Colegiado do TST rejeita vínculo de emprego de motorista com a Uber

4ª Turma entendeu que não há subordinação jurídica entre o trabalhador e a empresa, mas há decisões divergentes no próprio tribunal; entenda

Equipe InfoMoney

Publicidade

A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) rejeitou examinar o recurso de um motorista de Camboriú (SC), que pretendia reconhecer o vínculo de emprego com a Uber do Brasil Tecnologia Ltda., e manteve o entendimento de que não há subordinação jurídica entre o trabalhador e a empresa provedora do aplicativo. A decisão foi unânime.

A questão do vínculo de emprego entre motoristas e plataformas de aplicativos como a Uber (U1BE34) ainda é objeto de divergência entre diferentes colegiados do TST: a Quarta, a Quinta e a Oitava Turmas já se posicionaram contra o reconhecimento, mas há precedente da Terceira Turma de que existem elementos caracterizadores da relação de emprego.

Também há decisões divergentes em instâncias inferiores. No TST, o assunto está sendo examinado pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), órgão responsável pela uniformização da jurisprudência das Turmas.

Continua depois da publicidade

Dois processos com decisões divergentes começaram a ser julgados em outubro. A ministra Maria Cristina Peduzzi, relatora de um dos casos, votou por não reconhecer o vínculo trabalhista, mas o ministro Aloysio Corrêa da Veiga, atual vice-presidente do TST, sugeriu que os processos fossem enviados ao Tribunal Pleno, para que sejam julgados sob a sistemática dos recursos repetitivos (com a fixação de uma tese vinculante sobre o tema, para ser seguida por todas as instâncias).

Em seguida, o julgamento foi suspenso devido a um pedido de vista do outro magistrado, o ministro Cláudio Brandão (veja mais abaixo).

O processo de Camboriú

No processo de Camboriú (SC), o motorista disse que foi admitido em março de 2019, após processo de seleção e inscrição no sistema da Uber, e que seu desempenho era avaliado por meio de um sistema de notas (a sua era 4,93). Disse ainda que as notas ruins eram punidas com suspensão do perfil no app ou bloqueio imediato e que, no período em que trabalhou para a plataforma, fez mais de 2 mil viagens.

Continua depois da publicidade

A empresa, em sua defesa, sustentou que a relação jurídica com o motorista era de natureza civil, não trabalhista.

O pedido de reconhecimento do vínculo empregatício foi negado na 1ª e na 2ª instância: pela 2ª Vara do Trabalho de Balneário Camboriú e pelo Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT12). Para os magistrados do tribunal regional, ficou demonstrada a preponderância da autonomia do motorista, pois a empresa não exercia efetivo poder diretivo sobre o profissional. Assim, a relação se aproximaria da parceria civil, sem a subordinação típica do emprego.

Novas formas de trabalho

O motorista tentou rediscutir o caso no TST. Relator do agravo, o ministro Ives Gandra Martins afirmou em seu voto que as novas formas de trabalho e a incorporação de tecnologias digitais estão provocando profunda transformação no Direito do Trabalho, mas ainda carecem de regulamentação específica. Por isso, disse ser necessário distingui-los dos casos típicos de fraude à relação de emprego.

Continua depois da publicidade

Analisando os requisitos para a caracterização do vínculo de emprego, o ministro entendeu que não havia habitualidade na relação, uma vez que cabe ao motorista definir os dias e horários em que vai trabalhar; nem subordinação jurídica, pois é possível desligar o aplicativo e não há vinculação a metas.

Quanto à remuneração, o relator do agravo afirmou, entre outros aspectos, que os percentuais fixados pela Uber para os motoristas são superiores ao que o TST vem admitindo como suficientes para caracterizar a relação de parceria. Ele também afastou a alegada subordinação estrutural.

496 processos no TST

Quase 500 processos começaram a tramitar no TST envolvendo empresas de mobilidade que oferecem prestação de serviços por meio de aplicativos (como 99, Cabify, iFood, Loggi, Rappi e Uber) desde 2019, segundo dados do próprio TST. Dessas 496 ações trabalhistas, 342 pedem o reconhecimento de relação de emprego. São ao todo 177 processos contra a Uber, dos quais 113 são relacionados à existência de vínculo empregatício.

Continua depois da publicidade

Ao propor que é necessário firmar uma tese vinculante sobre a questão no Pleno do TST, o ministro Aloysio Corrêa da Veiga apontou em outubro a complexidade do tema e a existência de vários recursos. O magistrado disse que 99 e Uber têm um grande número de processos na Corte e que a definição sobre a questão apenas nos 2 casos em julgamento poderia aumentar ainda mais a judicialização do assunto.

Plataformas digitais

Da Veiga destacou que há mais de 5 milhões de prestadores vinculados à plataforma e que não existe, no Brasil, “legislação específica que permita ao julgador analisar com segurança o tema”. Disse também que há entendimentos diversos inclusive em outros países sobre vículo de emprego com plataformas digitais.

Segundo o ministro, a questão maior que vem sendo trazida à Justiça do Trabalho exige uma reflexão acima da questão de fato. “Trata-se de relação jurídica entre o motorista e a plataforma digital, sistema novo que evoluiu mundo afora em uma nova modalidade de prestação de serviços e que alcança toda essa gama de trabalhadores em face de uma mesma relação jurídica, atípica, mas que não pode deixar de ser objeto de um posicionamento firme da Corte Superior”.

Continua depois da publicidade

A ministra Maria Cristina Peduzzi foi favorável à proposta do ministro e disse que, “diante dos recursos que tramitam nesta Corte, é relevante definir qual a disciplina jurídica para um universo de trabalhadores”. Assim, votou também pela remessa ao Pleno. A proposição voltará à pauta da SDI-1 quando o ministro Cláudio Brandão liberar os processos, devido ao pedido de vista.

(Com informações do TST)