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Com a palavra o relator: Venda de medicamentos em supermercados

Temos esperança de encontrarmos uma solução consensual ou conciliatória que contemple de forma justa os interesses dos fabricantes, distribuidores, comerciantes e, principalmente, os da sociedade
Por  Erich Decat
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

De Brasília, Erich Decat

Com objetivo de apresentar o pouco do “mindset” dos parlamentares envolvidos na discussão do projeto de Lei que autoriza a venda de medicamentos em supermercados, solicitamos ao relator da proposta, Juscelino Filho (DEM-MA), um artigo exclusivo no qual ele expõe suas principais considerações a respeito do tema.

O projeto tramita atualmente na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara, onde o deputado deve apresentar seu parecer final até o final deste mês. É válido ressaltar que o texto abaixo não reflete, necessariamente, o pensamento de nossa equipe. Boa leitura!…

Com a palavra o relator:

“O PL 9482/2018 – de autoria do deputado federal Ronaldo Martins (PRB/CE), que propõe a autorização para a venda de medicamentos isentos de prescrição médica (MIP) em supermercados e estabelecimentos semelhantes – é uma iniciativa importante e atual, mas é oportuno registrar que essa possibilidade é aventada há algum tempo.

De fato, se trata de alterar a Lei 5.591, de 17 de dezembro de 1973, que dispõe sobre o controle sanitário do comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, no CAPÍTULO II – DO COMÉRCIO FARMACÊUTICO, Art. 5o, onde se diz especificamente que:

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“O comércio de drogas, medicamentos e de insumos farmacêuticos é privativo das empresas e dos estabelecimentos definidos nesta Lei. § 1o O comércio de determinados correlatos tais como aparelhos e acessórios, produtos utilizados para fins diagnósticos e analíticos, odontológicos, veterinários, de higiene pessoal ou de ambiente, cosméticos e perfumes, exercido por estabelecimentos especializados, poderá ser extensivo às farmácias e drogarias observado o disposto em lei federal e na supletiva dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

§ 2o A venda de produtos dietéticos será realizada nos estabelecimentos de dispensação e, desde que não contenham substâncias medicamentosas, pelos do comércio fixo. Art. 6o A dispensação de medicamentos é privativa de: a) farmácia; b) drogaria; c) posto de medicamento e unidade volante; d) dispensário de medicamentos.

Parágrafo único. Para atendimento exclusivo a seus usuários, os estabelecimentos hoteleiros e similares poderão dispor de medicamentos anódinos, que não dependam de receita médica, observada a relação elaborada pelo órgão sanitário federal.

Art. 7o A dispensação de plantas medicinais é privativa das farmácias e ervanarias, observados o acondicionamento adequado e a classificação botânica. Primeiramente, é preciso conceituar que medicamentos isentos de prescrição são aplicáveis a situações clínicas sem gravidade, nas quais comprovadamente esse tipo de produto dispensa o receituário e pode ser vendido diretamente ao consumidor final.

Na prática, em quase todo o mundo, são fármacos populares, seguros, de efeitos conhecidos e sem elevados riscos sanitários. Na justificativa do PL, menciona-se que a Organização Mundial de Saúde vê a dispensa direta dos MIP como benéfica para o conforto, a liberdade de decisão e a qualidade de vida dos usuários, em tese uma medida redutora e otimizadora de custos dos sistemas públicos de saúde, assim como dos preços finais na ponta do consumo, expectativa igualmente manifesta por alguns dos interlocutores com quem conversamos até o momento, que adicionam à argumentação a comodidade e a facilidade de acesso, sobretudo em comunidades interioranas afastadas ou onde a presença de farmácias seria restrita.

Também pelo que ouvimos nas reuniões já realizadas, aponta-se uma possível contradição entre o reconhecimento oficial dos MIP e a restrição de venda direta, que se pretende seja flexibilizada, até em nome da razoabilidade, inclusive porque em supermercados e estabelecimentos congêneres são comercializados livremente produtos potencialmente perigosos e/ou nocivos à saúde, como, por exemplo adubos, defensivos ou inseticidas e ácidos corrosivos de uso geral na limpeza doméstica.

