Um índice e dois mundos: as 8 diferenças do topo histórico do Ibovespa de 2008 e da nova máxima de 2017

Redução do peso de Petrobras e Vale, além da maior participação dos bancos, são algumas das mudanças

Rafael Souza Ribeiro

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SÃO PAULO – Ao atingir os 77 mil pontos nesta quarta-feira (4), o Ibovespa marcou nova máxima histórica e está cada vez mais longe dos 73.920 pontos, que foi o topo histórico cravado em 29 de maio de 2008 e objetivo percorrido pelo mercado desde a recuperação engatilhada em fevereiro de 2016. Porém, essa conquista é acompanhada por diversas ressalvas dos analistas, já que o novo recorde foi realizado apenas nominalmente, não em termos reais.

De fato, descontando o desempenho do Ibovespa pelo CDI (Certificado de Depósito Interbancário) ou até mesmo pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) acumulado no período, mecanismo necessário para comparar o valor da carteira teórica do índice ao longo do tempo, o Ibovespa deveria estar na metade do caminho, por volta de 40 mil pontos.

Ibovespa ajustado à inflação


*Fonte: Bloomberg

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Ibovespa ajustado ao CDI


Fonte: Bloomberg

Porém, muito mais importante do que avaliar o desempenho em termos reais, entender como o Ibovespa era composto em 2008 e comparar com as ações que fazem parte da composição do índice atualmente ajuda a explicar porque o mercado já renovou sua máxima histórica, enquanto blue chips como Vale e Petrobras estão longe das respectivas máximas históricas, ao contrário do visto nove anos atrás. Essas diferenças podem ser resumidas em 8 tópicos:

1) Participação de Petrobras e Vale

Em 2008, o Ibovespa era refém de Petrobras (PETR3; PETR4) e Vale (VALE3; VALE5). Considerando as ações ordinárias e preferenciais das duas empresas, além de Bradespar (BRAP4), holding financeira cujo principal investimento é justamente a mineradora brasileira, as blue chips correspondiam por 34,3% da variação do Ibovespa. Para se ter uma ideia da concentração, os ativos PETR4 e VALE5, com maior volume negociado na época, detinham participação de 26,9%.

Considerando a composição da carteira do Ibovespa desta quarta-feira, a participação direta e indireta das duas empresas recuou para 17% e hoje em dia as duas empresas que possuem maior participação no índice não são mais Petrobras e Vale, mas sim os bancos Itaú Unibanco (ITUB4) e Bradesco (BBDC4), que juntos representam 19,6%.

Ação Ticker Participação em 2008 Participação em 2017*
Petrobras PETR4  14,14% 5,22% 
Vale VALE5 12,75%
Vale VALE3 3,35% 7,77%
Petrobras PETR3 2,64% 3,57%
Bradespar BRAP4 1,42% 0,44%
*Carteira teórica do dia 04/10/2017

Fonte: B3

2) Bancos ganharam espaço

Por falar nos bancos, com a mudança na metologia do índice em maio de 2014, que passou levar em conta o valor de mercado das empresas e o volume de papéis disponíveis para a negociação, ao invés da quantidade de negócios após a derrocada dos papéis da OGX, as instituições financeiras ganharam bastante espaço dentro do Ibovespa.

Em 2008, a participação das instituições financeiras era de apenas 15%, ano que contava ainda com as units do Unibanco, que dois anos depois foi incorporado pelo Itaú em uma fusão que criou o maior banco privado do Brasil. Considerando a última versão da carteira teórica do Ibovespa, a participação dos bancos disparou para 29,1%.

Ação Ticker Participação em 2008 Participação em 2017*
Itaú Unibanco ITUB4  – 11,09%
Itaú ITAU4 3,16%
Bradesco BBDC4 3,84% 8,57%
Bradesco BBDC3 1,53%
Unibanco UBBR11 2,78%
Itaúsa ITSA4 2,44% 3,48%
Banco do Brasil BBAS3 2,38% 3,53%
Santander SANB11 0,86%
*Carteira teórica do dia 04/10/2017

Fonte: B3

3) Commodities com menor peso

Comparando as carteiras, fica nítida a perda de participação das empresas ligadas as commodities. Além de Petrobras e Vale, a queda de participação do setor siderúrgico foi expressiva com a mudança de metodologia do índice.

