O que fazer com tanto dinheiro? Após operação muito promissora, petroleira enfrenta grande dilema
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SÃO PAULO – Quando se pensa em petroleiras brasileiras, o grande destaque fica com a gigante (e bastante turbulenta nos últimos anos) Petrobras (PETR3;PETR4). Ou a também turbulenta, mas hoje um pouco esquecida, ex-OGX Petróleo (OGXP3), de Eike Batista, que passou dos dias de glória para a total decepção.
Passando despercebida do grande público por não ser uma constante nos noticiários, está a QGEP (QGEP3) que, contudo, é bem vista pela esmagadora maioria dos analistas que cobrem a ação da companhia. A visão positiva ganhou ainda mais força após o anúncio na noite de ontem feito pela petroleira. Porém, junto com o ânimo sobre a companhia, diversas dúvidas entraram no radar de bancos e casas de análise sobre as próximas decisões que a gestão da companhia deve anunciar.
Vamos ao anúncio. Na noite de terça-feira, a QGEP comunicou a venda de sua participação de 10% no bloco BM-S-8 (Carcará), na Bacia de Santos, para a norueguesa Statoil. O valor do negócio é de US$ 379 milhões, ou seja, 116,57% maior (sem levar em consideração a correção monetária) do que os US$ 175 milhões que a companhia pagou pela fatia em 2011.
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A empresa norueguesa pagará 50% do valor total, US$ 189,5 milhões, no fechamento da transação após aprovação do negócio por reguladores, e o restante será pago em parcelas “relacionadas a eventos subsequentes, incluindo a celebração do Acordo de Individualização da Produção”, segundo o comunicado. A QGEP ainda anunciou que está em estágio final para a entrega da plataforma Petrojarl I, a ser instalada no campo de Atlanta, com 1º óleo previsto para o primeiro trimestre de 2018. Com isso, os papéis QGEP3 chegaram a saltar 27,67% na última quarta-feira, fechando com alta de 14,33% – e a alta prossegue nesta sessão.
A avaliação geral era de que o anúncio da venda da fatia, bastante inesperado pelo mercado, leva a um grande potencial de destravamento de valor para a petroleira, ainda mais levando em conta os bons termos do acordo.
Conforme destaca o Santander, a avaliação implícita da transação para todo o bloco é de US$ 3,79 bilhões e está em linha com a venda da fatia de 66% feita pela Petrobras também para a Statoil em julho de 2016. “Mas, diferente da QGEP, a Petrobras era a operadora. Esse é um fato que, em nossa opinião, levaria a um prêmio. Desta forma, vemos o valor de venda pela QGEP vendeu sua participação como positiva para a empresa”.
Já os analistas do BTG apontaram que os investidores não costumam atribuir muito valor ao campo de Carcará e não havia sinalização da companhia em vender a fatia. “Portanto, a notícia é muito positiva, destrava valor para a companhia e reduz os riscos do case”, ressaltaram Antonio Junqueira, Gustavo Castro e Daniel Guardiola em relatório.
Outros bancos que elogiaram a transação foram o suíço UBS (em um relatório chamado ‘A joia da coroa, então o dinheiro é rei’, em tradução livre) e o americano Morgan Stanley. Os analistas do UBS apontavam que já tinham uma visão positiva para a companhia em meio ao sólido balanço e uma geração previsível de caixa, enquanto o Morgan ressalta que, apesar do portfólio da QGEP ser bastante concentrado, a transação era muito positiva para ser recusada pela empresa brasileira.
O cenário-base do Morgan atribuía R$ 2,30 por ação (ou US $ 179 milhões) para o ativo, enquanto a transação atingiu R$ 4,77 por papel – um valor mais de 100% maior. “Em nossas estimativas, o preço implícito embutido do petróleo a longo prazo na transação é próximo a US$ 80 o barril, o que é difícil de recusar, ainda mais se tratando de uma oferta não solicitada. Considerando que a QGEP seja talvez muito pequena para financiar o capex para Carcará, a monetização de um bem com um valuation premium é um movimento sábio, em nossa opinião”, apontam os analistas.
