Dilma continua com dificuldades no Congresso e com os aliados

A derrota do governo na votação do aumento para o Judiciário mostra a fragilidade política da presidente e os riscos que as políticas governamentais correm. Em Brasília, Lula “assopra” muito a favor de Dilma, mas não deixa de dar suas “mordidinhas”.

José Marcio Mendonça

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A presidente Dilma Rousseff tem o trunfo do veto para cortar o reajuste médio de 56% que o Senado concedeu ontem aos servidores do Judiciário. E ela, com o incentivo do ministro Joaquim Levy, já deu demonstrações de que pode vetar uma medida que trará um aumento de R$ 25,7 bilhões em quatro anos nas despesas com pessoal do setor público. Por aí, portanto, o ajuste fiscal do Ministério da Fazenda parece não correr novos riscos.

O problema principal, porém, nessa nova derrota que o governo sofreu em seus propósitos em mais uma votação no Congresso é outro. É que ela expõe a fragilidade da articulação política da presidente e as dificuldades nas relações com o Legislativo e os aliados, apesar da aparente calmaria nesta área trazida pela entrega do comando ao vice-presidente da República, Michel Temer, e ao PMDB. Na hora da decisão, até o líder do PT, Humberto Costa, liderou os petistas sob seu comando para votar como bem entenderem.

Depois que a casa caiu, começou a distribuição de culpas. Criticou-se o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, por sua incapacidade de negociar no próprio Judiciário, no governo e no Congresso uma fórmula para aumentar os salários dos funcionários da área de forma menos “perigosa” para as contas públicas no momento. Dizia-se que ele nem conseguiu adiar mais uma vez a votação ontem para que pudesse buscar um acordo razoável para todos.

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Nem os articuladores políticos do governo, tanto a turma de Michel Temer, como a turma que atua paralelamente, subsidiariamente, dos ministros Aloizio Mercadante, Edinho Silva e Ricardo Berzoini, esteve abertamente ativa. O presidente do Senado, Renan Calheiros, não quis saber de conversa a respeito de outro adiamento da decisão. Parecia que não pretendiam se expor abertamente contra os servidores do Poder Judiciário.

Vai ficar o desgaste para a presidente. O veto salva o ajuste fiscal do ministro Levy, porém traz novos desgastes para a ela. Em primeiro lugar, porque pode ser derrubado, e com o ambiente político como está, em algum momento o Congresso pode impingir uma derrota mais contundente à presidente, num recado para que ela atenda “direito” os interesses dos partidos e dos deputados e senadores. Em segundo lugar, porque esses vetos irritam o Congresso e, no caso, vão mexer diretamente com os operadores do Poder Judiciário.

O óleo que frita Dilma, frita também Lula
Enquanto o governo sofria mais um baque no Congresso, o ex-presidente Lula prosseguia em seu périplo por Brasília, onde foi, segundo as últimas interpretações, jogar água na fogueira que ele próprio acendeu com as críticas ao PT, à presidente e à política econômica – e agora pedir aos aliados empenho para defender e ajudar Dilma. O Lula irritado das últimas semanas deu espaço de novo ao Lula conciliador, bem humorado, como registraram pessoas que estiveram com ele na capital.

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O esforço do ex-presidente é encontrar uma nova narrativa para o governo, fora da ladainha do ajuste fiscal. E, segundo informa o jornalista Merval Pereira em sua coluna de hoje em “O Globo”, Lula teria encontrado as ações e projetos da presidente Dilma que devem ser usados nos discursos dos aliados para defender o governo: o Plano Agrícola, o Sistema Nacional de Educação, os acordos com os chineses e com os norte-americanos. É a chamada “agenda positiva”. Lula deve focar principalmente na educação.

Na reunião de ontem com líderes peemedebistas, apontada como “muito amena”, o ex-presidente sugeriu sua sucessora se aproximar mais do Legislativo e do Judiciário para quebrar o isolamento em que se encontra. Lula disse aos peemedebistas ainda que é preciso impedir que as investigações do Lava-Jato “contaminem” o país.

Nesse ponto, o clima está um pouquinho mais ameno. Apesar de pipocar aqui e ali ainda alguma informação nova sobre os escândalos da Petrobras, diminuíram as repercussões da delação premiada do dono da UTC e da Constran, Ricardo Pessoa. Mesmo assim, nos Estados Unidos a presidente Dilma Rousseff voltou ao tema para dizer que não vai demitir ministros pelos jornais (referia-se a Aloizio Mercadante, da Casa Civil, e Edinho Silva, da Comunicação Social, citados pelo empreiteiro como beneficiários das propinas originárias dos cofres da estatal).

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De acordo com reportagem de “O Estado de S. Paulo”, as andanças de Lula em Brasília foram mais amplas que as visíveis a olho nu e suas conversas também mais quentes. Ele se encontrou, por exemplo, reservadamente, num hotel em Brasília com o ministro Aloizio Mercadante, de quem não está nada próximo.

 Não teriam discutido a eliminação do Brasil na Copa América, certamente. A questão é a recomposição da ponte Lula-Planalto, abalada pelos mais recentes surtos de críticas do ex-presidente. Mercadante é o olho e o ouvido de Dilma.

