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A eleição teve de tudo, menos propostas de ajuste fiscal

Todos os principais candidatos ignoraram o ajuste fiscal no primeiro turno. Se a conversa não vier no segundo turno, inevitavelmente virá em janeiro de 2019, com o povo reclamando do que não lhe avisaram.
Por  Pedro Menezes
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Lula fingiu ser candidato, o Museu Nacional se foi no meio do fogo, Ciro prometeu gastar pra tirar seu nome do SPC, Marina derreteu nas pesquisas, disseram que o Alckmin ia crescer com a TV, Bolsonaro sofreu um atentado, Ciro prometeu gastar mais no BNDES, Haddad virou candidato, disseram de novo que o Alckmin iria crescer por causa da TV, Marina derreteu mais um pouco, Haddad cresceu nas pesquisas, os petistas disseram que Bolsonaro vai dar um golpe, todo mundo virou cirista, Marina derreteu de vez, os bolsonaristas disseram que o PT vai dar um golpe, parece que nem todo mundo estava virando cirista, você perdeu amigos e até agora ninguém respondeu como fazer o ajuste fiscal.

Nenhum das principais candidaturas deu explicações razoáveis sobre o assunto mais urgente para o país: como tirar a dívida pública da atual trajetória explosiva.

Alckmin, cujo discurso se baseava em antipopulismo, entregou ao TSE um programa de governo que deve ter sido feito pelo sobrinho de alguém, na véspera do prazo final. Foram 15 páginas, 6 incluíam propostas e nenhuma tinha respostas razoáveis sobre como controlar a dívida pública. Muitas ideias pro futuro do país foram resumidas em uma frase.

O tucano prometeu déficit zero em dois anos, mas não explicou como alcançaria o milagre. Prometeu ainda dobrar a renda do brasileiro, sem especificar como. Em outras palavras, eleitor, Alckmin achava que você era otário.

Ciro apresentou propostas para aumentos de impostos, abordagem claramente insuficiente para um Estado cujos gastos crescem por inércia, indefinidamente, em tendência explosiva. Após um aumento da carga tributária, será necessário outro e mais outro até que alguém pare de empurrar o problema com a barriga. Ciro prometia ainda uma reforma previdenciária que aumenta o déficit público, além de sucessivos projetos milionários para estimular a economia, do SPC ao BNDES.

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Quanto aos dois candidatos que chegaram ao segundo turno, pouco muda.

No caso de Bolsonaro, há alguma complexidade na engabelação. Ele jura que fará um governo austero, leva o problema a sério e menciona em seus discursos a necessidade de sacrifícios por parte da população. Tudo isso é muito bom. O problema é que todas as propostas até o momento aumentam o déficit público.

O candidato do PSL jura que vai diminuir impostos, sem explicar como. Bolsonaro já usou a ideia da curva de Laffer para defender que, assim, faria a receita crescer. O capitão ignora que não se trata da reta de Laffer: a curva nem sempre tem inclinação negativa e nenhum economista leva a sério a hipótese de fazer a receita crescer com base em diminuições de impostos. Se ele quiser que alguém leve a sério esta hipótese, precisa pedir urgentemente que o Paulo Guedes escreva um paper e explique aos economistas o que só ele viu.

Os gastos obrigatórios, que o governo só pode cortar gradualmente e com emendas à Constituição, já somam mais de 100% da arrecadação federal. Esses gastos não podem ser cortados do dia para a noite – não se pode diminuir aposentadorias ou salários de funcionários públicos, que formam boa parte das despesas obrigatórias.

A dívida pública brasileira está em trajetória explosiva e a proposta de Bolsonaro sobre o assunto se resume a bastante pólvora.

O erro poderia ser corrigido por uma dura proposta de reforma da previdência. Mas Bolsonaro entrou no Congresso como representante de funcionários públicos, foi contra todas as reformas, elegeu diversos militares na sua base parlamentar e terá dificuldades políticas para cortar gastos na área.

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A proposta bolsonarista de reforma previdenciária aumenta o déficit público, como a de Ciro. Bolsonaro defende o sistema de capitalização, por contas individuais, que não seria uma ideia ruim se uma transição fosse realista.

Para mudar a previdência em direção à capitalização, o dinheiro de quem trabalha hoje precisaria ser redirecionado a contas que rendem juros. Logicamente, esse mesmo dinheiro deixaria de financiar os aposentados atuais – e alguém teria que fechar essa conta. A única resposta sobre o assunto, até o momento, foi a criação de um fundão de financiamento, sem explicitar as fontes de recurso. Posto de outro modo, não há nada de ajuste fiscal.

A expectativa de arrecadar um trilhão de reais com privatização sem vender Petrobras, Caixa ou Banco do Brasil não foi levada a sério por ninguém além do próprio Paulo Guedes. Vender imóveis, como Guedes defende, não fecharia a conta.

Sobre Haddad, não é preciso apontar muito mais do que a falta de autocrítica sobre o governo Dilma.

O petista propõe um pesado plano de investimentos públicos com dinheiro das reservas internacionais, simultaneamente agravando o problema fiscal e desprotegendo o país caso surja um cenário de instabilidade financeira. Ainda propõe aumentar a faixa de isenção do IR – Bolsonaro também – e repete o erro de Ciro ao defender aumentos permanentes de impostos que não tocam na raiz do problema.

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Haddad não explicou uma linha do que pretende com a reforma previdenciária – apenas prometeu que reformaria a previdência do funcionalismo em 2019 e a do regime geral em 2020. Dificulta assim a convergência entre os regimes de servidores e cidadãos comuns. Em caso de vitória petista, precisaríamos torcer por um estelionato eleitoral, mesmo sabendo os resultados de 2014.

Até o momento, Haddad e Bolsonaro não explicaram qual idade mínima eles consideram adequado, como acabar com o fim dos privilégios de servidores e quais regras constitucionais serão revistas com maior probabilidade no ajuste que pretendem. Ambos ainda espelham um mesmo erro: enquanto Bolsonaro acha que vai aumentar a arrecadação cortando impostos, parece viva no PT a esperança de aumentar a receita gastando. Sobre corte de gastos, ninguém quer falar no momento.

Se a conversa não vier agora, virá em janeiro de 2019. O eleitor vai reclamar que ninguém avisou antes e passaremos 4 anos lamentando a conversa que não tivemos enquanto todo mundo estava gritando.

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Pedro Menezes Pedro Menezes é fundador e editor do Instituto Mercado Popular, um grupo de pesquisadores focado em políticas públicas e desigualdade social.

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