Comunicação com TDAH: como apoiar líderes e comunicadores com perfis neurodivergentes

Fomentar o desenvolvimento de pessoas é estratégia de negócio

Alessandra Braga

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Publicidade

No ambiente corporativo, percebo que comunicar bem vai além de uma habilidade desejável, é um diferencial competitivo. Reuniões claras, apresentações envolventes e discursos que inspiram podem acelerar decisões estratégicas, consolidar lideranças, e claro, trazer resultados para as empresas. Mas, vejo que para profissionais com TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade), essa tarefa carrega desafios específicos que muitas vezes passam despercebidos.

Segundo a Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA), o TDAH atinge de 5% a 8% da população mundial. De fato, uma parcela deles são executivos e profissionais que vivem, diariamente, o esforço de transformar suas ideias em mensagens claras e consistentes, sem perder o fio da meada.

Quando um líder se comunica, ele influencia a dinâmica das equipes e o andamento dos projetos. No caso de profissionais neurodivergentes, o desafio é ainda maior, pela propensão em se dispersar com os estímulos do ambiente, se perder em meio ao próprio raciocínio ou com as perguntas que, naturalmente, surgem durante reuniões importantes.

Continua depois da publicidade

Por outro lado, há o extremo oposto também, com o risco da pessoa com TDAH mergulhar em um hiperfoco que a desconecta da audiência, destrinchando detalhes durante sua fala que podem soar irrelevantes e, sem dúvida, tornando a apresentação chata, prolixa ao criar obstáculos que podem comprometer a clareza e efetividade de uma apresentação estratégica em reuniões.

O risco é transformar ideias promissoras em mensagens confusas e cansativas.

A boa notícia é que ao longo de mais de 10 anos treinando diferentes perfis de líderes, percebi que algumas técnicas podem ser muito eficazes para apoiar esses profissionais em momentos decisivos de apresentações.

Continua depois da publicidade

O primeiro passo é a tomada de consciência. Cada pessoa precisa reconhecer suas forças e pontos de limitações para ser capaz de se preparar com excelência e aproveitar da melhor maneira as oportunidades.

Por exemplo, quem convive com o TDAH sabe que o chamado “branco” no meio de uma fala pode desestabilizar a apresentação inteira. É por isso que o preparo assume um papel central.

Lembre-se de estruturar as mensagens no papel ou no word para ter uma visão linear e didática do seu discurso. Se puder, marque em negrito as palavras-chave ao longo do seu texto para servir de guia ao estudar o seu material e servir de lembrete na hora da apresentação. Tudo bem ter uma folha para consultar ou o powerpoint para te guiar e reter a atenção da sua audiência.

Continua depois da publicidade

Outra técnica importante, quando for estudar a apresentação, se estiver em powerpoint, divida-a mentalmente em 3 blocos: começo, meio e fim. Daí, ensaie em especial, a abertura e o fechamento da apresentação pelo menos três vezes. Por experiência, ao treinar centenas de profissionais ao longo dos anos para convenções, palestras, reuniões de resultado, posso te garantir que os momentos mais difíceis para a maioria são a abertura e o encerramento.

O início é quando a adrenalina ainda está em alta, a respiração fica ofegante e o coração dispara… e cá entre nós, o risco de esquecer ou “tropeçar” nas palavras logo de cara pode sabotar você no restante da apresentação. E treinar o fim é estratégico, porque terminar em alta e lembrar de provocar os próximos passos é essencial.

Há também a questão das interrupções. Para quem tem TDAH, ser desviado do raciocínio por perguntas ou comentários fora do escopo pode comprometer toda a linha de pensamento. A saída, acredito, não está em censurar a interação, mas em redirecioná-la. Por isso, ter como guia o mapa mental em tópicos, símbolos ou slides é essencial para te ajudar a retomar a conversa.

