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Entre peso em queda livre e inflação galopante, Western Union ganha novos adeptos na Argentina: os turistas

Com seis mil unidades na Argentina, centenária empresa de transferências internacionais captura efeitos do turismo em níveis recordes neste ano

Mariana Segala

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Quem anda pelas ruas de Buenos Aires não consegue deixar de notar a prevalência de dois tipos de estabelecimentos. A cada esquina, das duas, uma: ou há um “kiosco”, lojinha de conveniência onde se compram guloseimas, crédito para celular e cartões do transporte público, ou há uma unidade da Western Union.

O logotipo amarelo e preto da centenária empresa americana de transferências internacionais – que caiu nas graças dos brasileiros em viagem com uma sistemática vantajosa (e legalizada) para trocar reais por pesos – hoje é parte da paisagem na Argentina.

As seis mil unidades físicas da Western Union no país – 300 das quais são próprias e as demais, franqueadas – são frequentadas por uma variedade de públicos.

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O grupo dos que enviam dinheiro para fora é formado principalmente por imigrantes de nações fronteiriças, além de mexicanos, colombianos, venezuelanos, entre outros latinos.

Já o fluxo de transferências de fora para dentro da Argentina é alimentado pelos “hermanos” que fizeram o caminho inverso. “São argentinos que deixaram o país em grandes ondas a partir da crise de 2001 e outros eventos subsequentes, tentando tornar a vida de suas pessoas próximas mais fácil”, diz Maximiliano Babino, gerente geral de Western Union na Argentina.

Há ainda um terceiro público ganhando representatividade nas operações locais da Western Union, num movimento em alguma medida ligado à mais recente crise do país – que enfrenta uma inflação de 138% em 12 meses e uma interminável desvalorização do peso.

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São os turistas estrangeiros. Eles são atraídos pela gastronomia e pelas belezas argentinas, sim – mas também pelo peso cotado na bacia das almas, o que deixa a viagem mais barata.

Nos últimos 12 meses, a taxa de câmbio argentina subiu mais de 200%. Na sexta-feira (20), um dólar comprava 880 pesos no mercado paralelo. Na semana anterior, a cotação chegou a superar 1.000 pesos, em meio às incertezas das eleições deste domingo (22) – disputa que só acabará no segundo turno, em novembro, entre o atual ministro da Economia, Sergio Massa, e o autodeclarado anarco-capitalista Javier Milei.

Mais de 5,3 milhões de estrangeiros passaram pelo país neste ano, segundo maior registro da história, de acordo com o Inprotur, instituto local de promoção turística. Entre janeiro e setembro, a Argentina registrou o maior número de turistas vindos dos Estados Unidos, Chile, Uruguai, México, Canadá, Equador, Costa Rica e Brasil dos últimos 13 anos.

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Para eles, fazer uma transferência de dinheiro para si próprios e sacar pesos nas lojas argentinas da Western Union é visto como um jeito prático de comprar a moeda, argumenta Babino.

Este uso não é nada novo, mas como o país representa uma oportunidade tão interessante para o turismo e temos sido eficazes na comunicação desta possibilidade em outros mercados, vemos um crescimento significativo deste comportamento, principalmente entre uruguaios, brasileiros, chilenos e paraguaios, mas estes em menor proporção

Maximiliano Babino, gerente geral de Western Union na Argentina

Um mercado em potencial nos anos 1990

Nascida em 1851 como uma companhia de telégrafos em Bufallo, no estado de Nova York, a Western Union tem uma operação própria na Argentina desde o início dos anos 1990 – no Brasil, a empresa passou a disponibilizar seus serviços em 1997, por meio de agentes autorizados, mas só começou a operar com banco e corretora próprios em 2011.

Na distante década de 1990, os planos de expansão internacional da matriz americana coincidiram com a adoção de uma lei de convertibilidade na Argentina, pela qual um peso passou a valer um dólar, num esforço para lidar com a inflação (sempre ela).

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“Naqueles anos, a Argentina mostrou-se uma boa oportunidade para duplicarmos nossa presença com uma operação direta. Havia um representante, mas ele não estava aproveitando todo o potencial”, diz Babino.

Devido à força do peso então, o fluxo de transferências era principalmente de dentro para fora do país. “Um grande fluxo de imigração também estava entrando”, conta.

A presença física da Western Union ganhou outra dimensão na Argentina a partir de 2006, quando adquiriu 100% da operação da Pago Fácil, uma popular rede de pagamento de contas no país. A americana já era sócia do Grupo Macri – de Franco Macri, pai do ex-presidente Maurício Macri (2015-2019) – na empresa, com 25% de participação, desde a fundação da Pago Fácil.

As notícias da aquisição davam conta de que a Pago Fácil possuía, na época, entre 2.800 e 3.000 unidades físicas.

Por alguns anos, a gestão das duas companhias não fez nenhuma integração substancial das operações. “A estratégia não era uma fusão naquela época, o que mudou em 2013, quando passamos a buscar a integração completa das áreas do negócio”, conta o executivo. “Hoje, somos uma companhia com duas marcas e diversos produtos”.

Segundo Babino, as operações argentinas tanto de transferências internacionais quanto de pagamento de contas são “muito significativas” para os negócios da Western Union na América Latina. “Em escala global, dada a macroeconomia atual, não é relevante”, diz o executivo. A empresa não divulga a participação de cada mercado nos resultados globais.

Equilíbrio entre inflação e desvalorização do peso

Mesmo assim, há pelo menos sete trimestres consecutivos a inflação na Argentina é apontada nos balanços globais da Western Union como uma contribuição para o crescimento da receita – ao menos em termos contábeis.

No segundo trimestre deste ano, a receita alcançou US$ 1,17 bilhão, com um crescimento de 9% em relação ao mesmo período de 2022. O avanço dos preços na Argentina, segundo o release de resultados, beneficiou o número em três pontos percentuais.

Mas nem sempre é assim. No primeiro trimestre de 2020, por exemplo, o fortalecimento do dólar contra o peso argentino causou um impacto negativo de 3% sobre a receita, maior do que o benefício de 1% obtido pela via da inflação no mesmo período. Os próximos resultados globais da Western Union, referentes ao terceiro trimestre de 2023, serão divulgados na quarta-feira (25).

Quando a moeda local de qualquer país acelera a depreciação, o impacto a curto prazo é a diminuição das transferências para fora, porque diminui a capacidade de poupar e enviar dinheiro dos remetentes locais. Ao mesmo tempo, aumenta o fluxo de entrada, porque quem está no país precisa receber mais dinheiro dos seus entes queridos para comprar bens e serviços”, diz Babino.

“É como a lei da gravidade. Você pode tentar ignorar, mas ela o afetará de qualquer maneira”.

Com o segundo turno das eleições marcado para 19 de novembro, é impossível não se perguntar sobre o futuro da empresa na Argentina. Afora o estresse que uma troca de poder provoca no mercado de câmbio, a proposta do candidato Javier Milei – que terminou o primeiro turno com 30% dos votos – de dolarizar a economia pode ser especialmente sensível para uma companhia que vive de comprar e vender dinheiro.

“Na Argentina, uma empresa deve estar preparada para reagir na esfera comercial, ser flexível para ajustar processos, imaginativa para encontrar soluções e resiliente para tentar novamente”, diz Babino. “Nos adaptaremos dependendo de como o assunto se desenrolar. A migração poderá ser massiva ou, provavelmente, progressiva. Veremos”.

Mariana Segala

Editora-executiva do InfoMoney