Tesouro IPCA é grande aposta dos melhores gestores de fundos do Brasil

Títulos públicos indexados à inflação, também conhecidos como NTN-B, estão nas carteiras dos principais gestores de recursos do Brasil

João Sandrini

Márcio Appel, sócio fundador da Adam Capital

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(SÃO PAULO) – Hoje no mercado há muito pouco consenso. Entre os principais investidores, há aqueles que estão comprados em ações, apostando que a Bovespa vai subir à medida que o presidente interino Michel Temer comece a mandar reformas de ajuste fiscal ao Congresso, ao mesmo tempo em que há muitos gestores de fundos vendidos em Bolsa, acreditando que as cotações das principais empresas brasileiras já subiram demais e que já embutem uma visão muito otimista em relação à capacidade do governo de corrigir os rumos da economia. No mercado de câmbio, é o mesmo dilema. Não se vê mais aquele consenso de que a moeda americana vai se valorizar contra o real como em 2014 e 2015 ao mesmo tempo em que alguns fundos se posicionam para lucrar com uma possível queda do dólar para cerca de R$ 3. A única posição de risco que parece ser consenso entre os melhores gestores de fundos do Brasil está no mercado de juros, onde as principais apostas se concentram nos títulos públicos conhecidos como Tesouro IPCA+ ou NTN-B.

Esses títulos pagam uma taxa de juros prefixada mais a inflação medida pelo IPCA – ou seja, pagam juros reais. Pelo Tesouro Direto, por exemplo, hoje um investidor poderia comprar o título Tesouro IPCA+ com vencimento em 2019 recebendo um retorno de IPCA + 6,20% ao ano. Já o título Tesouro IPCA+ com vencimento em 2035 rendia IPCA + 6,08% ao ano. Em um mundo que pratica juros reais ou até mesmo nominais negativos, não há dúvidas que as taxas pagas pelo governo brasileiro podem ser consideradas bastante atrativas. Mas até aí os gestores de fundos também poderiam se posicionar em títulos públicos prefixados ou em títulos pós-fixados indexados à Selic que também obteriam fortes retornos com papéis do governo brasileiro. O que atrai os gestores às NTN-B, no entanto, é a percepção de que os juros reais vão cair nos próximos meses ou anos gerando ganhos turbinados aos fundos que estiverem com esses papéis na carteira – quando o gestor acha que os juros vão subir ele pode se proteger com Tesouro Selic ou com os contratos de DI futuro negociados na BM&F.

No Safra Galileo, o principal fundo de investimentos do banco J. Safra e que acumula um retorno de 240% desde sua criação em 2009 – contra 109% do CDI –, o total de recursos investidos em NTN-B alcança nada menos que R$ 15,731 bilhões, segundo balanço da consultoria Economatica. Esse mesmo levantamento mostra que o Safra Galileo é o segundo fundo brasileiro com maior volume de NTN-B na carteira. Os dados divulgados pela Economatica revelam as posições dos fundos informadas à CVM em maio ou junho – o fundo não revela suas posições na carta mensal.

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Outro fundo bastante renomado que também está atolado de NTN-B na carteira é o Verde, o multimercado com a melhor reputação na indústria brasileira. Segundo a Economatica, o fundo Verde Master FI Multimercado tem R$ 6,419 bilhões investidos em NTN-B. Há algum tempo o gestor do fundo, Luis Stuhlberger, vem defendendo o investimento do dinheiro dos clientes nesses papéis. No relatório do Verde de junho, divulgado na última sexta-feira, o gestor revelou que aumentou ainda mais a posição em NTN-B nas últimas semanas e justificou a decisão com o baixo potencial de crescimento da economia brasileira, que deve abrir espaço para a queda dos juros mais adiante. “O juro real brasileiro, em meio ao colapso generalizado de taxas globais, continua em níveis absolutamente excepcionais. O mercado precifica que a meta (a de 4,5%) tem boas chances de ser cumprida para todo o sempre, em parte pela postura hawkish [dura com a inflação] da nova equipe do Banco Central. Continuamos a acreditar que juros reais de 6,30% para cinco anos são incompatíveis com uma economia com baixo crescimento potencial, e aproveitamos a alta recente para voltar a aumentar a posição”, diz o relatório do Verde.

