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SÃO PAULO – As recentes intervenções do Banco Central aumentaram as preocupações dos analistas em relação à intensa valorização do real nos últimos meses. A despeito do impacto positivo na inflação, decorrente do barateamento dos produtos importados, um real mais forte dificulta em muito a vida dos exportadores, reacendendo os temores quanto a futuros problemas nas contas externas.
De qualquer modo, a apreciação do real frente ao dólar norte-americano encerra o segundo grande ciclo de desvalorização da divisa brasileira, desde sua criação, em 1994. A grande incerteza dos investidores acerca do governo Lula acabou impulsionando a moeda brasileira, revivendo o intenso processo de desvalorização que havia ocorrido pela primeira vez após a reeleição do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Assim, no último dia 3 de dezembro, o real registrou a sua cotação mais baixa durante todo o governo Lula, atingindo R$ 2,696 durante o dia. Desde 19 de junho de 2002, antes, portanto das eleições presidenciais, a moeda brasileira não atingia um valor tão baixo frente ao dólar.
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Segundo ciclo de desvalorização foi menor
Considerando-se o comportamento da moeda brasileira após o a reforma monetária que criou o real, para muitos analistas a terceira fase da recente história da moeda brasileira está se encerrando. Depois de um longo período marcado pela forte valorização do real, a divisa brasileira sofreu uma intensa desvalorização em janeiro de 1999, basicamente em decorrência do grande déficit em conta corrente acumulado pelo país.
Este primeiro ciclo de desvalorização acabou se mostrando mais forte do que o atual ciclo, causado pelas tensões decorrentes da vitória do PT nas urnas. Embora tenha superado a barreira dos R$ 3,80 nas proximidades das eleições presidenciais, após ter sido cotada por menos de R$ 2,30 em abril de 2002, contabilizando-se o efeito da inflação e do comportamento das demais moedas, a desvalorização do real acabou sendo bem menor.
Desempenho real é o que vale para a economia
Ao se analisar o desempenho da taxa de câmbio de um país é necessário levar em conta múltiplos fatores. Obviamente, um deles é o próprio valor nominal da divisa do país, que é a própria cotação da moeda. Contudo, é também muito importante considerar a diferença da inflação entre o Brasil e o mundo, bem como a oscilação e importância de cada moeda que é usada no comércio exterior brasileiro.
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Com isto, os economistas criaram o conceito chamado de taxa de câmbio efetivo, que leva em conta todos estes fatores, ponderando a importância de cada moeda proporcionalmente ao tamanho do comércio bilateral brasileiro com cada país. Desta forma, é possível medir a desvalorização real da moeda brasileira.
Inflação neutralizou parte importante da desvalorização
Embora a moeda brasileira tenha sofrido uma desvalorização brutal durante o segundo semestre de 2002, a alta da inflação decorrente do aumento dos preços de produtos importados acabou neutralizando parte da depreciação do real. Esta diferença entre 1999 e 2002 se deveu, em linhas gerais, a própria compressão das margens das empresas causada pelo primeiro ciclo de desvalorização, majorando os repasses para os consumidores.
Assim, mesmo após uma impressionante queda de quase 65%, a alta da inflação para 14,74% em 2002 e 10,38% no ano seguinte reduziu parte importante do efeito real da perda de valor do real. Enquanto, por sua vez, no primeiro biênio após a desvalorização de janeiro de 1999, a variação do nível de preços foi menor, respectivamente de 8,43% e 5,27%, medidos pelo INPC do IBGE.
Confira o desempenho da taxa de câmbio efetiva do Brasil, tendo como base o desempenho real médio da divisa brasileira em 2000. Para o ano corrente, considerou-se até o mês de outubro.
Ano | Taxa Câmbio Efetiva | Variação |
1996 | 70,91 | – |
1997 | 70,92 | 0,01% |
1998 | 72,25 | 1,88% |
1999 | 106,05 | 46,77% |
2000 | 100 | -5,71% |
2001 | 118,59 | 18,60% |
2002 | 125,33 | 5,68% |
2003 | 124,92 | -0,33% |
2004 | 122,43 | -1,99% |
Fonte:IPEA
Manutenção da tendência de queda preocupa
Uma análise mais cuidadosa do desempenho da moeda brasileira, no entanto, preocupa uma vez que, a taxa de câmbio efetiva no mês de outubro fechou em 116,76, depois de ter atingido o pico de 129,55 em junho deste ano. Desta forma, o real está voltando lentamente ao patamar de 2000, o que poderá prejudicar futuramente as exportações brasileiras.
Queda dos salários em dólares foi decisiva
Embora a desvalorização do real nos últimos anos tenha sido apontada como um dos principais fatores para a forte expansão das exportações, a queda do salário dos trabalhadores brasileiros foi mais decisiva. Se uma parcela importante da desvalorização do real foi neutralizada com a alta dos preços, o cenário de lento crescimento econômico, impediu o repasse da inflação para os salários.
Desta forma, os salários pagos no Brasil sofreram uma significativa diminuição em dólares, o que, combinado à recuperação da economia mundial e à alta da cotação dos preços dos bens exportados, como é o caso da soja, por exemplo, tornou os produtos brasileiros altamente competitivos no exterior.
Confira abaixo a relação câmbio – salário para os últimos sete anos, tendo como ano base 1998. Quanto maior for o índice, menor será o poder de compra do trabalhador brasileiro medido na cesta de moedas estrangeiras que compõe o comércio exterior do Brasil. Para o ano corrente, considerou-se até o mês de outubro.
Ano | Relação Câmbio/Salário | Variação |
1996 | 104,07 | – |
1997 | 99,42 | -4,47% |
1998 | 100 | 1,49% |
1999 | 156,06 | 56,06% |
2000 | 144,01 | -7,72% |
2001 | 165,52 | 14,94% |
2002 | 182,16 | 10,05% |
2003 | 171,57 | -5,81% |
2004 | 149,57 | -12,67% |
Fonte:IPEA
Recuperação econômica impulsiona aumento salarial
A forte recuperação econômica ocorrida deste ano, com um crescimento projetado em torno de 5%, após a estagnação econômica dos últimos anos está dando um novo fôlego para as reivindicações de aumento salarial. Este fenômeno, adicionado à queda das cotações do real aumentou o poder de compra dos brasileiros em moeda estrangeira, o que significa, em última estância, o encarecimento do produto brasileiro para exportação.
Aumento da produtividade deverá sustentar as exportações
Após dois fortes ciclos de desvalorização do real, os produtores brasileiros terão que se adaptar ao novo cenário, deixando de contar com a compressão dos salários como forma de vantagem competitiva. A mudança da mentalidade dos empresários, levando-os a busca contínua de novos mercados deve ser casada com um incessante investimento no aumento da eficiência e assim, da competitividade de seu negócio.
A repetição de um novo ciclo de desvalorização, pelo menos em curto prazo, teria seus efeitos diminuídos, tendendo a provocar cada vez mais inflação e menos impacto positivo nas exportações. Além disto, uma nova minoração dos salários seria muito mal vinda, reduzindo o espaço de apoio político ao governo. A entrada em uma nova fase de crescimento somente será verificada se as exportações continuarem em expansão, permitindo o aumento das compras internas e logo da concorrência dos produtos importados, sem causar danos às contas externas do país.