O que um vendedor de bananas operando na Bolsa da China tem a ver com a crise de 1929?

O problema não é ser um engraxate ou um vendedor de bananas, mas o seu preparo (ou a falta dele) vai demonstrar a sua capacidade de ganhar dinheiro com ações
Por  Equipe InfoMoney
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SÃO PAULO – Em 1929, os Estados Unidos enfrentaram um crash na Bolsa de Valores de Nova York que culminou no início do tenebroso período da Grande Depressão. Em 2015, uma bolha acionária está em vias de estourar na China e tem produzido fortíssima volatilidade e perda de valor de mercado das empresas – provocando medidas drásticas do governo chinês.

Com um forte controle de capitais como vemos na China, é difícil imaginar que uma crise por lá traga o mesmo tipo de impacto recessivo na economia global que o ocorrido em 1929. Mas o que podemos perceber é que há pelo menos um sintoma compartilhado pelos dois eventos: antes do crash nos EUA, o número de investidores pessoa física tinha aumentado exponencialmente, assim como temos vistos no gigante asiático.

Não é como se o acesso de pessoas de menor renda ao mercado de capitais fosse errado, muito pelo contrário. Quem dera se no Brasil o mercado de ações tivesse esse mesmo acesso: em um território com quase 180 milhões de pessoas, é triste pensar que pouco menos de 600 mil brasileiros possuem CPFs cadastrados na Bovespa – se formos analisar os investidores que estão com suas contas ativas, esse número cai para menos da metade. Já na China, hoje temos 90 milhões de investidores individuais na Bolsa, com um crescimento médio de 1 milhão por semana, de acordo com a China Securities Depository and Clearing Corp (CSDC).

Contudo, por envolver investimentos de alto risco e que dependem de grandes conhecimentos sobre o funcionamento do mercado financeiro, pessoas que entram na Bolsa despreparadas, motivadas apenas pela vontade de ganhar dinheiro fácil, nunca é um bom sinal. Por isso que a imagem que circulou pela internet mostrando um vendedor de bananas chinês com o home broker aberto para fazer trades tem muito a nos dizer sobre bolhas acionárias, pois qualquer conhecedor da história do mercado irá se recordar do engraxate de Wall Street pouco antes da crise de 1929.

Diz a anedota que Joseph Kennedy um dia foi engraxar seus sapatos e acabou ouvindo conselhos de investimentos do engraxate. Intrigado, já que o mercado acionário sempre foi visto como um lugar onde apenas os mais ricos colocam seu dinheiro, ele decidiu vender todos os papéis que tinha na Bolsa. Pouco tempo depois aconteceu a “sexta-feira negra”, o crash da Bolsa de Valores de Nova York que marcou o início da Grande Depressão.

Vendedor de banana trader

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A imagem do trader chinês dividiu opiniões: há os que acreditam que isso define uma bolha, outros julgam isso como um pensamento preconceituoso por não exaltar o fato positivo de que há mais pessoas investindo em ações. Nós, do InfoMoney, adoraríamos que cada feirante do Brasil tivesse um computador conectado na Bolsa de Valores (sem dúvida teríamos muito mais acesso ao nosso portal), mas brincadeiras a parte, a história já nos mostrou o risco existente quando todo mundo já está dentro do mercado de ações.

É preciso saber investir
Há muitos casos de megainvestidores que começaram debaixo, como é o caso de Luis Barsi, que contrariando tudo o que Joseph Kennedy pudesse dizer sobre engraxates, engraxou sapatos para ajudar a mãe a pagar as contas quando era criança e morava em um cortiço no Brás, no centro de São Paulo. Barsi hoje é dono de um patrimônio de mais de R$ 1 bilhão aplicados em ações. 

A diferença é que Barsi sempre foi um estudioso do mercado acionário, e é isso que conta. Não é a classe social, a raça, a cor, o gênero ou a orientação sexual de uma pessoa que define seu sucesso neste mundo. Tudo depende do preparo. Tanto nos EUA de 1929 quando na China de 2015, este preparo de muitos investidores pode ser colocado em dúvida. 

Dos novos investidores na bolsa chinesa, 25,1% cursaram apenas o ensino fundamental, enquanto 5,8% são analfabetos, segundo a SWUFE China Household Finance Survey. Ou seja, o vendedor de bananas da foto pode muito bem ser um bom trader, não é possível chegar a qualquer conclusão só vendo a imagem, mas é preciso questionar o mesmo de uma pessoa que sequer sabe ler e escrever.

Para finalizar, deixo o exemplo dos ciclos de euforia e pânico que sempre se repetem no mercado financeiro que ouvi de um dos editores do InfoMoney: a última fase de euforia do mercado pode se chamar fase “Ana Maria Braga”, que é quando até num programa diário matinal voltado para donas de casa você ouve dicas sobre investimentos em ações. 

Assim, é preciso ter em mente duas coisas: i) o mercado de ações (assim como o mercado de bananas) é regido pela leia da oferta e da demanda: quanto maior a demanda em relação à oferta, mais altos serão os preços; ii) quanto maior a renda e a poupança de uma pessoa, maior a flexibilidade em alocar esse capital em investimentos.

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Partindo dessas duas premissas, percebemos uma semelhança entre o engraxate americano de 1929 e o vendedor de bananas chinês de 2015: se até ele está negociando ações, podemos presumir que todas as pessoas cuja renda é superior a um vendedor de bananas está no mercado – o que pode ser explicado pela forte alta das ações. Se isso for verdade, fica a pergunta: quem ainda não entrou no “jogo” do mercado de ações – ou melhor: quem vai querer comprar as ações que você possui?

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