Continua depois da publicidade

Se por um lado quem tem TDAH luta para evitar a dispersão do objetivo, por outro extremo, também existe o excesso, já que o hiperfoco também é uma característica desse perfil quando se interessa muito pelo assunto. O risco? Cansar a audiência com uma exposição prolixa, longa e detalhada, que se desconecta do público. É aqui que técnicas como storytelling, pausas estratégicas e a gravação prévia de ensaios entram como ferramentas que recomendo. O objetivo não é limitar a profundidade, mas garantir que a narrativa mantenha a audiência junta até o fim.

Um exercício muito eficaz para quem tem TDAH conseguir manter o foco no roteiro que planejou é repetir em voz alta e em até 1 minuto o tema central de cada slide da apresentação. Isso ajudará a memorizar os pontos essenciais e manter a clareza do raciocínio sem correr o risco de ser prolixo ou se perder ao longo do discurso.

O mesmo vale para a gestão do tempo, frequentemente um ponto crítico. Minha sugestão é combinar no início da reunião o tempo, usar um cronômetro visível ou ter um colega aliado que sinalize quando faltarem poucos minutos para te ajudar a manter a objetividade sem prejudicar sua autenticidade.

Continua depois da publicidade

É provável que você que lê esse artigo nem tenha TDAH, mas já parou para pensar que na sua audiência na próxima apresentação pode ter alguém neurodivergente tomador de decisão?

E como reter a atenção das pessoas? Fica um conselho para você: lembre-se que a forma é tão importante quanto o conteúdo. A maneira como você irá expressar sua mensagem é decisiva para prender a atenção das pessoas, gerar esclarecimento e claro, alcançar seu objetivo ao final da reunião. Mostre a relevância do que tem para falar logo de cara e por quê elas devem te ouvir.

Além disso, fuja da monotonia. Mantenha uma postura aberta, explore as suas caras e bocas e expressão vocal para trazer energia e emoção na sua fala. O uso de pausas, variar o ritmo de fala, usar o gestual em sintonia com a mensagem é essencial para você cativar a audiência e a manter com você.

Como você pode ver, há diferentes perfis de pessoas, formas de atenção e raciocínio que, quando respeitados, ampliam a força da mensagem.

O papel das áreas de RH e treinamento e desenvolvimento de empresas é muito estratégico. As empresas precisam estar atentas ao impacto que os líderes tem no dia a dia no alcance de resultados e oferecer condições para que essas diferenças não sejam barreiras, mas ativos. A clareza na fala e a escuta ativa se tornam aliados de uma cultura organizacional que apoia o time a potencializar as habilidades.

Fomentar o desenvolvimento de pessoas é estratégia de negócio. Por trás de cada estilo de atenção existe potencial criativo, capacidade de liderança e poder de engajamento. Quando o ambiente favorece a clareza e o foco, os talentos se destacam e os resultados se multiplicam.

Autor avatar
Alessandra Braga

Alessandra Braga é jornalista, Mestra em linguística aplicada pela PUC/SP e expert em palestras TED Talks. Em sua trajetória profissional, passou por diversas áreas da comunicação. Foi repórter de TV, produziu e dirigiu programas ao vivo, atuou numa agência de produção de vídeos corporativos e como roteirista em uma agência de apresentações. Com esse repertório, passou a trabalhar no meio corporativo, aliando a habilidade de comunicação às dinâmicas de convenções, reuniões de resultados, eventos para lançamentos de produtos, dentre outros momentos decisivos nas grandes empresas. Há 10 anos a comunicadora é a fundadora e CEO da All Presentations, empresa responsável por preparar líderes de alta performance para momentos estratégicos por meio de workshops e palestras in company, além de ensaios individuais para momentos decisivos. Ao longo desses anos, já trabalhou com grandes empresas de diferentes segmentos como Bradesco, VLI, Merz, Ericsson inovação, Aramis, Dotz, Moema Wertheimer Arquitetura, Ifood, palestrantes reconhecidos.