Herdeiras ocupam 17,4% dos assentos de mulheres em conselhos. O que isso significa?

Estudo do InfoMoney mostra que 9 herdeiras ocupam 11 vagas em conselhos de administração no Ibovespa

Giovanna Sutto

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SÃO PAULO – O índice Ibovespa possui 63 empresas listadas. Juntas, elas possuem 579 assentos em seus respectivos conselhos de administração. No entanto, apenas 63 deles são ocupados por mulheres. Ainda, desse total, 17,4% (ou 11) dos assentos são de herdeiras ou integrantes da família que fundou a companhia. 

Em números absolutos, 54 mulheres ocupam vagas nos conselhos. O número cai porque nove delas ocupam duas vagas cada uma. Dessas nove, apenas duas são herdeiras.

Denise Aguiar ocupa o assento dos conselhos do Bradesco e da Bradespar e Ana Lúcia de Mattos Barreto Villela é conselheira do Itaú e também da Itaúsa.

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Além das citadas acima, mais sete mulheres são herdeiras ou integrantes da família e ocupam apenas uma vaga em conselhos. Portanto, das 54 mulheres, nove (ou 16,6%) são herdeiras ou ligadas à família fundadora.

Os dados são de um levantamento feito pelo InfoMoney que buscou entender qual o significado de compor conselhos de administração com mulheres que têm uma ligação familiar com a empresa. A estatística não inclui Maria Carolina Lacerda, indicada posteriormente ao Conselho da BR Distribuidora. Em 18 de setembro, os acionistas vão eleger o novo board em assembleia, e ela deve ocupar um assento.

Quem são as conselheiras 

Regina Madalozzo,  professora associada do Insper, PhD em economia pela Universidade de Illinois, afirma que não é possível definir um perfil para as mulheres herdeiras. “Não tem um padrão, não podemos estereotipar. Muitas das mulheres que ocupam as vagas de conselho estão preparadas para estar lá e não apenas são obrigadas a se inteirar do negócio da família”, afirma a professora, cuja área de pesquisa é em economia do trabalho com foco no mercado de trabalho feminino. 

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Ela explica que a presença de mulheres em conselhos de administração traz mais diversidade de ideias e de perfis de profissionais. Hoje, nas maiores empresas do país, isso não acontece, já que seus respectivos conselhos são compostos majoritariamente por homens.  

Do total de empresas listadas no Ibovespa, 44 delas possui pelo menos uma mulher em seu conselho de administração. Desse total, 11 companhias têm uma herdeira na composição de seu conselho e em 10 delas a herdeira é a única mulher.  

Veja quais são as empresas que estão na estatística e mais detalhes: 

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Em praticamente todas as empresas acima, a herdeira ou integrante da família fundadora é a única mulher no conselho. O InfoMoney contatou todas as empresas, e até a publicação desta matéria Gol, Bradespar, Itaú, Itaúsa e Klabin não responderam ao pedido por comentários.  

Bradesco e Bradespar possuem a mesma conselheira: Denise Aguiar, neta do fundador do banco Amador Aguiar. As empresas possuem oito e sete pessoas em seus conselhos, respectivamente. Em nota, o banco afirmou que “não vai comentar” sobre o assunto.  

No caso de Itaú e Itaúsa, a situação é semelhante.  Ana Lúcia de Mattos Barreto Villela é a única mulher em ambas as mesas e bisneta de Alfredo Egídio de Souza Aranha, que é um dos fundadores do banco e tio-avô de Roberto Setúbal. O banco possui nove conselheiros, e a holding, 11.  

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Entre oito pessoas, Marcia A. P. Marçal dos Santos é a única mulher que compõe o conselho da Marfrig e é esposa do fundador da empresa, Marcos Antonio Molina dos Santos. A empresa de alimentos preferiu não comentar sobre o assunto.  

A Ambev conta com 13 conselheiros, sendo que a única mulher, Cecília Sicupira, é filha de Carlos Alberto Sicupira, um dos fundadores. A companhia não comenta o conselho de administração, eleito pelos acionistas. 

Ana Maria Marcondes Penido Sant’Anna é a conselheira da CCR e herdeira do Grupo Penido, um dos fundadores da empresa de concessões rodoviárias. A empresa informou que não “comenta sobre os membros do conselho de administração”. 

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A Gol possui 9 conselheiros, sendo que a Anna Luiza Serwy Constantino é integrante da família de Nenê Constantino, fundador da aérea.  

