Dilma não desistiu de arrecadar mais – com a CPMF mesmo ou com alta de impostos

Já há uma estratégia para aprovar o novo imposto do cheque, com o apoio agora dos governadores, que receberiam parte maior dos recursos. A presidente está às voltas também com os ataques ao ministro da Fazenda

José Marcio Mendonça

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Está o dito pelo não dito e o não dito pelo dito dos últimos cinco dias. Depois da coletiva da presidente Dilma Rousseff ontem – improvisada, coisa que ela detesta e poucas vezes fez – ficou cristalino que o governo vai mesmo tentar um aumento de imposto, que pode ser até a rediviva CPMF, para fechar as contas do Orçamento de 2016 no mínimo sem nenhum déficit.

O Orçamento enviado ao Congresso na segunda-feira, com um buraco de R$ 30,5 bilhões,  foi, agora se dá para ver, uma manobra política para tentar fazer deputados e senadores resolverem o problema. Como a isca não colou, Dilma ontem disse que não pretendeu “transferir responsabilidades” para o parlamento e que o governo vai se entender com o Congresso e enviará um adendo para deixar as contas certinhas.

A presidente foi clara: não gosta da CPMF, pois é um imposto que traz problemas, mas não descarta a necessidade de criar uma fonte de receita. E ela não está parada, embora o governo desse a impressão de que havia jogado a toalha.

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O ministro da Saúde, Artur Chioro, que na semana passada apareceu dando entrevista defendendo a Contribuição Interfederativa para a Saúde (CIS), o novo apelido do imposto do cheque, continuou ativo nos bastidores, conversando com diversos parlamentares sobre a necessidade de se encontrar “novas fontes de financiamento para a saúde”.

A manchete de “O Estado de S. Paulo” hoje diz tudo: “Dilma prepara novo tributo e promete rever Orçamento”. A estratégia seria um parlamentar governista apresentar um projeto ressuscitando a CPMF, mas acoplada a alguma “bondade”, como o abatimento no Imposto de Renda para quem tiver imposto descontado.

O novo tributo seria “temporário” e dividido com Estados e municípios. Contudo, com uma repartição mais generosa – na proposta abortada a alíquota seria de 0,38%, com a o governo federal ficando com 0,35%, os estados com 0,002 e os municípios com 0,01. O restante seria igualzinho ao que se pretendeu até sábado e que foi abandonado depois das reações de empresários e líderes políticos.

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A “Folha de S. Paulo” diz que  outro caminho para ajustar o Orçamento seria a elevação de tarifas de tributos já vigentes, como a Cide da gasolina, o IPI e o IOF. Parte disto já foi feito, com as MPs que acabam com a desoneração de produtos eletrônicos e aumentam o IPI de bebidas quentes e vinho, editadas na segunda-feira e cujas receitas, previstas em mais de R$ 11 bilhões, já estão contabilizadas no Orçamento de 2016.

Efeito demonstração
Dilma defendeu também a reforma administrativa anunciada há dias, mas disse que não vai antecipá-la. Ninguém acredita que ela saia com peso suficiente para reduzir significativamente as despesas federais. Será mais um “efeito demonstração”.

Um dos que reagiram imediatamente contra o novo imposto foi o vice-presidente Michel Temer, recém saído da coordenação política do governo. Em conversa pelo telefone, classificada por uns como “franca” por outros como “dura”, Michel alertou então a presidente que a nova CPMF não passaria no Congresso e disse que não trabalharia por ela, apesar do apelo de Dilma.

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Ontem, os dois tiveram uma reunião no Palácio do Planalto, na qual Dilma pediu a Temer para reassumir as funções de articulador. Segundo descrição de “O Globo”, a versão dos dois lados é que houve uma “lavagem de roupa suja”. Temer recusou-se a reassumir a função de articulador do governo no varejão.

Dilma está preocupada com os sinais cada vez menos ocultos de que o PMDB está se afastando do Palácio do Planalto. A leitura das últimas ações e declarações do vice-presidente dão sentido a esse rumor. Para traçar estratégias para o PMDB mais independente, Temer e mais os presidentes da Câmara e do Senado vão se reunir terça-feira em Brasília com os oito governadores do partido. Do grupo, apenas o governador do Rio, Luis Fernando Pezão, está totalmente fechado com a presidente. Mesmo assim, também de pires na mão.

Trabuco com Dilma
Outra preocupação da presidente é com os relatos, boatos, comentários e outros tais, em Brasília e fora da capital, do enfraquecimento, do esvaziamento do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e das disputas entre ele e os ministros Nelson Barbosa (Planejamento) e Aloizio Marcadante (Casa Civil) pelo comando da economia. Na coletiva, Dilma fez questão de ressaltar que essas histórias não têm o menor sentido e defendeu Levy. 

