Quais impactos a estabilidade no emprego após as férias traria para o mercado?

Comissão da Câmara aprovou PL que prevê estabilidade. Especialistas divergem sobre aspectos positivos e negativos

Camila F. de Mendonça

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SÃO PAULO – A estabilidade no emprego é um objetivo almejado por muitos profissionais. Instrumentos que proporcionam essa garantia, então, são bem-vindos, mas não são consenso entre agentes do mercado de trabalho. O tema voltou a ser discutido após a Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados ter aprovado projeto de lei que concede estabilidade de três meses após o retorno das férias.

O texto ainda está na Casa e será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Para se tornar lei, a medida (PL 3035/2008) precisará provar que é legítima e, de fato, necessária. “Na legislação, já temos estabilidades por demais”, acredita o coordenador da área trabalhista do Leite,Tosto e Barros Advogados, Marcus Vinícius Mingrone.

O advogado da Crivelli Advogados Associados, Renan Bernardi Kalil, entende que a medida trará mais segurança ao trabalhador. “Tem empregado que não tira férias por medo da demissão”, acredita.

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Sem sustos
O texto, de autoria do deputado Sandes Júnior (PP-GO), garante o emprego dos trabalhadores formais por um período de três meses também após o retorno de licença-maternidade ou afastamento involuntário não inferior a 30 dias.

Para o relator da comissão que recomendou a aprovação do projeto, deputado Paulo Rocha (PT-PA), a ideia é evitar sustos. “É preciso garantir que o funcionário possa se afastar do trabalho, seja por direito ou necessidade, sem sustos”, afirmou, de acordo com a Agência Câmara.

Para Mingrone, porém, se aprovada, a proposta pode engessar o mercado de trabalho. “Isso aumenta os custos que as empresas têm, prejudicando novas contratações”, justifica. Especialista na área de mercado de trabalho e doutor em Teoria Econômica, o professor da Unicamp (Universidade de Campinas) Anselmo Santos não vê prejuízos às empresas por conta da maior estabilidade para os trabalhadores. “Não vai engessar o mercado de trabalho. De maneira geral, as empresas não gostam de qualquer tipo de legislação”, afirma.

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Ele ressalta que havia no Brasil a ideia de que, se os salários aumentassem, o mercado de trabalho formal diminuiria, pois com encargos maiores, as empresas deixariam de contratar. “Vemos que isso não ocorreu”, afirmou. Isso porque os fatores que mais influenciam as contratações ou demissões não são de natureza trabalhista, mas econômica. “O contexto econômico é que vai determinar as contratações e não a legislação”, ressalta o professor.

Na avaliação de Santos, se a medida se tornar lei, ela virá em boa hora. “A força de trabalho excedente no País é muito grande. Temos uma rotatividade muita alta e, se não existir regulação, o mercado de trabalho fica precário”.

Os dois lados do mercado
Para Mingrone, é evidente que a proposta, que tramita desde 2008, traz a sensação de tranquilidade para o trabalhador, mas ele acredita que ela só ganhou voz agora por ser ano eleitoral. “É uma medida populista. Se não fosse ano eleitoral, ela não iria para frente”.

Hoje, não existem normas na legislação trabalhista que garantam o emprego do trabalhador de modo geral. A CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) prevê estabilidade para dirigentes sindicais e membros do Cipa (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes). Eles têm a vaga garantida por um ano após o mandato ou permanência na comissão.

A legislação também prevê certa garantia às mães, pois elas não podem ser demitidas em até 120 dias após o parto – considerando que a licença-maternidade atual é de 90 dias, elas têm um mês de estabilidade. A legislação também garante estabilidade de um ano ao trabalhador após retorno da recuperação de doenças ou acidentes gerados no trabalho.

Apesar disso, Mingrone lembra que existem muitas outras regras que garantem o emprego do trabalhador criadas e determinadas pelas convenções coletivas e sindicatos de cada categoria. “Estamos repletos de estabilidade”, reforça.

Kalil, por outro lado, enxerga aspectos positivos não só para os trabalhadores, mas também para as empresas. “É uma forma de prevenção, porque a garantia traz segurança ao trabalhador e isso eleva a produtividade e evita dores de cabeça para as empresas”, afirma.

Para Santos, além disso, os gastos das corporações em treinamentos e qualificações podem cair. “As pessoas que têm mais estabilidade ficam mais tempo nas empresas e conhecem o trabalho que tem de ser feito”, argumenta.

Regulação
O professor critica a inexistência de regulação para a demissão no País. Santos diz que, em outros países, é preciso justificativas relacionadas ao cenário econômico para que as empresas demitam seus colaboradores, o que não ocorre por aqui. “Tem gente que é demitida duas vezes em um ano”, acredita. E os motivos estão relacionados à contenção de gastos.

Para o professor é mais fácil para as empresas trocar um funcionário que ganha pouco e tem pouca escolaridade por outros com disponibilidade para receber menos ainda. Isso se deve justamente ao mercado informal, que, no Brasil, ainda corresponde a boa parcela do mercado de trabalho.