Dilma estaria envergonhada com o colapso de Eike: mas há razões para isso?

Economista acredita que problemas internos são muito mais determinantes, enquanto analista vê possíveis dificuldades em algumas captações futuras

Lara Rizério

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SÃO PAULO – Nas últimas semanas, os holofotes se voltaram ainda mais para Eike Batista, em meio à recuperação da joia da coroa do seu grupo de empresas, a OGX Petróleo (OGXP3). E o desenrolar dos acontecimentos também chamou a atenção da imprensa internacional, que destacou a “decepção e vergonha” que a presidente Dilma Rousseff deve estar enfrentando, como o Financial Times, enquanto a imprensa espanhola ressaltou a trajetória de Eike “como a maior catástrofe financeira do Brasil” e que o empresário lançou sombras sobre a economia do País.

No final de setembro, antes mesmo da recuperação judicial e às vésperas do não pagamento de US$ 44,5 milhões de juros em títulos, o ministro Guido Mantega destacou que a crise das empresas do ex-magnata brasileiro afeta a imagem do Brasil, durante seminário em São Paulo. “Acho que a situação da OGX já provocou um problema para a imagem do País e para a bolsa de valores, que teve uma deterioração”, afirmou Mantega. 

Porém, quem está apostando que o aumento da aversão ao risco ao mercado brasileiro está associada à queda do ex-megaempresário pode estar cometendo um grande erro, avalia Alex Agostini, da Austin Ratings. “Sinceramente, eu acho pouco provável que um único grande empresário gerasse todo esse impacto negativo para a imagem do Brasil”, ressaltando que as atividades de Eike não têm tanta importância no mercado como o empresário bilionário Carlos Slim tem para a economia mexicana e até mesmo para a brasileira.

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Com isso, Agostini avalia que “não dá para colocar na conta do Eike os problemas de um País que não fez a sua lição de casa”. Os investidores estrangeiros, ressalta, olham para fatores como austeridade fiscal, distribuição de renda, reforma política, entre outros, para fazerem as suas apostas para um País.

Assim, os problemas que Eike vêm enfrentando podem afetar marginalmente alguns setores no Brasil, como no caso de petróleo, mas está longe de ser um fator importante para o cenário brasileiro. No caso da exploração de petróleo e gás, os investidores podem se afastar também levando em conta a Petrobras (PETR3PETR4), que recentemente passou pelo leilão de Libra, que foi bastante criticado também pela imprensa internacional devido à falta de concorrentes e pela maior intervenção do governo. 

Caso isolado?
O analista-chefe da Geral Investimentos, Carlos Müller, também avalia que não é a queda do empresário que afetará a imagem do Brasil no exterior. Alguns efeitos, porém, podem ser sentidos lá na frente.

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O analista ressalta que algumas companhias, também de característica pré-operacional, como eram as empresas de Eike, talvez possam sofrer problemas para captar a um custo mais alto, levando assim a uma certa “penalização”. Por outro lado, grandes corporações, que já possuem títulos de dívida no exterior, não correm grandes riscos de fazer novas captações, aponta o analista. 

“Não há um problema de ingerência e gestão das empresas no Brasil assim, não estamos vendo todo esse caos que afeta as empresas do grupo de Eike Batista”, ressalta o economista da Austin Ratings. Desta forma, a fala de Mantega citada anteriormente, em que o ministro atribuiu parte da imagem negativa do Brasil ao empresário, parece ser um modo de desviar a atenção para os reais problemas que vivem o Brasil. 

E a falta de reformas durante a gestão do atual ministro da fazenda está tendo efeitos cada vez maiores sobre a economia, tendo destaque para o cenário de deterioração fiscal no País. “O governo fala que vai cumprir a meta do superávit primário, mas o governo deve reconhecer o problema e buscar um plano que os investidores acreditem”, aponta Agostini. 

CVM, ANP, BM&FBovespa: elas tiveram culpa no cartório?
Agostini e Müller destacam ainda que a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), tão contestada por minoritários, não teria como evitar o caso Eike Batista na bolsa. “Para contestar e verificar a autenticidade das informações de cada um dos relatórios emitidos pelas companhias, eles teriam que ter órgãos especializados, o que seria inviável para a autarquia”, destaca o analista da Geral Investimentos. Neste cenário, órgãos mais especializados, como a ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás e Combustíveis) teriam mais subsídios para verificar se as informações passadas ao mercado tinham fundamento. 

Já Agostini ressalta que casos similares ao da OGX não são exclusivos do Brasil. Um dos exemplos citados é a SEC (Securities and Exchange Comission), que também é alvo de contestações nos EUA, onde atua com papel similar ao da CVM. O economista da Austin Ratings destaca, contudo, que o País vem experimentando um avanço nas regulamentações de mercado, o que é positivo para que os investidores. 

Além disso, Müller ressalta que a CVM pode agir de forma efetiva na penalização das empresas de Eike, caso se comprove que os comunicados enviados ao mercado foram feitos de má-fé – nesta semana, a Folha de S. Paulo noticiou que a OGX sabia em 2012 que as reservas seriam 80% menores e que o campo de Vesúvio não poderia produzir. E, havendo uma punição para o caso das empresas do grupo EBX, seria aberto um precedente para que outras companhias evitassem o mesmo tipo de comportamento.

Desta forma, as regras do jogo estão colocadas e, pelo menos no caso Eike, elas não levam a uma percepção mais negativa para o Brasil. Porém, ressalta Agostini, a intervenção do governo em certos setores, a restrição de rentabilidade no caso de concessões, são fatores para que haja maiores temores com relação ao investimento no Brasil, mas estão bem distantes do caso do ex-megaempresário. “Eike foi um símbolo da deterioração existente no Brasil. Contudo, tratá-lo como o causador do problema é distorcer a visão do que realmente está acontecendo”, conclui o economista da Austin Ratings.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.