Desejo de mudar a educação do País leva jovens a tornarem-se professores

Para os professores do futuro, é possível fazer a diferença, apesar dos salários baixos e imagens desgastadas

Camila F. de Mendonça

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SÃO PAULO – Salários baixos, desmotivação, falta de tempo para se especializar e uma imagem desgastada e desvalorizada. Os professores que estão na ativa sabem o que é ter uma rotina difícil e o senso comum leva a crer que essa profissão não é opção segura. Para muitos jovens, porém, apesar das dificuldades, o ideal de mudar os rumos da educação no Brasil os leva a querer atuar na área. 

“Os professores de hoje têm vontade de fazer e mudar, mas estão afetados pelas dificuldades”, afirma a psicóloga e professora da Unicamp, especialista na área de educação e formação de professores, Ângela Fátima Soligo. “Já os jovens têm mais ‘gás’ e acreditam mesmo que vão efetuar mudanças”, diz. Para ela, o que importa para a nova geração de docentes é fazer a diferença. “O atrativo na educação é o próprio ato de educar”.

E foram esses motivos que criaram no relações públicas Renan Abdalla, 26, a vontade de ser professor. Quando ele decidiu seguir a profissão, antes mesmo de prestar vestibular, não se importou com brincadeiras do tipo “Como você vai viver?”. “Sempre quis ser professor, não importava o que eu fizesse, que graduação escolheria, eu seria professor”, diz, entusiasmado.

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Para ele, ser professor é ter o poder de mudar algo que não é aparente, demora para dar resultados, mas que é compensador: o desenvolvimento do conhecimento. “O professor é um facilitador do conhecimento. Ele abre os melhores caminhos. Daí, você escolhe qual quer seguir”, afirma.

Geração consciente
Esse entusiasmo e idealismo está formando a nova geração de docentes. “O que atrai esses jovens é a possibilidade de construção de algo maior”, diz a professora Ângela. Apesar disso, ela, que dá aulas para futuros professores, percebe que a nova geração tem consciência dos problemas que deve enfrentar.

“Eles sabem que ser professor é atuar com dificuldade, muitas vezes em lugares sem estrutura, com salários baixos”, diz Ângela. “Já vi muitos alunos desmotivados, porque a questão salarial e do crescimento da carreira desmotiva mesmo”. Sem contar a imagem do professor. “Hoje, a figura do professor não é apresentada como uma figura de valor”. Além disso, a professora acredita que os docentes têm menos autonomia dentro da sala de aula – situação diferente de alguns anos atrás.

Porém, Ângela conta que, quando eles começam a estagiar na área, esses jovens se apaixonam pela profissão. “O contato com o campo da educação mobiliza uma vontade de fazer diferença, de se aproximar do aluno e, por mais dificuldades que se tenha, a educação oferece muitas possibilidades”, reforça.

Para ela, os professores do futuro desejam salários melhores, uma carreira que forneça mais oportunidades de crescimento, mais tempo para se dedicar à própria formação – que deve ser contínua – e um vínculo mais acessível com o aluno.

Formação e mercado de trabalho
Renan Abdalla formou-se em Relações Públicas em 2007 e resolveu investir no sonho que carregava há tempos. Hoje, ele faz parte de um projeto que forma professores do futuro, na Faculdade Cásper Líbero. Lá, ele acompanha um professor durante as aulas, uma vez por semana, mas também ajuda a preparar as aulas. “Fico em uma posição meio intermediária entre o professor e os alunos e participo dos bastidores das aulas”.

Abdalla quer ser professor da área de comunicação. Para seguir a carreira acadêmica, porém, ele fará mestrado, e já se prepara para a profissão lendo muito. “Nessa área, a experiência profissional é importante, mas o conhecimento técnico é tão importante quanto”, diz.

Ele está certo. A formação de um professor – os de antes e os de amanhã – sempre foi centrada na pesquisa. “Assim, você garante que esse profissional tenha acesso a conteúdos relevantes”, explica Ângela. Além da formação técnica, a professora acredita que um bom docente deve ter em mente que ele é referência, e, por isso, deve ter postura de um bom cidadão – dentro e fora da sala de aula.

E o estudo do professor não pode parar. Ele deve estar em constante mudança, até porque os alunos mudam. “O aluno é menos disciplinado, mais questionador, por conta da nossa própria cultura”, diz Ângela. “Esse aluno é permeável e o professor de amanhã vai ter uma tarefa maior de captá-lo e seduzi-lo para o conhecimento e não obrigá-lo ao conhecimento”, ressalta.

A tecnologia já é uma ferramenta dos professores que estão na ativa e continuará sendo para os docentes de amanhã. A diferença é que a nova geração já conhece os instrumentos. Mas, Ângela alerta: “A tecnologia em si não garante melhor formação, ela é só uma ferramenta. O que melhora a formação são os processos de reflexão”.

Para a professora, mesmo com tantas dificuldades, o mercado para o professor está em crescimento. “Um País que cresce como o Brasil tem na educação uma estratégia”, diz.

Um bom professor
A professora da Unicamp também ressalta um outro ponto essencial que deve estar presente na formação de um bom professor: a percepção dele mesmo. “É uma capacidade que permita uma abertura para pensar sobre seus próprios entraves, preconceitos, que acabam entrando em jogo durante as aulas”, diz.

Para a docente, o que torna o professor um bom profissional é a capacidade de ele assumir que não é perfeito. “Mesmo porque ele terá de lidar com uma diversidade de alunos e situações que os professores da geração anterior não enfrentaram e os que estão na ativa estão aprendendo a lidar”, afirma Ângela.

Mas todas essas qualificações não são suficiente se não houver uma que é capaz de fazer com que esses profissionais superem todas as pedras encontradas no caminho: a paixão pelo ensino. “Aqueles que realmente querem ser professores acreditam na educação”.