Ifix avança 18% no ano, mas FIIs na contramão acumulam desconto de até 80%; por quê?

Fundos de escritórios dominam lista de FIIs mais descontados do IFIX

Vinicius Alves

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O Ifix — índice dos FIIs mais negociados na Bolsa — acumula ganhos de mais de 18% em 2025 e ensaia fechar o melhor ano desde 2019. Apesar da forte valorização, uma parcela relevante dos FIIs segue negociando com descontos profundos em relação ao valor patrimonial. O que explica?

Em alguns casos, o deságio reflete apenas o peso do ciclo de juros elevados e do comportamento do segmento, em outros, porém, ele escancara problemas estruturais de crédito, gestão e modelo de negócio que ainda desafiam a recuperação das cotas.

Os Fiis hiper-descontados reúnem perfis muito distintos — de crédito imobiliário a lajes corporativas e shoppings — mas com um ponto em comum: a desconfiança do mercado.

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Considerando o P/VP (preço sobre valor patrimonial), os descontos podem chegar a 80%. Isso porque quanto mais próximo de 1 estiver o indicador, mais perto do preço considerado justo estará a cota. Acima deste patamar, o papel está sendo negociado com ágio e, abaixo, com desconto.

Diante da dinâmica, confira os fundos do Ifix mais descontados em 2025:

FIIs Ticker Desconto (P/VP)Taxa de DescontoSegmento
Hectare CEHCTR110,280%Papel
Devant Recebíveis DEVA110,370%Papel
Urca Prime RendaURPR110,370%Papel
BRPR Corporate OfficesBROF110,550%Escritórios
Vinci OfficesVINO110,550%Escritórios
Gazit MallsGZIT110,550%Shoppings
BTG Pactual CorporateBRCR110,550%Escritórios
JS Real EstateJSRE110,640%Escritórios
Arch Edíficios CorporativosAIEC110,640%Escritórios
Kinea OportunidadesKORE110,730%Escritórios
Patria LogísticaPATL110,730%Logística
RBR Top OfficesTOPP110,730%Escritório
BlueMacaw LogísticaBLMG110,730%Logística
Rio Bravo Renda CorporativaRCRB110,730%Escritório
BTG Pactual ShoppingsBPML110,730%Shoppings
BTG Pactual Agro LogísticaBTAL110,730%Agronegócio
RBR Properties FIIRBRP110,730%Híbrido
BB Premium MallsBBIG110,730%Shoppings
Kilima Volkano RecebíveisKIVO110,730%Papel
Mérito Desenvolvimento Imobiliário MFII110,730%Desenvolvimento
Fonte: Economatica (11/12/2025)

Para Gabriel Pereira, head de fundos imobiliários e alternativos da AVIN, nem todo desconto representa oportunidade. O investidor precisa olhar gestora, histórico, qualidade dos ativos, alavancagem e sustentabilidade do rendimento”, afirma.

“Muitos desses fundos não estão baratos à toa. Em vários casos, o desconto é consequência direta de problemas de portfólio, risco de crédito mal precificado ou estruturas que não resistiram ao cenário macro”, acrescenta.

Assim, no recorte mais micro, a fotografia muda conforme o fundo. Nos FIIs de papel mais extremos, como HCTR11, DEVA11 e URPR11, o desconto reflete uma sucessão de eventos negativos.

No caso do HCTR11, criado em 2018 com estratégia de alto risco, o histórico de dividendos elevados entre 2020 e 2022 foi seguido por calotes, atrasos em CRIs e exposição a operações problemáticas, como o caso da Gramado Parks, que entrou em recuperação judicial com dívidas superiores a R$ 1,3 bilhão. “A liquidez caiu drasticamente e o fundo amarga quase 70% de queda desde 2023”, diz Alexandre Pletes, head de renda variável da Faz Capital.

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Situação semelhante vive o DEVA11, que também sofreu com inadimplências relevantes, renegociações forçadas e redução progressiva dos dividendos. “Quando o dividendo começa a cair, o investidor sai. E aí o desconto vira uma consequência natural”, afirma o analista.

Já o URPR11 enfrenta desafios ligados à retenção de caixa para financiar obras, inadimplência em CRIs e uma estrutura que não se mostrou preparada para a rápida alta dos juros após o lançamento do fundo em 2020.