Outra gestora que aproveitou o bom ponto de entrada das NTN-B em meados de junho para elevar sua posição foi a SPX. No mais recente relatório de seus fundos multimercados, a SPX fez a seguinte análise de inflação e juros: “Pelo lado da atividade econômica, a mudança de governo propiciou uma melhora dos indicadores de confiança dos agentes. A contração do PIB está diminuindo e, para o segundo semestre, espera-se o início de uma recuperação moderada. A inflação, por sua vez, mantém-se pressionada em razão de fortes e consecutivas altas dos preços de alimentos. Seus fundamentos de médio prazo, porém, estão melhorando e indicam que uma trajetória de queda da inflação deverá, em breve, ter início. (…) Ao longo do mês, o Banco Central do Brasil sinalizou que pretende perseguir o centro da meta de 4,5% em 2017. Isso fez com que as taxas de juros reais subissem para níveis próximos de 6,50%. Dado isso, aumentamos nossa alocação aplicada em juro real [NTN-B] e iniciamos uma alocação aplicada em juro nominal [LTN ou NTN-F].” Vale lembrar que o principal multimercado da SPX, o SPX Nimitz, acumula retorno de 138% do CDI desde sua criação em 2010.

Outro entusiasta das NTN-B é Marcio Appel, gestor do fundo Adam Macro FIC de FIM. Appel ganhou relevância na indústria de fundos como CEO da J. Safra Asset Management entre 2008 e 2015, período em que transformou o Safra Galileo em uma das maiores estrelas desse segmento de multimercados. Hoje dono do próprio negócio, a Adam Capital, Appel ainda não divulga os resultados de seus fundos nem publica cartas mensais aos cotistas – pelas regras da CVM ele só será obrigado a fazer isso quando seus fundos tiverem mais de 6 meses de existência. Mas nessa recente entrevista ao InfoMoney, Appel disse apostar que num futuro não tão distante a economia brasileira será mais parecida com as de países desenvolvidos, com juro baixo e crescimento baixo. Na época da entrevista uma das principais posições de seu fundo já era em NTN-B e ele dizia que vislumbrava uma queda dos juros reais brasileiros para 3% ou 4% ao ano. Sua ideia era manter uma posição de longo prazo em NTN-B de forma a surfar essa onda por muito tempo.

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Meu conselho

Fundos como o Verde, o Safra Galileo e o SPX Nimitz, além de Marcio Appel, estão entre os que mais ganharam dinheiro no Brasil com a alta do dólar verificada entre 2011 e 2015 e em vários outros momentos. Agora uma das principais convicções de todos esses gestores bem-sucedidos é que o juro real brasileiro vai cair nos próximos meses ou anos. Se eles estiverem certos, quem comprar NTN-B agora terá um retorno muito acima do CDI a médio ou longo prazo. Acredito que é uma decisão sábia dos pequenos investidores seguir aqueles que possuem um histórico de performance acima do mercado – ao invés de tomar conselhos de gente não tão bem-sucedida ou então querer tomar suas próprias decisões. Como as NTN-B são um ativo de alta volatilidade, no entanto, também seria inteligente não concentrar demais o portfólio e deixar apenas uma parte do dinheiro em ativos tão voláteis quanto os títulos de renda fixa com prazos muito longos. Então a recomendação para seguir os gurus do mercado incluiria colocar até uns 20% ou no máximo 30% do patrimônio nesses papéis, aproveitando enquanto taxas tão elevadas existem no mercado brasileiro.

É importante lembrar que há diversas formas de surfar essa possível queda dos juros reais. As NTN-B com vencimentos curtos são mais adequadas para investidores conservadores enquanto os mais agressivos poderiam comprar títulos com vencimento em 2035 ou 2050. Tudo isso pode ser feito pelo Tesouro Direto. Mas também existem diversos ativos negociados no mercado de capitais brasileiro que possuem uma forte correlação com esses títulos – ou seja, se os juros reais caírem, esses ativos também vão se valorizar. Entre eles vale listar os fundos de investimento de renda fixa que possuem alguma menção à inflação no nome, os fundos imobiliários, as debêntures de infraestrutura, as ações de concessionárias de serviços públicos, as ações que garantem bons retornos em dividendos e as ações de empresas muito endividadas. Meu colega Thiago Salomão, editor de Mercados do InfoMoney, inclusive escreveu esse texto apenas para abordar os ativos que se beneficiariam coma queda dos juros. Em tese, os imóveis também teriam de se beneficiar com a queda dos juros reais. Mas nesse caso lembro que a correlação existe muito mais na teoria do que na prática – e acho que o mercado de imóveis residenciais vai demorar mais que todos os ativos listados anteriormente para reagir.