Bitcoin está ensinando aos libertários tudo que eles não sabem sobre economia, diz jornal

Para o Washington Post, o Bitcoin é uma tecnologia revolucionária, mas que não tem utilidade prática

Rodrigo Tolotti

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SÃO PAULO – Os fundamentos e as novidades trazidas pelo Bitcoin para o mundo econômico não param de gerar discussões. A mais recente foi levantada pelo jornal americano Washington Post, que diz que a criptomoeda está ensinando os libertários o que eles não sabem sobre economia.

Escrito por Matt O’Brien, a matéria começa destacando que “o Bitcoin muda de preço de forma muito rápida para ser uma moeda e processa transações muito devagar para ser um sistema de pagamentos”. O autor segue reforçando o discurso dos apoiadores da moeda, de que ela é o futuro e que você não vai precisar de bancos ou governos para mexer em suas finanças.

“Se você olha o que bitcoin realmente faz, porém, é mais como a nostalgia digitalizada de um passado pré-moderno onde o dinheiro foi descoberto em vez de impresso, a economia era um assunto simples, onde os mercados nunca falharam, e você nunca teve que confiar em quem você não conhece”, continua o texto.

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A primeira coisa que o libertários não entendem, segundo O’Brien, é que o dinheiro não é apenas uma reserva de valor, mas também um meio de troca, ou algo que usamos para comprar coisas. “Não só deve se evitar perder muito valor, mas também ganhar muito. Caso contrário, por que você gastaria?”, questiona o autor. Neste raciocínio, um ativo que ganha muito valor, como ocorreu com o Bitcoin, que disparou mais de 1.000% em poucos meses, faria com que as pessoas simplesmente segurassem as moedas em vez de usá-las, pensando apenas em ficarem ricos com isso.

“Para impedir que isso aconteça, você precisaria aumentar o fornecimento de bitcoins à medida que a demanda por eles também aumenta”, afirma. O’Brien  explica que isso é o que se chama de “impressão de dinheiro”, e, como normalmente ocorre, pode ser bom ou ruim, dependendo se é feito adequadamente ou não. “Faça demais e você pode obter o tipo de inflação persistente que os Estados Unidos tiveram na década de 1970; muito demais e o tipo de hiperinflação que matou a moeda alemã na década de 1920; mas muito pouco e a economia pode cair em um loop de doom como o mundo inteiro fez na década de 1930”, afirma.

A segunda coisa que os libertários não conseguem ver é que a confiança torna as economias mais, e não menos, eficientes. “O Bitcoin, você vê, é melhor entendido como uma tentativa de reescrever as regras do nosso dinheiro e nosso sistema financeiro para que suas economias sejam seguras, independentemente do que aconteça em Washington ou em Wall Street ou qualquer outra versão digital deles”, diz o texto.

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Neste cenário, o autor explica que o Bitcoin tem uma boa “solução” para a questão da confiança. Com o processo de mineração, as novas moedas e as transações são registradas publicamente no blockchain.”Como resultado, você pode enviar coisas on-line sem precisar de um banco para lhe dizer quem tem o que para enviar”, explica. Mas, segundo ele, há um problema: o número de transações que bitcoin pode processar é extremamente limitado. O bitcoin só pode lidar com um máximo de sete transações por segundo em comparação com os 56 mil que a Visa consegue.

O’Brien afirma que este sistema entra em uma espiral de más decisões. Ele lembra que já foi debatido entre os membros da comunidade, por exemplo, aumentar o poder de processamento do bitcoin para resolver esta questão da velocidade, mas foi negado pelos integrantes da rede. Além disso, a questão da mineração e a necessidade de um poder de processamento cada vez maior, tem colocado boa parte do sistema na mão de grandes grupos em detrimentos de pequenos usuários.

“O Bitcoin, em outras palavras, é uma grande máquina de externalidade negativa. Isso é o que os economistas chamam de custo que outra pessoa tem que pagar por algo que você fez”, afirma o autor. “Mesmo no melhor dos casos, o bitcoin pode não estar reduzindo os custos de transação tanto quanto está redistribuindo estes custos de indivíduos para a sociedade. É o que isso significaria se os mineiros que recebem pagamentos com novos bitcoins substituíssem os banqueiros que recebem taxas”, continua.

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Ele conclui dizendo que “o Bitcoin é uma tecnologia revolucionária construída em uma economia reacionária. Essa primeira parte cegou as pessoas para a segunda – como poderia algo tão inteligente ser tão inútil? – mas é verdade”. “O fornecimento de dinheiro estritamente limitado do Bitcoin volta a um momento em que o dinheiro era uma pedra brilhante que você cavava, não um pedaço de papel com um presidente morto. E suas tentativas de isolar os mineiros das forças da racionalidade econômica são semelhantes às velhas proteções feudais dos nobres. Bitcoin só é o futuro se você acha que 1789 não é o passado”, conclui.

Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.