No ano de 2008, as siderúrgicas representam 9,8% da composição do índice, sendo que Usiminas (USIM5), CSN (CSNA3) e Gerdau (GGBR4) possuíam participação de 3,06%, 2,77% e 2,59%, respectivamente. Colocando em ordem crescente, as ações preferenciais classe A da Usiminas detinham a 6ª maior participação no índice, enquanto os papéis ordinários da CSN e preferenciais da Gerdau estavam na 8ª e 10ª posição pela sequência.

Em 2017, a representatividade do setor recuou para apenas 1,8% e todas essas ações possuem agora participação inferior a 1%. Para se ter uma ideia, com 0,90%, as ações preferenciais da Gerdau possuem maior representativida dentro da composição do índice.

Ação Ticker Participação em 2008 Participação em 2017*
Usiminas USIM5 3,06% 0,35%
Usiminas USIM3 0,56%
CSN CSNA3 2,77% 0,52%
Gerdau GGBR4 2,59% 0,90%
*Carteira teórica do dia 04/10/2017

Fonte: B3

4) Economia melhor representada

A perda de espaço das commodities deu lugar para os setores que representam melhor a economia, uma vez que suas atividades estão ligadas ao consumo interno. Além dos bancos, as empresas do setor de consumo e varejo ganharam importante representatividade nessa comparação.

Hoje com a 4ª maior participação no índice, com 7,32% da composição, as ações da Ambev (ABEV3), naquela época sob o código AMBV4, representavam apenas 1,21% do Ibovespa e estavam na 21ª em termos de relevância. Acima de uma das maiores empresas de bens de consumo do Brasil, estava, por exemplo, Bradespar (BRAP4), que é uma holding financeira e possuia 1,42% de participação por conta de sua participação em Vale.

Com as mudanças, a participação das empresas de consumo e varejo saltou para 13,6% em 2017, liderada pelas ações ordinárias da Ambev, enquanto Lojas Renner (LREN3), Hypermarcas (HYPE3) e Lojas Americanas (LAME4) possuem participação superior a 1%, com a 13ª, 21ª e 22ª colocação em termos de importância na composição do Ibovespa.

Ação Ticker Participação em 2008 Participação em 2017*
Ambev AMBV4 1,21%
Ambev ABEV3 7,16%
Lojas Renner LREN3 1,07% 2,08%
Hypermarcas HYPE3 1,06%
Lojas Americanas LAME4 1,12% 1,04%
B2W BTOW3 1,14%
Natura NATU3 0,89% 0,43%
Pão de Açúcar PCAR4 0,73% 0,97%
Localiza RENT3 0,78%
*Carteira teórica do dia 04/10/2017

Fonte: B3

5) O “fim” de um setor e o nascimento de uma potência

Os investidores mais antigos certamente lembram, pelo bem ou pelo mal, dos tempos áureos das ações da Telebras (TELB3; TELB4), quando a telefonia fixa estava entrando no Brasil e esses papéis eram um dos mais negociados na antiga Bovespa. De lá para cá, o setor passou por diversas transformações, a estatal saiu do Ibovespa, mas, ainda em 2008, as empresas de telecomunicação possuíam importante participação no índice.

Naquele ano, faziam parte da carteira Net (NETC4), Telemar (TNLP4; TNLP3), Tim (TCSL4), Vivo (VIVO4), Brasil Telecom (BRTO4), Brasil Telecom Participações (BRTP3; BRTP4), Telemar Norte Leste (TMAR5), Telesp (TLPP4) e Telemig Participações (TMCP4). Somada as participações, o setor representava 8,1% do Ibovespa.

Porém, com a fusão entre Oi (OIBR3; OIBR4) e Brasil Telecom, que resultou na consolidação do setor, além do fechamento de capital da Net em 2012, o número de empresas foi drasticamente reduzido. Para se ter uma ideia, das 9 empresas que faziam parte do Ibovespa em 2008, apenas Telefônica Brasil (VIVT4) — que comprou a Vivo em 2010 — e TIM (TIMP3) fazerm parte da composição do índice. Portanto, de uma participação de 8,1%, o setor passou a representar 2,5%.

