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INFLAÇÃO no Brasil e nos EUA, AÇÕES de VAREJO, carros híbridos da TOYOTA e análise técnica

A chegada dos fundos de private equity no futebol europeu

O interesse que tantos investidores de longo prazo têm no futebol mostra que há muito a ser explorado e desenvolvido - e que o esporte continua a ser um negócio interessante
Por  Cesar Grafietti -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Estamos de volta ao tema do clube empresa. Com a chegada do senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG) à presidência do Senado, voltamos a falar sobre os projetos de lei que normatizam a transformação de associações sem fins lucrativos em empresa.

A ideia não é voltar a defender ou criticar o tema, porque todos já sabem o que eu penso: o modelo societário não é garantia nem de sucesso, muito menos de fracasso. O objetivo é trazer alguns movimentos recentes no mundo do futebol associados à questão societária.

Primeiro falamos sobre movimentos no Brasil, em destaque o Cruzeiro. O clube anunciou a contratação da consultoria EY para desenvolver um modelo de transformação da associação em empresa.

Nessa hora, a turma “do contra” grita e lembra de casos como Figueirense, Bahia e Vitória, e como eles deixaram rastros ruins.

Pois é verdade, assim como também é verdadeiro o fato de eles terem ocorrido sem os devidos processos de due dilligence, debates, discordâncias, com o objetivo de chegar num modelo que fosse bom para todas as partes. Faltou transparência.

Aliás, a falta de transparência marcou boa parte dos processos de cogestão que foram moda no Brasil nos anos 1990 e início dos anos 2000. Tudo negociado e discutido internamente, “sob sigilo”.

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Ao torcedor vem apenas a informação de que “vamos ter dinheiro e montar um grande time”. Invariavelmente, a decolagem se transforma num voo de galinha e o sucesso de curto prazo vira um problema no longo prazo.

No processo do Cruzeiro, a primeira coisa feita foi dizer quem o lidera, quais são as pessoas envolvidas, e até uma conversa no Clubhouse já ocorreu, convidando torcedores a participar e tirar dúvidas.

Não faço parte do processo, mas participei como convidado nessa conversa. Está muito claro que será um movimento aberto, debatido e ninguém tem um modelo de prateleira pré-definido que salvará o clube, como mágica.

O Brasil não tem experiências positivas com modelos de conversão. O torcedor tem muito receio de ficar refém de um acionista – isso quando já é refém de um grupo de pessoas físicas sem compromisso financeiro em relação à gestão, e muitas vezes dependentes de mecenas que aportam dinheiro e transformam o momento do salto num voo de galinha.

Por isso, transparência é fundamental para ouvir as dores e dúvidas dos torcedores, de forma a buscar um modelo que seja o mais eficiente e apropriado ao que esperam.

Afinal, se os clubes têm um mercado consumidor cativo, se mal cuidado ele pode ser finito.

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Substituição na Europa: saem os chineses, entram os fundos de private equity

Desde o ano passado, o governo chinês colocou restrições a investimentos de companhias e pessoas físicas locais em clubes de futebol fora do país. Depois de alguns anos comprando clubes pela Europa, especialmente na Inglaterra, os empresários chineses se viram obrigados a saírem de cena.

A ideia do governo chinês é fazer com que os investimentos retornem ao desenvolvimento do futebol local, dentro de condições menos agressivas. Além de impedir compras de clubes no exterior, o governo limitou gastos e investimentos no futebol local.

O governo observou que, desde o boom iniciado com a contratação de Tévez em 2017, o futebol local não se desenvolveu como esperado, nem internamente, nem por meio de intercâmbios com clubes europeus. Nenhum atleta chinês chegou a integrar o elenco de alguma equipe europeia relevante.

Internamente, os efeitos começam a ser sentidos, seja com o cancelamento de transmissões da Premier League e da Serie A, passando pelo fim das atividades do Jiangsu Suning, atual campeão chinês e que pertence ao mesmo grupo dono da Inter de Milão.

Falando nos nerazzurri, o clube milanês enfrenta momento financeiro delicado. Com o crescimento do prejuízo em função da pandemia, e obrigações salariais pendentes após acordo com os atletas, os chineses do Suning colocaram o clube à venda.

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E daí vem a sequência da nossa conversa: quem tende a ocupar o espaço será um fundo de private equity, o que significa uma mudança importante no conjunto de peças do tabuleiro esportivo-financeiro europeu.

De forma bem simples, os fundos de private equity são estruturas que captam dinheiro de investidores para comprar empresas. Os investidores aportam capital esperando recebê-lo no longo prazo – fundos costumam ter entre sete e dez anos para devolver o investimento feito – com um retorno robusto.

Esse movimento começou no final da década passada, quando uma série de fundos americanos compraram clubes da Premier League, de olho num enorme potencial de crescimento de receitas, o que traria uma possibilidade de valorização. Mas há casos fora da Inglaterra como a chegada do Fundo Elliott ao Milan, justamente ocupando o espaço de um investidor chinês que não conseguiu honrar as dívidas pela compra do clube.

Agora os fundos voltam, de olho em duas oportunidades: i) clubes de futebol estão debilitados pela pandemia, precisando de dinheiro e ii) a ideia de que o futebol seguirá sendo o esporte mais popular do mundo e, assim que a pandemia arrefecer, o dinheiro retornará. Ou seja, a boa e velha lógica de comprar barato e vender caro.