Em conversas com alguns interlocutores, Lula teria defendido também a substituição do ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, por ter perdido o controle da Polícia Federal. E ainda a troca de Mercadante por Jaques Wagner. Repórteres do “Valor Econômico” relatam que Lula especulou sobre troca de ministros com o PT e o PMDB. Ou seja, ele assopra muito, mas não deixa de dar uma mordidinha. No fundo, tenta influenciar mais no governo. Informa-se que ele pretende encontrar-se com Dilma depois da volta dela dos Estados Unidos.

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No geral, no entanto, segundo observadores brasilienses, o ex-presidente foi ameno nas críticas. A interpretação é que Lula percebeu que o óleo que frita Dilma, o governo e o próprio PT, que ele começou a aquecer semanas atrás, também pode fritar Lula.

EM TEMPO: a viagem da presidente Dilma Rousseff aos EUA foi bem sucedida e ela poderia colher bons frutos internos para aliviar o clima tenso por aqui. Mas não deverá colher grande coisa por duas razões: (1) a própria presidente tem pouco apreço pelos assuntos diplomáticos e (2) a sociedade brasileira de um modo geral também não dá muita importância a essas questões. Título de reportagem do “Valor” define bem o que ocorreu: “Aproximação Brasil e Estados Unidos avança mais que o esperado”.

Outros destaques dos

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jornais do dia

– MAIS UM DÉFICIT E META FISCAL MAIS DISTANTE – O resultado fiscal de maio expôs ontem a dificuldade do governo para cumprir sua meta fiscal de R$ 66,3 bilhões em 2015. Entre janeiro e maio, a economia para pagar juros da dívida foi de R$ 25,6 bilhões, com o grosso do trabalho feito por Estados e municípios. Eles bateram recorde de superávit primário: R$ 19,2 bilhões. Já o governo central (composto por Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central), apresentou a menor reserva para os meses de janeiro a maio, de R$ 6,7 bilhões. O setor público consolidado (Governo Central, Estados,municípios e estatais, com exceção da Petrobrás e Eletrobrás)apresentou déficit primário de R$ 6,9 bilhões em maio. O resultado, apesar de negativo, foi bem melhor do que o de maio de 2014, quando houve déficit de R$ 11,046 bilhões. A dívida bruta brasileira chegou a 62,5% do PIB, o valor mais alto já registrado na contabilidade pública do país. Diz o “Valor Econômico” que a dívida crescente é um risco para a nota de crédito.
– CAI A CONFIANÇA DA INDÚSTRIA E DOS SERVIÇOS – Os índices de confiança dos setores industrial e de serviços exibiram novo recuo na leitura de junho, segundo a pesquisa mensal da FGV. O índice de confiança da indústria caiu 4,9% na passagem do mês passado para o corrente, atingindo 68,1 pontos. O movimento foi ligeiramente mais intenso que o apontado pela prévia do indicador, que sugeria retração de 4,7%. Esse desempenho é explicado pela piora da avaliação corrente, que caiu 5,6%, atingindo 70,4 pontos. Por sua vez, a retração das expectativas para os próximos meses, de 4,2%, ainda sugere que a retomada da atividade do setor seguirá frágil. Com isso, o nível de utilização da capacidade instalada recuou de 79,0% para 78,2% no período. No mesmo sentido, a confiança do setor de serviços recuou 4,5% na passagem de maio para junho. O índice de situação atual mostrou queda de 8,0% e o índice de expectativas recuou 2,4%. São mais dois números a reforçar a previsão de que o PIB do segundo trimestre será ainda muito fraco.

– REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL RECUSADA – Após um dia tenso, com tumulto, cones arremessados contra a polícia e até mesmo gás de pimenta para conter os manifestantes, o plenário da Câmara dos Deputados rejeitou a proposta de emenda constitucional (PEC) que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. O resultado foi apertado. Faltaram apenas cinco votos para aprovar a proposta. Foram 303 votos favoráveis, 184 contra e três abstenções. Como é uma proposta que muda a Constituição, ela precisava do apoio de três quintos dos deputados, ou seja, 308 dos 513. O assunto, porém, não está encerrado. Falta agora votar, como destaque, o texto original da proposta, considerado mais duro pelos que são contra a medida do que o texto recusado.

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E MAIS;

– “Grécia é o primeiro país desenvolvido a dar calote no FMI” (Globo/Estadão/Folha/Valor)

– “Abertura de capital do IRB deve render R$ 1,8 bi ao ajuste fiscal” (Globo)

– “Mercado diz que meta [de venda de ativos] da Petrobrás é ambiciosa” (Valor)

LEITURAS SUGERIDAS

  1. Miriam Leitão – “A meta e o  tempo” (diz que desmatamento zero só em 2030 é tempo demais para esperar) – Globo
  2. Editorial – “Petrobrás abandona o delírio e entra na fase realista” (comenta e elogia o novo plano estratégico da estatal) – Globo
  3. Celso Ming – “Em recuperação” (comentando os novos rumos da estatal, diz que em algum momento se tornará inevitável uma recapitalização da Petrobrás) – Estadão
  4. Rosangela Bittar – “Biografia na fogueira” (aborda os mais recentes comentários de Dilma e diz que os erros dela são de lógica, de boa ou de má fé) – Valor