Sob nova direção: os planos da Pax para o Campo de Marte

Empresa nascida no private equity tem o desafio de impor estilo próprio na gestão de aeroportos para fazer a tese ‘decolar’ entre os fundos de investimento

Rikardy Tooge

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Logo ao chegar em uma das entradas do Aeroporto Campo de Marte, na zona norte da capital paulista, um pequeno detalhe já demonstra que a estrutura de pouco mais de 989 mil metros quadrados está em compasso de espera. No letreiro acima da guarita de segurança, o primeiro “o” da palavra “aeroporto” está tombado há alguns meses, aguçando o transtorno obsessivo compulsivo (TOC) de quem o observa.

“Nós brincamos que, quando assumirmos, vamos colocar uma faixa ‘sob nova direção’”, diz Rogério Prado, CEO da Pax Aeroportos, empresa que terá o direito de explorar o local por 30 anos a partir do dia 15 de agosto.

Novos sistemas para gestão aeroportuária e pagamentos, limpeza, segurança e execução de obras são algumas das mudanças que o novo gestor do Campo de Marte pretende entregar ao assumir o aeroporto. Na parte de infraestrutura do local, há ainda o compromisso com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) de melhorar a sinalização da pista e, eventualmente, a construção de uma nova, a depender da demanda nos próximos anos.

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Mas a grande aposta da Pax está nas oportunidades comerciais que o terminal oferece. Localizado em uma área próxima ao Sambódromo e do centro de convenções do Anhembi, existem ali oportunidades para a abertura de lojas, serviços e restaurantes – atualmente, um shopping já é uma das fontes de receita do Campo de Marte. Em um primeiro momento, a prioridade será para comércios que atendam a população em torno do aeroporto, o que exclui nesta fase projetos voltados ao mercado de luxo – nicho do público-alvo que utiliza o local para voos.

Para aumentar a estimativa da receita, uma das premissas da Pax ao assumir o Campo de Marte, Rogério Prado projeta um remanejamento gradual dos hangares mais próximos às avenidas Braz Leme e Olavo Fontoura para ali alocar os projetos comerciais. “É como se fosse um ‘Lego’, temos contratos a serem respeitados e vamos fazer isso com muito diálogo com todos”, afirma. A maior parte dos contratos deve vencer entre 2025 e 2028.

A Pax não abre seus números, mas estima-se que 80% das receitas do aeroporto virão da parte comercial – o que inclui também o aluguel de hangares –, enquanto o faturamento com tarifas de pouso e decolagens serão os 20% restantes. No estudo de viabilidade financeira da Anac para o terminal, a projeção é que o Campo de Marte deverá ter uma receita total de R$ 35,7 milhões em 2023 e R$ 50 milhões no próximo ano.

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Rogério Prado, CEO da Pax: empresa criou modelo próprio de gestão para assumir aeroportos (Divulgação)

No negócio principal, o aeroporto em si, a Pax vê potencial de atrair empresas que atuam em Congonhas para o seu terminal. “Congonhas enfrenta um problema de falta de slots [vagas em horários para pouso e decolagens] e vemos que é possível trazer alguns operadores para cá”, aponta Prado. Mas ele reconhece que terá a concorrência de aeroportos próximos da cidade, como Campinas e Jundiaí, por esses voos. Mas o Aeroporto Catarina, iniciativa da JHSF (JHSF3) cidade de São Roque (SP), para ele não é um concorrente direto. Com capex estimado em pouco mais de R$ 320 milhões em 30 anos, a previsão da Anac é que o número de passageiros no Campo de Marte avance de 171,4 mil para 219 mil por ano.

Outra aposta da Pax para os próximos anos está na ascensão dos eVTOLs, conhecidos popularmente como “carros voadores”. Com gigantes do setor investindo bilhões de dólares no produto, como Embraer, Boeing e Jetblue, Rogério Prado quer deixar toda a infraestrutura do Campo de Marte pronta até 2026 para receber os veículos. “Estamos em todas as necessidades: espaços, infraestrutura elétrica necessária, por exemplo. Nossa meta é ser o local do primeiro voo no Brasil”, estima.

Prado, executivo com passagem de mais de uma década pela gestão de aeroportos da CCR (CCRO3), chega com a missão de provar que um fundo de investimento é capaz de tornar atraente um ativo pelo qual nenhuma administradora tradicional de terminais se interessou.

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No leilão da 7ª rodada de concessão de aeroportos, promovido há quase um ano pela Anac, o fundo XP Infra IV levou em lance único o lote do Campo de Marte e do Aeroporto de Jacarepaguá – ambos voltados à aviação executiva – por R$ 141,1 milhões e o compromisso de investir R$ 560 milhões nas próximas décadas. Para cuidar desses ativos, o XP Infra IV montou a Pax Aeroportos, empresa que eventualmente será desinvestida com o andar da tese – o fundo da XP trabalha com prazo médio de oito anos.

“Com toda a modéstia, estamos fazendo história com esse investimento. Construímos do zero toda uma lógica de gestão do ativo, não existe nenhum modelo parecido com o nosso. O mercado todo está olhando para o que pretendemos fazer aqui e podemos nos tornar referência para outros investimentos desse tipo”, afirma Prado. Um dos primeiros ganhos de eficiência da operação conjunta, aponta o executivo, foi a redução do quadro de funcionários em quase 40%. Otimização do número de pessoas e a unificação de funções de gestão dos dois aeroportos são alguns dos exemplos.

Jacarepaguá

Poucos dias após assumir o Campo de Marte, em 1º de setembro, a Pax passará também a administrar o Aeroporto de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, terminal que deverá faturar algo em torno de R$ 67,3 milhões neste ano, com estimativa de R$ 96,5 milhões para 2024, segundo a Anac.

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Jacarepaguá é financeiramente mais relevante para a Pax. O local tem fluxo de jatinhos de celebridades por conta de sua proximidade com a TV Globo, mas também é um importante hub para empresas de petróleo embarcarem seus funcionários nas plataformas localizadas na Bacia de Santos. Cerca de 30% dos voos no local são de helicópteros que prestam serviço para empresas como Petrobras (PETR4), Equinor e Total – mercado que disputa com o Aeroporto de Macaé. Com estimativa de receber mais de 300 mil passageiros neste ano, a expectativa para Jacarepaguá é que, até o fim da concessão, 440 mil pessoas passem por ano pelo aeroporto.

Sob este cenário, uma das primeiras medidas da Pax no Aeroporto Jacarepaguá será uma obra emergencial no terminal de passageiros para oferecer mais conforto. Na parte comercial, Rogério Prado vê potencial para alavancar a oferta de lojas dentro do terminal. “Como o fluxo de funcionários offshore [que ficam quase um mês em alto-mar] é grande, podemos oferecer alguns produtos e serviços, como barbeiros e farmácia”, aponta.

Por fim, na parte operacional, está prevista uma ampliação da pista do aeroporto, com o objetivo de receber aeronaves maiores. Outra iniciativa é tentar viabilizar uma ponte aérea Rio-São Paulo para voos executivos ligando Jacarepaguá a Campo de Marte. O objetivo da Pax é fazer com que a Azul Conecta, empresa de voos particulares da Azul (AZUL4), que já faz o trajeto entre Jacarepaguá e Congonhas, também crie uma linha para o Campo de Marte.

Rikardy Tooge

Repórter de Negócios do InfoMoney, já passou por g1, Valor Econômico e Exame. Jornalista com pós-graduação em Ciência Política (FESPSP) e extensão em Economia (FAAP). Para sugestões e dicas: rikardy.tooge@infomoney.com.br