Ele catava latinhas, hoje sua empresa fatura R$ 50 milhões: “falir nunca foi problema”

Geraldo Rufino acredita que trabalhar 12 horas por dia é muito fácil e crava: reclamar de crise é besteira

Paula Zogbi

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 SÃO PAULO – Geraldo Rufino morava na favela quando começou a trabalhar, aos 7 anos, catando latinhas. Com essa mesma idade, assistiu à morte de sua mãe. Ele não teve escolha se não trabalhar duro, e hoje não parece ter se abalado com a difícil infância: “nunca foi um problema”, diz.

Depois de quebrar oito vezes, a primeira delas aos 11 com um negócio de reciclagem de latinhas, ele fundou a JR DIESEL, especializada em autopeças usadas para caminhões.

Hoje, a JR fatura mais de R$ 50 milhões anualmente, graças à perseverança de seu fundador. Mesmo em sua posição, ele afirma trabalhar 12 horas por dia com “paixão” e diz que reclamar de crise é besteira: “é isso que faz o mundo girar”.

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Em entrevista ao InfoMoney, Rufino usou de sua irreverência para comentar os tombos, o sucesso e os caminhos que toma. Seu segredo começa com uma missão simples: a mudança de ponto de vista.

Ele será um dos palestrantes do evento “100 Graus Ebulição Instantânea”, idealizado por Rafa Prado e que toma forma nos dias 20,21 e 22 deste mês. Confira a entrevista completa a seguir:

InfoMoney: Depois de uma trajetória de altos e baixos, qual foi o momento do insight para a criação da JR DIESEL? Como soube que era uma boa ideia?

Geraldo Rufino: Foi um acidente de percurso. Não tem insight, ideia, planejamento, projeto. Todos os meus negócios foram acidentes de percurso. Eu tinha um negócio de reciclagem, que eu catava latinha quando eu tinha 9 anos, e aí esse negócio foi se transformando em outra coisa, outra coisa, com 13 anos eu já tinha quebrado duas vezes e aí investi em pessoas, comprei uma Kombi, um caminhão, dois caminhões, três caminhões, esses bateram, eu comprei dois maiores, esses bateram, aí eu comecei a vender os pedaços e para vender os pedaços eu precisava legalizar a parte de papel. Aí abri um CGC, na época não era nem CNPJ, para poder vender as peças, ter nota. E para vender nossos caminhões a gente precisava ter mais alguma coisa. Aí eu comprei mais coisas e virou um negócio.

A partir daí eu vi o seguinte: esse negócio de maneira formal, já que ninguém formalizava isso, poderia ser um negócio como qualquer outro. E eu comecei a olhar para isso como negócio, olhar para isso como negócio e aí nasceu a JR. Ou seja: literalmente um acidente de percurso. Mas meus outros negócios também foram. Sabe o que é você ter um problema e em vez de ficar olhando para o problema você pensar no que você pode transformar aquilo? A minha vida inteira foi assim.

IM: Como quebrar várias vezes o ensinou a escalar mais alto e criar novos empreendimentos mais bem-sucedidos?

GR: É ponto de vista. Por que uma pessoa quebra e continua? É o ponto de vista. O meu ponto de vista é que as pessoas falam quebrar, mas eu acho que quando você fica sem dinheiro, esse problema é o menor: você não ficou sem moral, sem credibilidade, não precisa se envergonhar porque não molestou ninguém. Você só teve seu negócio e por algum motivo de erro de estratégia ou qualquer besteira que você fez, você ficou sem grana. Mas você já não ganhou uma vez? Não aprendeu a ganhar? É que nem andar de bicicleta: começa de novo.

E eu começava de novo, já que faltava só a grana. Para conseguir, as pessoas precisam tentar. As pessoas quebram e ficam depressivas, desanimadas, procurando culpados. Cara, é só um negócio, um negócio tem risco. Você ficou sem dinheiro, ficar sem dinheiro é muito diferente de quebrar e ficar sem credibilidade. Quando você fica só sem dinheiro, se fizer uma continha rápida, vai ver que já não tinha dinheiro: você começou o negócio e ganhou o dinheiro. Agora você tem história, tem know-how, uma relação de mercado, credibilidade. Só falta o dinheiro.

Essa facilidade que eu tinha em recomeçar é porque no meu ponto de vista o privilegiado é aquele para quem só falta o dinheiro.

IM: Por que esse foi justamente o negócio que deu tão certo?