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Porém, ao contrário do que diz a presidente, o ministro da Fazenda parece se sentir escanteado mesmo. Segundo reportagem da “Folha de S. Paulo”, Joaquim Levy procurou terça-feira Dilma e o vice-presidente Michel Temer para reclamar exatamente de isolamento e de falta de apoio do governo, Dilma inclusive. Levy teria posto em dúvida sua continuidade no governo se essa situação persistir.

Escreve o “Valor Econômico” que Levy ainda não saiu por causa do “rating”, o risco de rebaixamento da nota de crédito do Brasil, da qual ele ainda seria o tênue avalista. De acordo com o jornal, por temer que as agências de classificação de risco retirem o grau de investimento do país, Dilma segura o ministro.

Por isso, não parece mera coincidência o fato de a declaração de apoio a Levy dada pela presidente ter vindo depois de uma reunião reservada de Dilma, fora da agenda, com o presidente do Bradesco, Luis Trabuco, de onde o ministro saiu para o governo.

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No “Valor” ainda, a jornalista Claudia Safatle publica texto dizendo que a presidente Dilma Rousseff se sente cada vez mais desconfortável com a realidade e tenta reagir de “acordo com seu DNA”. Ou seja, flerta com o passado: voltar à expansão, fiscal, monetária e creditícia do primeiro Dilma.

O fato, real, é que Levy continua sendo contestado. O PT, que no seu Congresso em julho em Salvador evitou críticas mais fortes à política econômica, agora vai assumir esta linha. Agora, o partido é um dos organizadores de uma conferência depois de amanhã em Belo Horizonte cujo tema é “defesa da democracia e por uma nova política econômica”.

A assessoria de imprensa do presidente nacional da legenda,Rui Falcão informou que o PT e o seu presidente mantêm a posição sobre a economia anunciada no dia 4 de agosto, durante reunião da Executiva da legenda. Na ocasião, a resolução aprovada dizia que “é preciso reorientar a política econômica rumo ao crescimento sustentável, com distribuição de renda, geração de empregos e inflação sob controle”.

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 Na reforma política, o Senado alterou projeto aprovado pela Câmara, e acabou com o fim de doações eleitorais de empresas. Só podem doar pessoas físicas. Não é para valer. Nem políticos, com exceções, nem partidos (nem o PT) querem de fato o fim dos financiamentos de campanha empresariais. Os senadores “jogaram para a arquibancada”. Como o projeto, por ter sido alterado, tem obrigatoriamente de voltar para a Câmara, lá os deputados restabelecem tudo.

Outros destaques dos

jornais do dia

– “Banco Central mantém juros de 14,25% ao ano” (Estado/Folha/Globo/Valor)

– “Senado aprova fim de doação eleitoral de empresas” (Globo)

– “Previdência do funcionalismo terá rombo de quase R$ 70 bilhões” (Globo)

– “Procurador-geral da República pede mais 60 dias de investigação contra Renan” (Globo/Estadão)

– “Indústria acumula queda de 6,6% no primeiro semestre” (Globo)

– “Brasileiro reduz compras e idas ao mercado” (Estadão)

– “Brasileiro já reduz gastos até com alimentos” (Globo)

– “STF alega não ter quorum para julgar planos econômicos” (Estadão)

– “Governo vai rever modelo de leilão das linhas de transmissão” (Estadão)

– “Captação fica difícil para empresas de países emergentes” (Estadão)

– “PF reivindica continuação de investigação sobre tucano [senador Antonio Anastasia]” (Folha)

– “Termelétricas seguem ligadas por mais um mês” (Folha)

– “Veículos: crise provoca o fechamento de 691 concessionárias” (Valor)

LEITURAS SUGERIDAS

  1. Editorial – “Sem rumo e sem liderança” (diz que a recusa do Congresso de consertar a proposta do Orçamento é mais um fiasco para a coleção de Dilma) – Estadão
  2. José Paulo Kupfer – “’Dominância fiscal pode explicar decisão de manter taxa de juros” (diz que devem ter pesado na avaliação dos diretores do BC os efeitos negativos na dívida pública de uma nova elevação da Selic) – Estadão
  3. Rogério Gentile – “Temer quer ser o novo Itamar” (diz que Dilma precisa começar a governar nesse segundo mandato sob risco de em breve não ter condições políticas de o fazer – se ainda tem) – Folha
  4. Ribamar Oliveira – “Medo de downgrade” sustenta Levy” (diz que a política fiscal do segundo mandato de Dilma já mudou e ainda que há briga surda no interior do PT por causa da permanência de Levy) – Valor