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No âmbito da comercialização, tanto nas áreas urbanas quanto nas áreas rurais, há evidentes aspectos concorrenciais a examinar crítica e detidamente, para garantir saudável competição, em particular os que contrapõem entre si os supermercados, os atacadistas estruturados em gigantescas redes nacionais e os pequenos comerciantes, micro empresários, mercearias e todo tipo de pontos de vendas Brasil adentro em contraponto às numerosas farmácias e drogarias já existentes (sejam as pequenas e/ou individuais de propriedade de farmacêuticos, sejam as organizadas em extensas, tentaculares e poderosas redes, inclusive de distribuição especializada), que alguns acham excessivas, desproporcionais em relação à população, comparativamente a países equivalentes.

Certamente, no regime capitalista e de respeito à livre iniciativa não parece ser cabível a defesa de reservas de mercado, nem tampouco a abertura desenfreada e desregrada, especialmente se ela fragiliza a segurança sanitária, comprometa ou ameace a garantia da saúde coletiva, familiar e individual, que deve ser assegurada intransigentemente, inclusive a partir da responsabilidade na orientação ou na assistência de venda por profissionais da área de saúde, médica e/ou de farmácia, o que estimula o empregabilidade. A automedicação deve ser uma preocupação importante a considerar, porquanto é um delicado traço cultural brasileiro que precisa de permanentes mecanismos de controle e de fiscalização, assim como de cada vez mais intensas campanhas educativas.

Para além da existência de farmácias e drogarias instaladas nos supermercados, como é hoje no Brasil, parece não haver dúvidas de que devemos observar a tendência de abordagem desse tema nos outros países, para que nos inspiremos nos modelos que adotam (como, por exemplo, a venda assistida em estabelecimentos genéricos ou de conveniência, seções especializadas com gôndolas segregadas, etc.), adaptados à realidade do nosso país, no que couber.

Portanto, desde o final de abril, quando assumi a relatoria do PL 9842/2018, estamos conscientes do desafio inerente à complexidade do tema, inclusive por ser médico. Decorrido o prazo regimental de cinco sessões, não foram apresentadas emendas, mas, fomos procurados, nos reunimos e conversamos com importantes entidades setoriais representativas e seguimos abertos ao diálogo sem restrição, atentos à repercussão do tema na opinião pública, na mídia e até nas postagens de redes sociais, seja de pessoas, de grupos ou corporativas.

Além disso, convencido que estou da necessidade de audiência pública para debater o tema, propus que ela seja realizada no próximo dia 27, terça-feira, para a qual convidamos representantes da Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores (ABAD), da Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS), da Associação Brasileira da Indústria de Medicamentos Isentos de Prescrição (ABIMIP), do Instituto Brasileira de Defesa do Consumidor (IDEC), da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (ABRAFARMA), da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), do Conselho Federal de Farmácia (CFF) e do Conselho Federal de Medicina (CFM).

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Nossa convicção é a de que assuntos delicados, abrangentes e impactantes como esse (em torno do qual gravitam legítimos, antagônicos e polêmicos interesses) devem ser objeto de debates previamente articulados, transmitidos ao vivo, para que as distintas visões sejam apresentadas pelos palestrantes, seguidas de sessão de perguntas dos parlamentares, e, assim, consigamos serenamente recolher subsídios para a formação de opinião sólida e independente tanto do relator quanto dos membros da Comissão.

Sou adepto, defendo e venho intensificando essa metodologia de trabalho na CSSF, e, de nossa parte, como presidente da CSSF, o PL 9842/2018, apresentado em 6 de fevereiro, receberá todo o apoio, dedicação e esforço para que – comparativamente ao tempo médio das proposições legislativas – tramite o mais célere possível.

Por isso, temos esperança de encontrarmos uma solução consensual ou conciliatória que contemple de forma justa os interesses dos fabricantes, distribuidores, comerciantes e, principalmente, os da sociedade, sobretudo os dos clientes, consumidores e usuários espalhados por regiões ainda economicamente tão desiguais.

Desde já agradecemos a oportunidade de anteciparmos nossas reflexões e nos colocamos à disposição para voltarmos a debater o assunto aqui, tão logo seja realizada a audiência pública e tenhamos apresentado o nosso relatório, se for o caso, com eventual substitutivo de aperfeiçoamento do texto original, sob suporte da qualificada consultoria legislativa da Câmara dos Deputados, como às vezes ocorre.”

Deputado federal Juscelino Filho (DEM-MA).

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Erich Decat atua há 10 anos na cobertura política diária em Brasília, passando por veículos como Blog do Noblat/OGlobo, Correio Brasiliense, Folha de S.Paulo. De 2013 até 2017 trabalhou na editoria de política do Jornal Estado de S.Paulo. erich.decat@xpi.com.br

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