Vera Lafer é a conselheira da Klabin e filha de Jacob Klabin Lafer, que faz parte da família Lafer-Klabin fundadora da empresa produtora e exportadora de papéis. A companhia possui 14 assentos no conselho.  

A Multiplan conta com sete conselheiros e Ana Paula Kaminitz Peres é a única mulher e filha de José Isaac Peres, fundador da empresa. A companhia informou que prefere não se posicionar sobre o assunto.

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Fora da curva: Magazine Luiza  

O Magazine Luiza é uma das cinco empresas listadas no Ibovespa que têm três mulheres compondo seu conselho de administração. Nesse caso, Luiza Helena Trajano é sobrinha de umas fundadoras, Luiza Trajano Donato. Além dela, também estão no conselho Betânia Tanure de Barros e Inês Corrêa de Souza.  

“A presidência é ocupada por Luiza Helena Trajano e dos quatro membros independentes, dois são mulheres. Ou seja, igualdade de gênero não é uma questão no conselho de administração do Magalu e não faz sentido definir uma meta de mais mulheres, mas nada impede que a companhia venha a ter, sim, mais mulheres no conselho no futuro”, disse a empresa, em nota.   

Herdeiras não tiram vagas de outras mulheres 

Para Marienne Coutinho, co-chair da WCD (Women Corporate Directors) Brasil e sócia da KPMG no Brasil, o número de mulheres é baixo e, de fato, a quantidade de herdeiras e mulheres integrantes da família fundadora é significativa considerando que poucas mulheres estão em conselhos 

“Mas não acho que elas tiram vagas de outras mulheres. Em outros países há cotas em conselhos e para cumprir a regra, muitas empresas indicam alguém da família, amigas, qualquer pessoa que não necessariamente está preparada para ser conselheira – se não perdem investimentos. Mas aqui no Brasil, não é esse o ponto”, afirma.  

Segundo ela, por aqui, como o processo funciona por meio de indicação, muitas pessoas interferem na decisão e os profissionais são escolhidos por meio de votos de confiança da própria cúpula que já está no conselho 

“Não tem obrigatoriedade de diversidade e se define pessoas por indicações. Então, os nomes surgem pelo networking de quem indica. Ou seja, geralmente homens brancos. Por isso, a indicação inclui amigos, um profissional que estava junto com a pessoa que está indicando em outro conselho, etc. Podem ser homens competentes, mas como a roda gira na base da indicação, as mulheres ficam para trás”, diz Coutinho.  

A executiva complementa que se o presidente do conselho ou as pessoas que estão nele não tiverem a preocupação com a diversidade, basicamente não vai ter mulher ocupando o cargo. “E esse é o verdadeiro problema, não a questão das herdeiras”.   

Segundo ela, uma das saídas para tentar amenizar a diferença entre homens e mulheres em conselhos seria profissionalizar a contratação. “Se os conselhos fossem preenchidos por uma empresa profissional, os headhunters buscariam pessoas com competência, pensando na diversidade, olhando o background. Naturalmente o processo ficaria oxigenado”, diz.   

Como o sistema atual funciona por indicação, é comum que o presidente do conselho ou quem participa da decisão não acredite conhecer uma mulher qualificada para o cargo – ou nem pensa em procurar uma mulher, diz a especialista. A busca enviesada não traz visibilidade para o problema. 

A WCD tem uma base de mais de 160 mulheres associadas, incluindo algumas que já são conselheiras e outras executivas C-level preparadas para assumir posições em Conselho. “As empresas nos procuram e usamos nossa base para fazer indicações de mulheres qualificadas para serem conselheiras. Não faltam opções, mas as empresas precisam querer levar mais mulheres para seus conselhos”, diz.  

Além disso, Marienne explica que é preciso um trabalho em conjunto para incentivar as mulheres a se interessarem pelos cargos em conselhos. “Antes, a mulher não planejava sua carreira, não tinha exemplos femininos em cargos de liderança, poucas mulheres se aposentavam, e quase não tinha mulher em conselhos. Mas hoje essa condição está melhor e precisamos divulgar mais o assunto: falar de atividades no cargo, das competências necessárias, o que podem ganhar, etc. Atrai-las para o pool de talentos”, diz.  

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Giovanna Sutto

Repórter de Finanças do InfoMoney. Escreve matérias finanças pessoais, meios de pagamentos, carreira e economia. Formada pela Cásper Líbero com pós-graduação pelo Ibmec.