Trabalho escravo: Aurora, Garibaldi e Salton fazem acordo de R$ 7 milhões com MPT

207 trabalhadores foram resgatados em condições de trabalho análogas à da escravidão na Serra Gaúcha; empresa terceirizada não assinou o acordo

Lucas Sampaio

Alojamento dos trabalhadores resgatados em situação análoga à escravidão na Serra Gaúcha, no Rio Grande do Sul (Foto: Reprodução/MPT-RS)

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As vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton assinaram um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) de R$ 7 milhões com o Ministério Público do Trabalho (MPT), após a operação que resgatou 207 trabalhadores que enfrentavam condições de trabalho análogas à da escravidão em Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha.

O acordo prevê 21 obrigações, para disciplinar a contratação de serviços terceirizados e impedir que o problema volte a ocorrer. O MPT diz que o descumprimento de cada cláusula é passível de multa de até R$ 300 mil (e que as punições são cumulativas e a cada constatação).

Os R$ 7 milhões são de indenização por danos morais individuais e danos morais coletivos. As três empresas terão 15 dias para pagar a indenização por danos individuais aos resgatados, e os valores do dano coletivo serão revertidos para entidades, fundos ou projetos.

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O MPT diz também que a empresa terceirizada Fênix já pagou mais de R$ 1,1 milhão em verbas rescisórias aos trabalhadores (pouco mais de R$ 5 mil para cada um), mas a investigação sobre ela continua, pois os seus representantes rejeitaram a possibilidade de um acordo (veja mais abaixo).

Entenda o caso

As vinícolas Aurora, Cooperativa Garibaldi e Salton, que estão entre as maiores e mais importantes do Brasil, contratavam os serviços terceirizados da Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda, empresa flagrada mantendo os trabalhadores em condições degradantes. A maioria era da Bahia.

A Brigada Militar do Rio Grande do Sul (a PM gaúcha) investiga até se forças de segurança coagiram e torturaram os trabalhadores. O grupo foi resgatado em 22 de fevereiro, em uma ação conjunta da Polícia Rodoviária Federal (PRF), da Polícia Federal (PF), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e do MPT do Rio Grande do Sul.

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A operação ocorreu após três trabalhadores fugirem do alojamento e denunciarem a situação à PRF em Caxias do Sul (a cerca de 40 km de Bento Gonçalves). Eles dizem ter sido atraídos pela promessa de R$ 3 mil de salário, hospedagem e alimentação, mas enfrentaram atrasos nos pagamentos, violência física, longas jornadas de trabalho e oferta de alimentos estragados.

Eles também relataram que, desde a chegada na Serra Gaúcha, eram coagidos a permanecer no local, sob pena de pagar multa por quebra do contrato de trabalho, e só podiam comprar produtos em um único estabelecimento, com preços elevados e descontados no salário, além de permanecerem vinculados ao trabalho por supostas “dívidas” contraídas com o empregador.

Detalhes do acordo

O acordo foi assinado na noite de quinta-feira (9), após mais de oito horas de audiência, e prevê também que as empresas terão de fiscalizar as condições de trabalho e direitos de trabalhadores próprios e terceirizados e monitorar o cumprimento de direitos trabalhistas na sua cadeia produtiva.

A vinícolas também se comprometeram a:

Pelo acordo, as três vinícolas também se comprometeram a garantir o pagamento das indenizações individuais aos trabalhadores resgatados, em caso de impossibilidade por parte da empresa terceirizada.

Empresa terceirizada

O dono da empresa é Pedro Augusto Oliveira de Santana, responsável por recrutar e manter os trabalhadores. Ele chegou a ser preso no dia da operação, mas pagou fiança de R$ 40 mil e responde ao processo em liberdade.

A empresa Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda chegou a pagar R$ 1,1 milhão em verbas rescisórias após o resgate, mas, ao contrário das três vinícolas, recusou-se a firmar acordo com o MPT.

O Ministério Público pediu o bloqueio judicial de bens de Santana, até o valor de R$ 3 milhões (recurso estimado para garantir o pagamento de indenizações por danos morais individuais, bem como das verbas rescisórias e demais direitos de trabalhadores).

A 2ª Vara do Trabalho de Bento Gonçalves acolheu o pedido. O juiz Silvionei do Carmo determinou o bloqueio de bens de 9 empresas e 10 pessoas envolvidas no caso. O processo e a decisão do dia 3 estavam em segredo de Justiça, mas o magistrado retirou o sigilo da Ação Civil Pública na quinta-feira (9).

Despacho publicado pelo juiz ontem indica que apenas R$ 70 mil foram bloqueados em contas bancárias dos réus. Houve também a restrição de 43 veículos, cujos valores ainda serão avaliados, e o juízo ainda aguarda o resultado dos atos de restrição de imóveis em nome dos envolvidos.

(Com informações do MPT)

Lucas Sampaio

Jornalista com 12 anos de experiência nos principais grupos de comunicação do Brasil (TV Globo, Folha, Estadão e Grupo Abril), em diversas funções (editor, repórter, produtor e redator) e editorias (economia, internacional, tecnologia, política e cidades). Graduado pela UFSC com intercâmbio na Universidade Nova de Lisboa.