A estratégia dos fundos e os investimentos estrangeiros na Europa

Os fundos de private equity costumam entrar em ativos em que enxergam potencial de valorização, e costumam deixar os investimentos de duas formas: i) vendendo para algum interessado, chamado de “player estratégico” – ou seja, alguém que é do setor e quer aumentar presença no mercado; ou ii) via abertura de capital. Eles fazem isso com a tese de que compram por 10 e vendem por 50.

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Para atingir esse resultado, o fundo troca gestão, traz inovações, aporta recursos para equilibrar o desenvolvimento e fazer os investimentos necessários, além de organizar o endividamento.

Significa que sempre dá certo? Não, claro que não. Há casos em que o fundo compra empresas saudáveis, com potencial de crescimento, mas precisando de dinheiro para crescer. Os fundos chegam, mudam tudo e acabam por gerar resultado negativo.

Ou seja, nada garante nada. Aliás, apenas boa gestão, com acesso eficiente a dinheiro, é que dá resultado positivo, em qualquer negócio.

Assim como fundos de private equity, investidores americanos também estão de olho nos clubes europeus.

O movimento mais recente foi a aquisição do Spezia, clube italiano que disputa a Serie A pela primeira vez, por cerca de € 20 milhões.

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A ideia do investidor Philip Platek é manter a estrutura de gestão inalterada neste momento, pois encontrou um clube organizado, e fazer investimentos para que a instituição cresça e se sustente na primeira divisão italiana.

Um dos objetivos dos investidores americanos que compram clubes europeus é fazer um novo estádio com um conjunto de edifícios comerciais no entorno. Isso se repete nos casos do Parma, Fiorentina, Roma e Milan.

Outro caso interessante é o do SSD Campobasso, equipe que disputa a Serie D italiana e sediada em uma cidade de 46 mil habitantes na região centro-sul da Itália.

O ítalo-americano Matt Rizzetta comprou 49% do clube em conjunto com um fundo suíço e tem como objetivo transformar a equipe numa referência para ítalo-americanos, com um projeto de longo prazo para levá-lo à Serie A em até 10 anos, de forma sustentável.

O Campobasso inclusive tem acordo de transmissões das suas partidas da Serie D para os EUA, pois a competição não tem negociação internacional de direitos. Projeto de longo prazo, com paciência.

Os fundos de private equity também estão buscando oportunidades além dos clubes, como participações nas ligas. Negociações com a Serie A italiana e a Bundesliga alemã estão em andamento, e mostram que há um olhar de oportunidade para o “negócio futebol”.

Olhar este que está baseado em algumas premissas, conforme matéria do site Off the Pitch. Segundo Dan Plumley e Rob Wilson, doutores da Sheffield Hallam University, o futebol tem características que despertam interesse no mundo dos investimentos: i) é um produto de demanda inelástica; ii) não é de luxo, mas é uma necessidade para muitos; iii) o desenvolvimento costuma ser de longo prazo, tempo de maturação dos fundos. Outro aspecto importante é o da autoregulação através de ligas, o que garante um mercado organizado.

Ao mesmo tempo, é preciso ponderar alguns riscos, como a ação de regras de controle de aportes infinitos de recursos. Os sistemas nacionais e continental de fair play financeiro barra excessos, o que impede injeções vultosas de capital sem lastro nas receitas.

Além disso, há um risco inerente à indústria, que é o rebaixamento. Investidores temem essa possibilidade, pois ela significa voltar algumas casas no tabuleiro que leva ao objetivo de venda futura.

Aliás, venda futura é o objetivo de todos. No futebol, ninguém ganha dinheiro com a operação em si, exceto se o modelo de negócios for de revelar e vender atletas.

Equipes que competem em alto nível para conquistar títulos raramente retiram dinheiro para os acionistas, porque isso diminui a capacidade de competição. Quando acionistas retiram dinheiro, pouco impactam na capacidade do clube.

No futebol, “negociação” significa comprar times baratos, reformulá-los, fazê-los crescer e depois vende-los. E aqui reside mais um risco para os private equities: o mercado não é tão simples assim, então haverá sempre o risco de falta de demanda na hora de vender o clube.

Mas qual o ponto em relação a este tema?

Antes que os terraplanistas pensem que estou defendendo a chegada de fundos de private equity ao futebol brasileiro como a salvação da lavoura, o ponto que quero levantar é o de quanto o esporte, e o futebol especialmente, continuam sendo ativos de alto valor de demanda, mesmo considerando uma série de previsões catastróficas em relação ao relacionamento com os torcedores e fãs.

Há inúmeros artigos e estudos que indicam que a Geração Z não gosta de esporte, não tem paciência para acompanhar o futebol, e se envolve com outras alternativas de entretenimento mais do que com o futebol.

Ok, mas falavam isso dos Millennials e seu envolvimento quando chegaram à fase madura da geração é semelhante ao das outras gerações.

De qualquer forma, é fundamental que a indústria esteja alerta e pronta para esses desafios, e o interesse que tantos investidores de longo prazo têm no tema mostra que há muito a ser explorado e desenvolvido, e que o futebol continua a ser um negócio interessante. Em algum momento perceberão isso no Brasil.

Esperamos que não seja tarde.

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Cesar Grafietti Economista, especialista em Banking e Gestão & Finanças do Esporte. 27 anos de mercado financeiro analisando o dia-a-dia da economia real. Twitter: @cesargrafietti

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