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A reocupação territorial, determinada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da chamada ADPF das Favelas, deve começar no primeiro trimestre do próximo ano. Entre os principais objetivos da intervenção estão: retirar das mãos do crime o monopólio da oferta de serviços básicos, conter a expansão do Comando Vermelho, recuperar a cidadania dos moradores e promover o desenvolvimento social e urbano nas comunidades.

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Nesta segunda-feira, a Secretaria de Segurança Pública enviará um documento à Corte explicando o plano de reocupação territorial e os motivos que levaram o governo a escolher Muzema, Rio das Pedras e Gardênia Azul, na Zona Sudoeste, como ponto inicial da ação. A proposta se baseia em princípios aplicados no projeto de Medellín, na Colômbia, e busca se diferenciar de outras iniciativas já testadas no Rio, como as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) e o programa Cidade Integrada.
De acordo com o secretário Victor Cesar dos Santos, a principal diferença da reocupação atual em relação a projetos anteriores é a integração entre governo federal, estado e prefeitura.
“Esse plano não é um projeto do estado ou do governo. É o cumprimento de uma determinação judicial, com prestação de contas, indicadores e responsabilização. Há, de fato, uma proposta de integração, com planejamento, previsibilidade, metas e objetivos a serem alcançados.”
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Opinião de moradores
Outro diferencial apontado pelo secretário é a participação da comunidade, não apenas na apresentação de demandas específicas do território, mas também na avaliação do processo. Por meio de pesquisas de percepção periódicas e a atuação dos Conselhos Comunitários de Segurança (CCS), o governo estadual vai medir o grau de satisfação dos moradores e o percentual da população sob domínio armado. Também serão avaliados o número de atendimentos em serviços essenciais e a execução dos projetos previstos.
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“Vamos medir nosso sucesso a partir de vários indicadores que serão trazidos pela própria população. Periodicamente, nas pesquisas, vamos questionar esses dados e analisar se os índices estão diminuindo. Também vamos acompanhar o preço do gás, já que hoje sabemos que os moradores da região pagam cerca de R$ 40 a mais do que o valor regular, a oferta de internet e vários outros elementos. Tudo isso fará parte das nossas estatísticas, porque atualmente há um monopólio do crime nos serviços da área.”
A Secretaria de Inteligência mapeou dezenas de empresas que atuam na região, especialmente aquelas ligadas a serviços explorados por organizações criminosas, como venda de gás, gelo e internet. Segundo a pasta, há uma movimentação financeira expressiva que passará a ser fiscalizada e será alvo de investigações da Polícia Civil, que dará prioridade aos inquéritos relacionados a crimes nessa área.
O plano tático elaborado pela secretaria está dividido em cinco fases operacionais. A primeira envolve o diagnóstico do território, que já foi feito. A segunda, que compreende uma fase de intervenção mais direta, deve começar no primeiro trimestre do próximo ano e inclui uma ação integrada das forças de segurança e de órgãos do sistema de Justiça. De acordo com a Sesp, não se trata de uma operação policial isolada nem de uma ocupação permanente, mas de uma atuação diária e móvel da polícia no território por um período determinado.
“Durante um tempo, haverá polícia no território todos os dias, até que a gente consiga estabilizar a área. Depois de cerca de 60 dias, vamos conseguir fazer uma avaliação para verificar se é preciso continuar por mais tempo, onde precisamos melhorar e em que pontos devemos atuar. Durante esse período de intervenção, outros atores vão começar a entrar, como Tribunal de Justiça, Ministério Público e Defensoria Pública”, diz Santos.
A fase três envolve a construção de um vínculo com a população e a construção de canais formais de comunicação entre os moradores e o poder público, utilizando-se principalmente da aproximação com lideranças e conselhos das comunidades. Depois disso, as fases quatro e cinco estão separadas para consolidar o acesso aos direitos e cidadania e firmar a autonomia do território. Por ser um plano a longo prazo, não há períodos estabelecidos para essas etapas.
“É um plano a médio e longo prazo, que faremos avaliações periodicamente para ajustar e ver o que funciona ou não”, explicou Santos.
A região de Jacarepaguá foi escolhida como piloto por ser estratégica para a expansão do Comando Vermelho e por concentrar os três principais grupos criminosos em atuação no estado: CV, milícia e Terceiro Comando Puro (TCP).
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Risco de hegemonia
Em relatório interno da secretaria, o cenário da região é apontado como de “risco elevado de hegemonia criminosa sobre um eixo territorial sensível, com potencial impacto direto na segurança pública, na mobilidade urbana e na governança do território municipal”. A avaliação considera o avanço do CV, que, nos últimos dois anos, tomou à força pelo menos dez comunidades na área, numa estratégia para criar um cinturão territorial ligando o Recreio dos Bandeirantes ao Maciço da Tijuca, na região do Itanhangá.
Para as forças de segurança, a consolidação desse avanço não apenas fortaleceria ainda mais a facção, como também estabeleceria um corredor extenso sob domínio do grupo criminoso, com influência direta sobre os principais acessos e vias que conectam a Zona Oeste às zonas Sudoeste e Sul.
Durante a elaboração do plano, a Secretaria de Segurança encomendou duas pesquisas com moradores para identificar as principais demandas da região. Cerca de 400 pessoas foram ouvidas pela Secretaria de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos. Segundo o levantamento, 38% apontaram os problemas de infraestrutura urbana como os principais no bairro. Outros 32% citaram questões ambientais, enquanto 20% mencionaram a desordem urbana e 10% falaram da insegurança.
Em relação aos serviços públicos, os moradores relataram um problema crônico de limpeza urbana, com impactos diretos na saúde e na qualidade de vida, além da falta de saneamento básico e de infraestrutura. Também foi registrado descontentamento com a oferta de escolas e vagas, a escassez de atividades esportivas e a ausência de uma rede de saúde capaz de atender à demanda da população.
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Entre os entrevistados, cerca de 74,3% vivem em casas alugadas, e a maior parte das famílias é composta por três a quatro pessoas (52,3%). O levantamento mostrou ainda que 51,2% recebem algum tipo de auxílio assistencial, enquanto 42,2% vivem de vínculos de trabalho informal.
“Esse processo nos deu a oportunidade de identificar as demandas da comunidade. Observamos, por exemplo, que há muitos garçons que moram na região, em razão da presença de restaurantes e hotéis na Barra. Essa é uma realidade que pode indicar a necessidade de investimento em cursos de inglês e espanhol, para ampliar a qualificação profissional dessas pessoas. Estamos buscando a participação ativa da sociedade. Em vez de dizer o que achamos que é bom para a população, estamos ouvindo quais são os desejos, não apenas na área da segurança. O plano precisará ser homologado pelo STF”, diz Victor Santos.