Cada empresa, sua sentença: o poder que o governo exerce através das golden shares

Intervenção do governo através desta classe de ação voltou à tona com as discussões sobre a privatização da Eletrobras

Rafael Souza Ribeiro

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SÃO PAULO – Antes pouco falado nos 13 anos de governo do PT, o tema privatização ganhou força este ano com a entrada da equipe econômica do governo Temer, tendo em vista a necessidade de fechar as contas públicas e atingir as metas fiscais. Em agosto, o presidente anunciou um pacote de privatizações de 57 empresas, incluindo a Eletrobras (ELET3; ELET6), que irá fazer uma oferta primária de ações qual a participação da União será reduzida dos atuais 60% para pelo menos 40%, como já anunciado pelo ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, além de uma “golden share” depois da venda de seu controle. Mas afinal, o que é essa classe de ação?

Muito popular na década de 1980, quando os governos desejavam de alguma forma manter o controle sobre empresas que haviam sido privatizadas, a golden share nada mais é do que um tipo especial de ação que traz os mesmos direitos dos detentores de ações ordinárias e confere ainda poder de veto para algumas decisões importantes nas empresas vendidas à iniciativa privada. Em outras palavras, não importa a participação, o estado terá poder de veto.

Por ser um mecanismo de controle, a golden share não é bem vista pelo mercado e tem um efeito negativo sobre o valor dos ativos, como já disse o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, assim quando anunciado o processo de privatização da Eletrobras. No entanto, o governo pretende estabelecer nas regras de privatização que a companhia deverá manter suas subsidiárias regionais de geração e transmissão de energia após ser privatizada, algo que faz muito sentido para a estratégia do governo, segundo avaliação do BofA (Bank of America Merrill Lynch), não só por ser um bem de utilidade pública e controlar metade das linhas de transmissão do País, mas como importante capital político para negociações no Congresso.

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O governo detém ainda hoje golden shares na Vale (VALE3), Embraer (EMBR3) e IRB (Instituto de Resseguros do Brasil; IRBR3), que abriu seu capital em 31 de julho deste ano. Em cada empresa, a União tem um poder de influência diferente:

Vale
Privatizada em maio de 1997, além dos 9% que a BNDESPar possui em ações da Vale e 16% de participação acionária da Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil), o governo possui 12 golden shares da mineradora e o poder de veto se estende à alteração da denominação social, mudança da sede social e do objeto social relativamente à exploração de jazidas minerais. Além disso, as ações dão o direito de vetar a liquidação da empresa e alienação ou encerramento de etapas dos sistemas de exploração de minério de ferro.

Outro ponto que pode ser vetado através da posse das golden shares é a modificação dos direitos atribuídos às espécies e classes das ações de emissão da mineradora e, por fim, modificações dos direitos conferidos pela própria golden share. Em vista das restrições impostas, que mostram o peso do governo em decisões estratégicas, os analistas não avaliam a mineradora brasileira como as australianas BHP Billiton e Rio Tinto, que não possuem esse tipo de interferência.

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O caso mais célebre foi quando Roger Agnelli foi demitido em 2011 pelo desgaste político com o governo petista, inclusive foi “acusado” de dirigir a Vale como se fosse uma empresa estrangeira, presando uma estrutura mais enxuta e eficiente. Porém, esses tempos ficaram para trás e a entrada no Novo Mercado sela o compromisso da brasileira em melhorar sua governança corporativa e fechar o desconto em relação aos seus pares.

Embraer
Além dos 5,4% que a BNDESPar possui em ações da empresa e 5% de participação acionária da Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil), o governo possui uma golden share da Embraer, o que faz sentido em vista da posição estratégica da companhia no País, uma vez que ela está diretamente envolvida em programas militares. Portanto, a ação ordinária de classe especial está mais atrelada a questões de segurança nacional.

Como no caso de Vale e IRB, além da alteração da denominação social, mudança da sede social e do objeto social, a golden share confere à União o poder de veto na criação ou alteração de programas militares, como na capacitação de terceiros neste tipo de tecnologia e a interrupção de fornecimento de peças de manutenção e reposição de aeronaves militares. Outro detalhe importante diz respeito ao aumento de participação: um acionista com mais de 35% de participação tem que pedir autorização ao governo para aumentar sua fatia na empresa.

IRB
Com relação a empresa de resseguros, a União detém uma golden share e que confere ao governo direito de veto no caso de mudança do objeto social da empresa, como também na definição de políticas de resseguros, assim como na transferência de controle acionário – fusão, incorporação e cisão – que possa implicar na perda de direitos atribuídos à golden share.

Em virtude deste poder incumbido, o governo, que além da golden share possui 20,5% de participação acionária, tem direito permanente de indicar um membro para o conselho de administração, que exercerá o cargo de presidente do órgão, como também tem uma cadeira garantida no conselho fiscal da companhia, o que ajuda ainda mais na coordenação das políticas de resseguros.