GR: Agora? Não, eu não acho que deu tão certo. Acho que dessa vez estamos em um plano como eu sempre tive. Eu quebrei uma vez com 11 anos, depois com 13. Toda vez que eu voltava eu tinha aprendido alguma coisa. Quando você começa de novo você já sai na frente com todo o aprendizado da última queda somado à atividade normal de ganhar dinheiro. Na hora que você dá o próximo passo, é para cima naturalmente.

Eu tinha aprendido alguma coisa. Eu peguei minha habilidade de ganhar dinheiro, mais o aprendizado, somei com mais doze horas de trabalho por dia e consegui me superar.

IM: Essas doze horas de trabalho por dia se mantêm?

Sim, sagradamente. Eu acho que ninguém precisa dormir mais que 8, então considerando que o dia tem 24, trabalhar 12 é moleza. Até porque, se você gostar do que você está fazendo, não é que o cara é workaholic ou escravo. Para o cara que gosta do que está fazendo, é lazer. Para mim é lazer ficar 12 horas me dedicando àquilo que eu gosto de fazer.

IM: Então o senhor acredita que a pessoa que não gosta do que faz deveria buscar outra atividade?

GR: É, ela errou na escolha. Pensa em paixão. Se você está apaixonado pelo seu coleguinha de escola: você fica lá o dia inteiro e ainda acha que é a paixão da sua vida, e se você descobre que à tarde tem uma festinha e ele vai, você quer que a sua mãe a leve na festa. Não enjoa.

Aquele sentimento que o ser humano chama de paixão funciona em qualquer ambiente. Então quando você está em uma atividade profissional, lembre desse sentimento que já existe em você, veja se você está afinado, se gosta da energia e do que se propôs a fazer. Cara, se aquilo está o cansando, é porque você escolheu a companhia errada. Se ficou de saco cheio do seu namorado, troca que vai dar problema, ou então você vai ter rugas cedo e sofrer a vida inteira. Sair todos os dias cedo para fazer uma coisa que você não gosta é a pior das escravidões no meu ponto de vista.

IM: Já falaram para o senhor desistir?

GR: Olha, não é bem falar para desistir, mas insinuam que não tenho chance, que é difícil, sugerem que eu deveria largar. Mas do meu ponto de vista, isso é que nem fugir da barata. Você foge da barata por quê? Alguém fugia, que falou para o outro fugir, até que chegou em você. Porque a barata é inofensiva: ela pode ser nojenta porque puseram isso na sua cabeça, mas é um inseto como qualquer outro. Se você pega uma criança de dois anos ela pode pegar um chinelo e matar a barata. Você corre de uma coisa que você nem sabia o que era.

Quando você corre do problema, ele vira um monstro. Quando você encara o problema, ele vira um nada, porque o problema nasceu depois de você. Então desistir para que? Seja lá qual for o problema, ele surgiu depois, então é menor que você. Foge não! Até porque, se o problema é seu, quem tem o domínio é você.

Eu não consigo imaginar um dicionário em que a palavra desistir se encaixe. No meu dicionário não tem. Desistir é quando o tempo acabar, porque eu sei que eu sou um ser humano e tenho um tempo. Mas enquanto isso, a palavra desistir é muito pouco para a minha cabeça.

IM: Qual a principal lição que o senhor pretende passar durante o evento Ebulição Instantânea?

GR: Ebulição Instantânea (risos). É mais ou menos assim: jeitos de pensar. Porque todo mundo pode tudo, você pode transformar instantaneamente.

O que você precisa mudar? A conta bancária, resolver um problema, abrir uma startup? Não. Você precisa fazer uma coisa que só depende de você: criar um ponto de vista, mudar o jeito de pensar. Basta acreditar em você que você vai ver que somos todos fisicamente idênticos e temos as mesmas capacidades.

Pare de olhar para o problema e olhe para cima. Se você mudar seu ponto de vista você vai ver que a vida é cor de rosa e você é muito mais privilegiado do que você imagina. No Brasil e no mundo existem oportunidades: é que as pessoas não estão focadas no problema.

Sou prova viva disso. Eu nasci no interior com um probleminha físico, vim para São Paulo, trabalhei com a minha mãe morando na favela aos 7; minha mãe morreu quando eu tinha 7, arrumei um emprego com 8 e de lá para cá minha vida sempre foi bela e eu tenho 58. E nunca foi um problema. Por que seria para o outro?

E a crise? Crise é o que faz o mundo girar, o que cria oportunidades, inovação. Se não tiver crise, o mundo para na zona de conforto. Com crise, você sai da zona de conforto para poder sobreviver e a humanidade evolui.

Saiba mais sobre o evento clicando neste link: 100 Graus Ebulição Instantânea.

Paula Zogbi

Analista de conteúdo da Rico Investimentos, ex-editora de finanças do InfoMoney