Mas o que fazer com tanto dinheiro? Se a venda “irrecusável” foi bem vista pelo mercado, ela também gerou grandes questões para a companhia. Conforme destaca o BTG, após o negócio, a companhia estará com R$ 2,1 bilhões em caixa, sem nenhum grande projeto ou capex à frente. Assim, a grande questão passa a ser: o que a companhia fará com o dinheiro do negócio fechado? Segundo o BTG, a transação gera um montante líquido (pós-imposto e ganhos de capital) de R$ 970 milhões (ou R$ 3,60 por ação), versus o atual valor nos modelos do banco de R$ 0,30 para Carcará. “Em outras palavras, a geração de valor desse negócio sozinho representa dois terços do market cap, ou um impressionante dividend yield (dividendos/valor da ação) de 60% se totalmente repassado aos acionistas”, afirmam Junqueira, Castro e Guardiola. Tendo isso em vista, o reposicionamento estratégico da empresa está na mesa, sendo o dividendo especial uma opção. “Estamos ansiosos para a revisão da gestão da base de ativos atual da QGEP e suas aspirações futuras”, apontam os analistas do Morgan Stanley. “Com liquidez em excesso, acreditamos que um dividendo especial é uma opção provável, conforme mencionado pela administração”, destacam. Em comunicado ao mercado, a QGEP destacou que está avaliando os possíveis usos dos recursos, que poderão combinar o pagamento de um dividendo especial para acionistas com investimentos no portfólio de exploração e produção da empresa. Neste sentido, o UBS ressalta um ponto para se atentar: “apesar da nossa visão positiva sobre o case, estamos preocupados que, devido à falta de uma visibilidade clara do uso dos recursos, os investidores podem manter uma abordagem conservadora de que a empresa não terá uma geração total de valor com esse capital”. Os analistas Luiz Carvalho e Julia Ozenda ressaltam as duas alternativas, apontando que os investidores precificariam o primeiro evento (dividendo especial) e descontariam o último. “No atual ambiente de preço do petróleo, não vemos o apetite dos investidores por pagar antecipadamente por ativos exploratórios e de desenvolvimento, apenas de produção”, destaca o banco suíço. Essa dúvida também é vista como chave para o Citigroup, ao questionar se a companhia irá reempregar o seu capital no crescimento de suas explorações para o próximo leilão da ANP em setembro ou se pode fazer novas aquisições. O Citi reforça acreditar que a companhia está particularmente interessada em investir na bacia de Sergipe, que terá oferta na próxima rodada, enquanto outros players com descobertas existentes podem alienar suas participações. “As aquisições bem-sucedidas na bacia poderiam oferecer grande vantagem no longo prazo para a empresa. A QGEP também possui oportunidades atraentes de exploração de fronteiras que podem desbloquear um bom valor ao longo do tempo. No entanto, os investidores não estariam dispostos a atribuir valor para oportunidades exploratórias no curto prazo, o que poderia ameaçar o case, dependendo de quanto a empresa investiria antecipadamente”, aponta o Citi, reforçando a dicotomia já abordada acima entre dividendo especial versus investimento em campos. E, ao abordar um possível dividendo especial da petroleira, os analistas do banco também apontam que as negociações sobre o nível da dívida da empresa com o acionista controlador também podem pesar sobre a decisão. Além disso, cabe apontar: enquanto a maior parte dos analistas de mercado está otimista, o Bank of America Merrill Lynch segue com recomendação underperform (desempenho abaixo da média) para os papéis e faz um contraponto sobre a venda do ativo. “De acordo com a empresa, os motivos da venda estão relacionados à incerteza sobre o cronograma do primeiro óleo no campo e à elevação do risco e eleva o perfil de risco da empresa. Deste ponto de vista, vemos o acordo como positivo. No entanto, ao mesmo tempo, a venda tirará um ativo chave do portfólio da QGEP que poderia ter proporcionado uma vantagem substancial a longo prazo”, apontam Frank McGann e Vicente Falanga Neto, do BofA. Ao olhar para o desempenho da ação, é inegável dizer que os acionistas celebraram e muito o acordo da QGEP. Contudo, os investidores devem ficar de olho nos próximos anúncios da companhia. E, dependendo de como se dará o balanceamento entre os investimentos em produção e o dividendo especial, os acionistas podem comemorar mais ou menos. Gostou desta análise? Clique aqui e receba-as direto em seu e-mail!