Lula critica independência do Banco Central e questiona meta de inflação menor

Em entrevista, Lula disse que é uma "bobagem" achar que um presidente do BC independente fará mais do que o que era feito no modelo anterior

Marcos Mortari

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se reúne com ministros e presidentes dos demais Poderes, no Palácio do Planalto (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) questionou, na quarta-feira (18), a eficácia da independência do Banco Central e sua importância para a economia brasileira.

Em entrevista ao canal GloboNews, Lula disse que é uma “bobagem” achar que um presidente do BC independente fará mais do que o que foi feito quando o chefe do Poder Executivo assumia e podia indicar um novo comando para a instituição.

“Nesse país se brigou muito para ter um Banco Central independente achando que ia melhorar o quê? Eu posso te dizer com a minha experiência. É uma bobagem achar que um presidente de um Banco Central independente vai fazer mais do que fez o Banco Central quando o presidente é quem indicava. Eu duvido que esse presidente do Banco Central seja mais independente do que foi o [Henrique] Meirelles”, disse.

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Na conversa, gravada na manhã de ontem no Palácio do Planalto, Lula ainda questionou a meta de inflação, estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) em 3,5% ao ano, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo – o que permite intervalo de 2% a 5%.

O presidente, inclusive, se confundiu ao dizer que a meta era de 3,7% para 2022. Em 2023, o centro da meta será ainda menor: 3,25%; passando para 3% em 2024, caso as regras não sejam modificadas.

“Por que o banco é independente e a inflação está do jeito que está e o juro está do jeito que está? Você estabeleceu uma meta de inflação de 3,7%. Quando você faz isso, você é obrigado a arrochar mais a economia para poder atingir aqueles 3,7%. Por que precisava fazer 3,7%? Por que não fazer 4,5%, como nós fizemos?”, indagou o presidente.

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Nos últimos dois anos, a inflação fechou em patamar superior ao limite da meta estabelecido, o que obrigou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a publicar uma carta aberta com justificativas.

No documento enviado na semana passada, o chefe da autoridade monetária colocou como vilões a inércia inflacionária do ano anterior, a alta dos preços das commodities, gargalos nas cadeias produtivas globais – muitos em razão da dinâmica da pandemia de Covid-19 e da guerra entre Rússia e Ucrânia.

A sugestão de Lula reforça entre agentes econômicos a percepção de risco de um governo mais leniente com a alta dos preços e que pode buscar no CMN uma mudança na meta estabelecida.

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No novo governo, com o desmembramento do Ministério da Economia, o conselho deverá ser composto por Ministério da Fazenda, comandado por Fernando Haddad (PT); Ministério do Planejamento e Orçamento, de Simone Tebet (MDB); e o próprio Banco Central.

O formato do órgão e a posição mais liberal de Tebet, que sempre que pode fala sobre sua divergência ideológica em relação aos outros integrantes da equipe econômica do governo, poderiam dificultar um movimento nesse sentido.

A elevada taxa de juros, embora importante na contenção da inflação, é vista por especialistas como um impeditivo para a retomada do crescimento. Mas sinalizações de menor rigor fiscal por parte de representantes da nova gestão dificultam o trabalho da autoridade monetária na ancoragem de expectativas e na abertura de caminho para a redução da Selic em ritmo mais acelerado.

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O cenário, na prática, pode colocar politicamente governo e BC em rota de colisão. A autonomia do Banco Central foi aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em fevereiro de 2021.

Durante a última campanha eleitoral, Lula afirmou por mais de uma vez que não pretendia propor uma legislação que revertesse a independência do Banco Central, embora o novo modelo seja alvo de frequentes críticas do PT.

Nesse novo modelo, aprovado pelo Congresso Nacional, os mandatos do presidente e dos diretores do BC não coincidem mais com os do presidente da República, de forma que os governos que tomam posse convivem por algum tempo com autoridades monetárias que foram indicadas pelo governo anterior.

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Com os mandatos estabelecidos, a ideia da lei é blindar a diretoria do BC de possíveis pressões políticas, oferecendo melhores condições para a autoridade monetária perseguir seu objetivo de combater a inflação.

Na entrevista à GloboNews (a primeira desde que assumiu a Presidência da República), Lula voltou a lembrar dos seus primeiros governos para demonstrar que sempre teve responsabilidade fiscal, mas disse que os mesmos que pedem estabilidade fiscal precisam também defender estabilidade social.

“O que precisamos nesse instante é saber o seguinte: a economia brasileira precisa voltar a crescer, e nós precisamos fazer distribuição de renda, nós precisamos fazer mais política social. Se você pegar todos os dados econômicos, vai ver que, durante a pandemia, quem era rico ficou mais rico. Os poderosos ficaram muito mais ricos e o povo mais pobre”, afirmou.

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“Não peçam para mim seriedade fiscal. O que quero é que as pessoas que querem estabilidade fiscal tenham estabilidade social. Assume o compromisso com o social, porque não é possível esse país ter gente na fila do osso para pegar carne. Não é possível esse país ter 30% de pessoas passando fome”, prosseguiu.

Para Lula, as responsabilidades fiscal e social tornaram-se antagônicas “por causa da ganância das pessoas mais ricas”. “O empresário não ganha muito dinheiro porque ele trabalhou, ele ganha muito dinheiro porque os trabalhadores dele trabalharam. O que nós queremos é que apenas haja contrapartida no social. Não interessa termos uma sociedade de miseráveis, queremos ter uma sociedade de classe média. Queremos que as pessoas tenham poder de consumo”, disse.

(com Reuters)

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.