Financiamento Habitacional (1)

Quem quer comprar um imóvel encontra financiamentos habitacionais a custos baixos, ou seja, em que o dinheiro emprestado é barato

Rubens Menin

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Já me referi por diversas vezes às condições muito favoráveis para aqueles que financiam, atualmente, a aquisição da casa própria através mecanismos usuais de crédito imobiliário. Essas vantagens correspondem, na prática, às possibilidades de obtenção de financiamentos habitacionais a custos baixos, ou seja, à obtenção de empréstimos para a compra de imóveis nos quais o dinheiro emprestado é barato (tem preços pequenos). Essa circunstância particular da nossa realidade econômica atual já deu origem, inclusive, a expressões do tipo: “juros negativos no financiamento habitacional”. É uma simplificação. Na realidade, o que essa expressão tenta enfatizar é o fato de que o custo desse financiamento (remuneração do capital emprestado), tratado simplificada e englobadamente como “juros”, não está sendo suficiente, em alguns casos, para sequer cobrir a inflação no período. Ou seja, o agente financeiro que emprestou o capital ao tomador do empréstimo terá recebido de volta, ao final do contrato, um montante inferior ao valor corrigido da quantia originalmente cedida (com a correção monetária da perda inflacionária, para recompor a mesma capacidade de compra inicial do dinheiro emprestado).  Esse quadro de “dinheiro barato” tende a permanecer por mais algum tempo? Até quando os tomadores do crédito habitacional continuarão a se beneficiar das vantagens atuais? Por que isso está acontecendo? Essas são perguntas que recebo frequentemente, inclusive dos leitores deste blog. Por conta desse interesse, optei por uma abordagem mais detalhada e por uma contextualização mais ampla do assunto.

De modo geral, na maioria das economias e em quase todas as épocas, os empréstimos de longo prazo, como é o caso dos financiamentos habitacionais, costumam ter o seu pagamento ou restituição final calculado como a soma de duas parcelas: uma de correção monetária para atualizar o valor do dinheiro e uma que corresponde aos “juros” propriamente ditos, sendo essa última a verdadeira remuneração do capital cedido por empréstimo. Outras incidências eventuais, como taxas de abertura de crédito, custos cadastrais, prêmios de seguro do bem oferecido em garantia, impostos de natureza financeira, embora possam estar presentes nas operações de crédito respectivas, não representam componentes da remuneração do capital emprestado.

Em uma economia saudável, que estivesse garantidamente imune à inflação e aos seus efeitos na erosão dos valores expressos na moeda corrente (e uma das funções legais de qualquer moeda é representar uma reserva de valor), a primeira das parcelas mencionadas no parágrafo anterior deixaria de ser necessária, de vez que não haveria necessidade de correção monetária do capital originalmente cedido por empréstimo, bastando a remuneração devida na forma dos “juros”. Em muitas economias estáveis, com inflação nula ou muito baixa por períodos suficientemente longos para a consolidação dos hábitos e das práticas comerciais, a correção monetária explícita tem sido abolida nos financiamentos de longo prazo e o pagamento dos empréstimos tem sido calculado apenas com o acréscimo dos “juros” ou remuneração propriamente dita do capital. Nas economias que enfrentam ou já enfrentaram surtos inflacionários muito intensos, a parcela de correção monetária, além de presente como hábito geral, pode alcançar valores desproporcionalmente superiores aos dos “juros” propriamente ditos.

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Os mecanismos de proteção do capital com a sua correção monetária têm sido uma prática corriqueira e tradicional na economia brasileira, em função dos prolongados períodos de surtos inflacionários muito intensos que vivenciamos, notadamente a partir da segunda metade do século passado. Aliás, a indexação plena da economia, com a correção automática e ampla de todos os valores monetários em períodos muito curtos (alcançando o extremo de um dia) foi uma invenção brasileira, conquanto tenha sido absorvida, posteriormente, por outras economias que também passaram ou passam por situações semelhantes.

Achei importante fazer essas observações de caráter geral, como contextualização introdutória para a abordagem das questões que realmente interessam nesta análise, quais sejam, as variáveis que explicam os custos atuais do financiamento habitacional e que podem interferir na eventual continuidade das condições de obtenção futura de crédito imobiliário barato. A partir dessa base conceitual, pretendo desenvolver o assunto, de forma mais objetiva, em tópicos subsequentes.

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