Em relação ao KORE11, segundo Pletes, parte do desconto tem relação direta com a dinâmica do rendimento, que foi sustentado por uma combinação de receitas e mecanismos não recorrentes, como o mínimo garantido e componentes financeiros acumulados. “Por isso ele acaba pagando um dividendo alto, mas esse dividendo não seria sustentável só pela operação. Agora, com o fim dessa ‘âncora’, o mercado já precifica uma redução relevante”, diz.

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A expectativa, segundo ele, é de que a distribuição possa cair para algo próximo de metade do patamar anterior, o que ajuda a explicar por que o fundo continua negociando abaixo do valor patrimonial mesmo com liquidez e base de cotistas relevantes.

No segmento de desenvolvimento, o MFII11 (Mérito Desenvolvimento Imobiliário) entra na lista como um fundo com tese estruturalmente mais volátil — e por isso costuma negociar com desconto maior em fases de juros altos.

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GZIT11 e BBIG mostram dois tipos de deságio

Já entre os fundos de shoppings, o GZIT11 (Gazit Malls) ilustra como desconto pode ser, ao mesmo tempo, reflexo de macro e qualidade percebida do portfólio. Pletes aponta que o segmento sentiu o peso de juros altos e do pós-pandemia, mas ressalta que, no caso da Gazit, a leitura do mercado é mais dura por entender que não se trata de um conjunto de ativos “premium”. “O yield fica chamativo porque a cota está lá embaixo, mas retomar valor patrimonial é difícil. E tem um ponto prático: liquidez baixa e base menor de cotistas aumentam o risco do investidor ficar ‘preso’ no papel”, afirma.

Na outra ponta, o BBIG11 tende a ser visto como um desconto menos “punitivo” por deterioração operacional e mais ligado ao ciclo de juros e ao custo de capital. O fundo reúne shoppings considerados de qualidade superior e vacância mais baixa, mas ainda assim foi afetado por um ambiente de CDI alto e pela sensibilidade do setor a custo de dívida e reprecificação de ativos.

“Não vejo nada desabonador tão nítido no portfólio. O que pesou foi mais a conjuntura e o custo do endividamento, que com a queda do CDI pode começar a ajustar”, diz Pletes, apontando que o fechamento de curva tende a ser um vento a favor para fundos com ativos resilientes e geração de caixa mais previsível.

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Lajes corporativas concentram os maiores descontos

Entre os fundos de tijolo, o segmento mais penalizado é o de lajes corporativas. Dos FIIs mais descontados do mercado, uma fatia relevante pertence a escritórios, como BROF11, VINO11, BRCR11, JSRE11, AIEC11, TOPP11 e RCRB11.

O movimento tem raízes na pandemia, na consolidação do modelo híbrido de trabalho e no excesso de oferta em determinadas regiões.

No BROF11, apesar da boa localização em áreas como Faria Lima e Vila Olímpia, a pressão veio do aumento da vacância e da concorrência pós-pandemia. Ainda assim, o fundo mostra sinais de retomada. “A ocupação já se aproxima de 92% e houve recuperação relevante da cota nos últimos 12 meses. O caso do VINO11, por outro lado, é mais desafiador. Com alguns ativos de padrão inferior e menor capacidade de reposicionamento, o fundo enfrenta dificuldades para fechar o desconto, apesar da vacância relativamente controlada”, avalia Pletes

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Já o BRCR11 carrega um portfólio grande, mas ainda penalizado pela elevada vacância no Rio de Janeiro e por dividendos pouco atrativos frente aos pares. “Para o nível de P/VP, há fundos com melhor yield e menor vacância”, pondera o gestor. Em contraste, o JSRE11 se destaca pela qualidade dos ativos e vacância abaixo de 2%, mas o yield baixo ajuda a explicar por que o desconto persiste.

Casos mais específicos, como o AIEC11, sofreram choques pontuais relevantes. A saída anunciada da Dow e do IBMEC, dois dos principais locatários, levou o fundo a reter dividendos para preservar liquidez e avaliar alternativas como conversão de uso dos imóveis.

Por sua vez, no TOPP11, parte dos proventos elevados decorre de parcelamentos ligados à aquisição dos ativos, e não da geração recorrente de aluguel, o que limita a sustentabilidade do rendimento.

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O cenário para 2026

Olhando adiante, 2026 surge como um possível ponto de inflexão. Projeções de mercado e o Boletim Focus indicam expectativa de início de queda da Selic ao longo do próximo ano, com estimativas em torno de 12% ao fim de 2026, ante cerca de 15% em 2025. Se confirmado, o movimento tende a favorecer principalmente os fundos de tijolo, mais sensíveis à taxa de desconto e ao custo de capital.

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