão enormes. Alguns serão compensados no futuro, mas outros simplesmente deixarão problemas. Possivelmente os eventos esportivos de menor porte serão mais afetados, pois muitos simplesmente deixam de acontecer. A falta de Indian Wells, ou o encerramento precoce da Superliga de Vôlei no Brasil são operações que tem custos e deixarão de ter receitas. E demandam ações externas, das associações e federações, para ajudar a diminuir os impactos financeiros sobre as pessoas, e de certa forma, sobre os organizadores.

As competições de maior porte e que foram “apenas” postergadas para 2021 tendem a ter menor perda. Vamos exemplificar com a Eurocopa 2020, competição continental de futebol entre Seleções. Neste ano a edição completa 60 anos, e por isso foi montada de uma forma a receber mais países e mais sedes. Normalmente realizada em sedes fixas, em 2020 seria disputado em 12 países, de forma a levar o esporte a mais lugares.

Economicamente a ideia é boa, porque além de partilhar os custos, pois cada sede fica obrigada a entregar um estádio em ordem, além de uma estrutura de logística (aeroporto e/ou estação de trem) eficiente. Naturalmente, investimentos em hotelaria e infraestrutura básica. A maioria das sedes já tinha estádios qualificados e estruturas logísticas prontas, de forma que os investimentos foram concentrados em poucas localidades.

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Não foi possível obter o quanto cada sede investiu, mas a partir de estudos feitos pelas prefeituras de Bilbao (Espanha) e Dublin (Irlanda), que indicavam o impacto econômico da competição para suas cidades, preparei um exercício de qual seria o impacto total da competição, conforme a tabela abaixo.

Utilizei premissas a partir das informações dos respectivos estudos, e utilizei como referência de custos por turista dados da Eurostat, cruzando com as seleções que jogarão em cada país e estimando o movimento de turistas.

A partir dessa soma de fatores cheguei aos dados acima, como impacto em cada cidade, considerando a importância das partidas, onde serão disputadas e por quantas partidas. Na soma, a competição continental de seleções europeias de futebol deveria movimentar cerca de 1,86 bi de euros nas 12 sedes, considerando hotelaria, transporte interno, alimentação, passeios e compras.

Se somarmos a expectativa de gastos com transporte aéreo e ingressos, o valor total que a competição poderia movimentar é da ordem de 2,71 bi de euros.

Naturalmente que estes valores não são perdidos. As instalações permanecerão à disposição, e os gastos ficam postergados para o próximo ano. Os impactos maiores neste momento estão associados aos empregos temporários que a movimentação de pessoas geraria, mas que estão contemplados na conta. De qualquer forma, pessoas deixarão de comparecer e movimentar economias.

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Jogos Olímpicos de Tóquio

Outra competição de grande porte que foi postergada para 2021 foram os Jogos Olímpicos de Tóquio. Aqui, diferente do modelo de competição da Euro 2020, o impacto é num único local, e tende a ser mais sensível.

O Comitê Olímpico Japonês informou que o país investiu entre 2013 e 2020 cerca de US$ 13,4 bilhões nas instalações esportivas e na reformulação da infraestrutura, construção de hotéis e aperfeiçoamento geral do país. Não é pouco dinheiro. Mas o fato é que o impacto desses investimentos já foi absorvido e sentido na evolução do PIB do país ao longo do tempo. Segundo estudo da BOJ Reports & Research Papers, o impacto no PIB pode ser assim medido:

O impacto médio estimado é entre 0,2% e 0,3% do PIB, que teria parcela importante a ser adicionada em 2020 por conta da presença de turistas para a competição, já observada em 2019.

Nesse sentido, o Japão recebe cerca de 20 milhões de turistas anualmente, viu estes dados crescerem para 25 milhões em 2019 e a estimativa é que os Jogos Olímpicos adicionassem cerca de 13 milhões de turistas ao longo do ano, pela exposição que a competição gera. Transferir a competição para 2021 pode significar redução nessa estimativa, a depender dos impactos econômicos globais e da queda generalizada de renda das pessoas.

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Pelo estudo da BOJ o impacto da presença de turistas na economia japonesa seria de algo como US$ 4,5 bilhões. Completando esta informação com estudo da Fitch publicado pela Newsweek, que indica que o PIB japonês pode sofrer redução forte, indo de -0,2% para -1,1%, então temos um cenário bastante difícil, e que justifica a dificuldade do governo japonês em confirmar que a competição seria postergada.

Isso tudo sem considerar os impactos relacionados às transmissões de TV e às ações dos patrocinadores do evento. A TV movimenta US$ 4,2 bi em direitos de transmissão, de um total estimado de US$ 5,7 bi de receitas comerciais dos jogos. Calendário e grade de programação alterada, efeitos no consumo. A Covid-19 não veio para aliviar a vida de ninguém.

Ligas Americanas

Todas as ligas de esportes nos EUA também interromperam suas competições, gerando incertezas e perdas relevantes. As competições não foram canceladas, apenas paralisadas, mas já a Covid-19 já deixa rastros de problemas.

Segundo estudo da Sports Innovation Lab, as 4 ligas que estão em disputa ou entrariam em breve acumularam perdas da ordem de US$ 3,1 bilhões apenas com o chamado Matchday (ingressos, gastos com alimentos, estacionamentos e pequenos souvenires), sem considerar os Playoffs.

Segundo o estudo, o mais afetado seria a MLB (US$ 2,03 bi), seguido da NBA (US$ 0,47 bi), da NHL (com US$ 0,33 bi) e da MLS (US$ 0,28 bi), considerando a data de 30/Junho/20 como limite de encerramento do lockdown e retorno das atividades. Se forem efetivamente cancelados ainda teremos muitos outros custos e problemas.

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Estes números não são nada se comparados aos enormes problemas econômicos que teremos, ocasionados pela Covid-19. Mas neste momento a melhor alternativa para reduzirmos os impactos e retornarmos à vida como era antes disso tudo é ficando em casa. Acredite, já estou entrando na 4ª semana de quarentena aqui em Milão, e a notícia que mais esperamos é a da redução de casos e retomada das atividades. Quanto maior a adesão, mais rápida a solução. E mais cedo voltaremos a ter nossos esportes – e nossa vida – de volta.

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Cesar Grafietti Economista, especialista em Banking e Gestão & Finanças do Esporte. 27 anos de mercado financeiro analisando o dia-a-dia da economia real. Twitter: @cesargrafietti

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