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Copa do Mundo é Copa do Mundo: os países-sede

Torneio no Catar é o último da 'era Blatter', e tendência a partir de 2026 é ter cada vez mais competições realizadas em vários países; entenda o porquê
Por  Cesar Grafietti -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Nesta semana o tema não poderia ser outro que não Copa do Mundo. E, como não sou cartomante nem faço estatísticas malucas misturando PIB com “gols-marcados-de-perna-esquerda-de-fora-da-área” para apontar quem será o campeão, a ideia é falar um pouco sobre a Copa do Mundo em um contexto mais amplo.

Esta é a última Copa do Mundo da “era Blatter”. Se fizermos uma avaliação da evolução histórica das Copas em termos de sedes, veremos que entre 1990 e 2006 as competições eram disputadas em países com alguma solidez econômica, infraestrutura relativamente consolidada e poucos investimentos a serem feitos.

Tivemos Itália, Estados Unidos, França, Coreia/Japão e Alemanha. Mesmo nos locais que fizeram grandes obras para receber a Copa, se tratavam de países desenvolvidos e cujo impacto financeiro foi menos sensível.

As quatro copas seguintes – África do Sul, Brasil, Rússia e Qatar – fazem parte de um roteiro expansionista da gestão Blatter. Não me interessam questões policiais, apenas técnicas. Todas as sedes estavam fora do circuito “mainstream” do futebol, e apenas a Copa no Brasil incluía um candidato ao título — o que de certa forma até justifica a escolha do país.

Para alguns o custo de estruturação da competição foi relevante, para outros entrou na cota do petróleo, mas o fato é que tivemos competições com uma característica clara: exploração de novos mercados, em sedes únicas e de certa forma “controláveis” em termos de relação com a Fifa. Afinal, tinham pouco poder de barganha e capacidade de questionamentos dos tais “padrões Fifa”.

Quando analisamos o que será a primeira Copa da “era Infantino”, o que temos é uma mudança radical: falamos da competição que envolverá Canadá, EUA e México, concentrada na terra da MLS. Países com infraestrutura respeitável, fácil acesso a tudo, redes de transporte e hospedagem vastas. Há poucas demandas a serem feitas pela entidade que não possam ser facilmente atendidas pela organização local. E um aspecto interessante que já é uma tendência em curso: uma competição transnacional.

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Já tivemos a Copa de 2002 entre Coreia do Sul e Japão, mas foi experiência única. Os EUA de 1994 criaram o conceito de multi-sedes, fazendo com que as seleções rodassem o país, o que obrigatoriamente gerava movimento econômico em várias cidades e regiões, aumentando o turismo e dinheiro gasto no país. Antes disso, os países saiam pouco de sua cidade-sede, prendendo as torcidas em poucas regiões.

A evolução para competições com diversas sedes já vinha ocorrendo na Europa, com a Euro sendo dividida entre Bélgica e Países Baixos, Áustria e Suíça, Ucrânia e Polônia e a mais recente foi disputada em 11 países-sedes. Portanto, trata-se da aplicação de uma ideia que faz sentido econômico e que, somada ao fato de retornar a países de maior poder financeiro, muda a forma de pensar a competição.

Vale lembrar que esta é a última Copa do Mundo com 32 países (a próxima competição terá 48 seleções), o que praticamente garante as equipes mais tradicionais no torneio – espero que acabe essa coisa de a Itália fora da competição, assim como deixamos de ver o uniforme laranja dos Países Baixos em 2018.

Mas essa mudança demandará mais tempo e estrutura, reforçando a ideia de que ter mais países e países mais estruturados é uma necessidade. Tanto é que a candidatura que parece ser mais forte para a Copa de 2030 é a da Espanha/Portugal, ainda que a CHUPAR (Chile, Uruguai, Paraguai e Argentina) possa tentar atrapalhar os ibéricos.

Falando em sede, a Copa no Qatar tem aspectos interessantes e outros que serão desafios para todos os envolvidos, da organização local à Fifa, passando especialmente pelos torcedores. Quando se escolhe um país-sede cuja cultura é substancialmente diferente da cultura onde o futebol tem mais destaque, é natural que o ambiente seja diferente do que habitualmente vemos.

No quesito venda de ingressos, as informações dão conta de que a demanda está dentro das médias históricas, então não devemos ter falta de público nos estádios. Entretanto, os custos de transporte, as restrições aos deslocamentos internos em termos de vestimentas e comportamento geral e a restrição a bebidas alcóolicas (e provavelmente às festas) farão com que menos pessoas compareçam apenas pela diversão de estar em um ambiente de Copa do Mundo, participar das Fans Fests e fazer turismo.

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Isso tende a transformar a Copa em um ambiente certamente mais relacionado aos aficionados por futebol e menos aos “influencers” que só querem aparecer e tirar selfie – e geralmente perdem a melhor parte dos jogos.

Não é um problema do Qatar. Quando se escolhe a sede ela vem com um pacote cultural. Na Alemanha e no Brasil as festas foram garantidas, regadas a cerveja e música. Na Coreia e no Japão talvez tenha sido menos festeira, e na Rússia vimos algumas represálias policiais quando havia exageros. Parte da cultura e do pacote.

Para quem irá acompanhar os jogos, teremos uma competição disputada em um espaço territorialmente pequeno, onde os estádios encontram-se próximos e o deslocamento para quem ficar no Qatar será fácil (desde que sejam atendidas todas as regras do país).

O fato é que a Copa do Qatar vai começar. Como fã de futebol, espero uma competição equilibrada, na qual o Brasil é sim um dos favoritos. A seleção deve chegar às quartas de final e a partir daí “Copa do Mundo é Copa do Mundo” (a competição em que a bola às vezes entra por acaso, às vezes não).

Até o final da Copa os temas da coluna devem ser relacionados à competição, exceto se, em edição extraordinária, surgir alguma nova SAF, a formalização da liga de clubes no Brasil, a venda de algum clube gigante ou qualquer tema relacionado a gestão e finanças do esporte.

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Boa Copa a todos!

Cesar Grafietti Economista, especialista em Banking e Gestão & Finanças do Esporte. 27 anos de mercado financeiro analisando o dia-a-dia da economia real. Twitter: @cesargrafietti

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