Alexandre de Moraes nega vínculo trabalhista entre motorista e app de transporte

Ministro do STF acolheu recurso do Cabify e derrubou decisão do TRT-3, que havia reconhecido vínculo trabalhista; entenda a polêmica sobre o assunto

Equipe InfoMoney

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O Supremo Tribunal Federal (STF) negou o vínculo de emprego entre a empresa de transporte por aplicativo Cabify e um motorista. Em decisão monocrática, o ministro Alexandre de Moraes derrubou uma decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3), de Minas Gerais, que havia reconhecido o vínculo trabalhista.

Moraes acolheu o recurso da Cabify e afirmou que a Constituição permite formas de emprego alternativas à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), como a terceirização. Para o ministro, o vínculo do motorista com a plataforma se assemelha à do trabalhador autônomo.

“A relação estabelecida entre o motorista de aplicativo e a plataforma reclamante mais se assemelha com a situação prevista na Lei 11.442/2007, do transportador autônomo, sendo aquele proprietário de vínculo próprio e que tem relação de natureza comercial”, afirmou Moraes em sua decisão. Ela foi assinada na sexta-feira (19) e publicada na terça-feira (23).

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Vínculo com aplicativos

A questão do (não) vínculo de trabalho de motoristas profissionais com aplicativos de transporte e de entrega, como a Uber (U1BE34) e o iFood, é tema recorrente no Judiciário em todo o mundo. Essa nova forma de trabalho inclusive ganhou o nome de “Uberização”, e no Brasil as decisões judiciais são divergentes inclusive em um mesmo tribunal.

No Tribunal Superior do Trabalho (TST), por exemplo, houve duas decisões opostas em dezembro de 2022: enquanto a Oitava Turma rejeitou um recurso da Uber, contra decisão que reconheceu o vínculo de emprego com uma motorista do Rio de Janeiro (RJ), a Quarta Turma negou o exame de um recurso de um motorista de Camboriú (SC), que pretendia reconhecer o vínculo com a empresa.

Decisões divergentes

Os ministros da Quarta Turma decidiram, de forma unânime, manter o entendimento de que não há subordinação jurídica entre o trabalhador e a empresa provedora do aplicativo. Também há decisões contra a relação trabalhista na Quinta e até na Oitava Turma. Já a Terceira Turma também tem precedente de que existem elementos caracterizadores da relação de emprego com o aplicativo.

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No processo da Oitava Turma, o relator afirmou em seu voto que a relação da motorista com a empresa é de subordinação clássica, pois não tem controle sobre o preço da corrida, o percentual do repasse, a apresentação e a forma da prestação do trabalho. “Até a classificação do veículo utilizado é definida pela empresa, que pode baixar, remunerar, aumentar, parcelar ou não repassar o valor da corrida”.

Também há decisões divergentes em instâncias inferiores. Por isso, o TST começou a analisar em outubro o assunto na Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), órgão responsável pela uniformização da jurisprudência das Turmas. Não há prazo para uma decisão definitiva, e também não se sabe como a decisão monocrática de Alexandre de Moraes pode afetar a discussão.

“O mundo inteiro está com esse desafio pela frente. Esse tipo de trabalho é um trabalho muito diferente do emprego convencional e é muito elástico no tempo e no espaço”, afirma o economista José Pastore, professor da FEA-USP. “A pessoa trabalha no horário que quer, trabalha para duas, três, quatro plataformas ao mesmo tempo”.

Regulamentação da profissão

O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já disse que pretende regulamentar o trabalho por aplicativos, o que tem potencial para afetar milhões de motoristas e entregadores. O Brasil tem hoje cerca de 1,7 milhão de motoristas e entregadores por aplicativo, segundo dados do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).

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Em meio ao debate, o iFood e a Uber encomendaram uma pesquisa com o instituto Datafolha, para saber a opinião dos profissionais. As empresas dizem que os trabalhadores querem mais garantias de proteção social, mas não comprometer a autonomia que o trabalho mediado por plataformas proporciona.

O instituto ouviu 2,8 mil motoristas e entregadores em todo o país, e 89% dos entrevistados aprovam ter novos direitos, desde que não percam a flexibilidade (para poder, por exemplo, continuar a atuar em múltiplas plataformas ao mesmo tempo e escolher quais horários fazer e quais viagens aceitar).

Além disso, 3 a cada 4 trabalhadores preferem o modelo atual a um emprego com vínculo CLT, mas 7 em cada 10 contribuiriam para a Previdência caso as empresas empregadoras automatizassem o processo.

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Segundo a pesquisa, mais da metade dos motoristas e entregadores de aplicativo contribuem com a Previdência: 30% por meio de outras ocupações de trabalho e 25% dizem realizar a contribuição como profissional autônomo, em modelos como o MEI (Microempreendedor Individual).

Resistência do governo

O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho (PT), diz que a proposta de regulamentação do governo deve ser enviada ao Congresso apenas no segundo semestre, mas interlocutores já falam que o projeto pode ficar para 2024, diante de outras prioridades da agenda econômica.

O governo deve sofrer resistências no Congresso, mas as empresas também devem encontrar resistência nas negociações diante de uma posição mais crítica da atual gestão sobre o papel das plataformas. Em diversas ocasiões, Lula e Marinho afirmaram que a situação dos trabalhadores “beira trabalho escravo”.

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(Com Estadão Conteúdo)