Ação Ticker Participação em 2008 Participação em 2017*
Telemar TNLP4 1,52%
Telemar TNLP3 0,64%
Vivo VIVO4 0,86%
Telefônica Brasil VIVT4 1,69%
Brasil Telecom BRTO4 0,76%
Brasil Telecom Participação BRTP4 0,73%
Brasil Telecom Participação BRTP3 0,34%
TIM TCSL4 0,99%
TIM TCSL3 0,33%
TIM TIMP3 0,76%
Telemar Norte Leste TMAR5 0,27%
Telesp TLPP4 0,26%
Telemig Participação TMCP4 0,19%
*Carteira teórica do dia 04/10/2017

Fonte: B3

Para “compensar” essa perda, Kroton (KROT3) e Estácio (ESTC3) entraram na composição do índice, com 2,27% e 0,76%, respectivamente. As empresas do setor de educação são consideradas premiums pelos analistas, tendo em vista a resilência dos resultados e a eficência do time de gestão. Desde 2008, os papéis da Kroton dispararm 645%, enquanto de Estácio 415%.

6) Perdendo energia

Quando o assunto é dividendos, as empresas do setor de energia e saneamento são “figuras carimbadas” nas carteiras de investimento, tendo em vista seu fluxo de caixa constante e a baixa necessidade de investimento, o que confere bons frutos para os investidores. Comparado com 2008, a representatividade dessas companhias perdeu força dentro do índice.

Em termos de números de ações, houve apenas uma “baixa” quando comparada as carteiras de 2008 com 2017, mas, em termos de representatividade no índice, a queda foi de 9% para 6%. Para se ter uma ideia, apenas as ações ordinárias da CPFL Energia (CPFE3) possuem participação superior a 1% neste ano, enquanto naquele época tínhamos 3 representantes: Cemig PN (1,80%), Cesp PNB (1,55) e Eletrobras PNB (1,08%). No caso da estatal, a perda de participação foi a mais sentida: em 2008, as ações preferenciais classe B e ordinárias representavam juntas 2% do índice; agora são 0,90%.

Ação Ticker Participação em 2008 Participação em 2017*
Cemig CMIG4 1,80% 0,56%
Cesp CESP6 1,55%
Eletrobras ELET6 1,08% 0,45%
Eletrobras ELET3 0,93% 0,47%
Eletropaulo ELPL6 0,83%
Copel CPLE6 0,82% 0,23%
CPFL Energia CPFE3 0,68% 1,00%
Transmissão Paulista TRPL4 0,34%
Equatorial Energia EQTL3 0,97%
Engie Brasil EGIE3 0,59%
Energias do Brasil ENBR3 0,35%
Taesa TAEE11 0,33%
*Carteira teórica do dia 04/10/2017

Fonte: B3

7) Esquecidas pelo mercado?

Em 2008, em meio ao boom imobiliário, as ações do setor de construção estavam em destaque no mercado financeiro e na lista de compra de muitos analistas, na expectativa pelo fechamento do famigerado déficit habitacional. Porém, com os altos preços dos imóveis e a crise financeira que atingiu o Brasil, o saldo negativo não diminui no ritmo projetado e o endividamento das construtoras levaram a queda abrupta do valor de mercado dessas empresas, que foram “pulando fora” do Ibovespa.

Naquele ano, o índice era composto por Cyrela (CYRE3), Gafisa (GFSA3), Rossi (RSID3) e CCP (CCPR3), com participação total de 2,9%. Em 2017, o setor é representado por Cyrela e MRV (MRVE3), que juntas representam apenas 0,6% do índice. No caso de Cyrela, que em 2008 detinha a maior participação entre as empresas com 1,28%, agora a empresa possui 0,29%.

Ação Ticker Participação em 2008 Participação em 2017*
Cyrela CYRE3 1,28% 0,27%
Gafisa GFSA3 0,99%
Rossi RSID3 0,54%
MRV MRVE3 0,32%
CCP CCPR3 0,10%
*Carteira teórica do dia 04/10/2017

Fonte: B3

8) Nível de concentração

Quando comparamos as duas carteiras, o nível de concentração chama muita atenção. As duas ações com maior participação em 2008, no caso Petrobras (PETR4) e Vale (VALE5), detinham 26,9%, enquanto em 2017 o “Top 2” é composto pelos bancos Itaú Unibanco (ITUB4) e Bradesco (BBDC4) com total de 19,5%. Porém, quando avaliamos o “Top 5” e “Top 10”, o nível de concentração é maior neste ano.

Em 2008, as cinco ações com maior participação no índice representavam 37,2% da composição, enquanto neste ano esse número saltou para 39,7%. Quando vamos para as dez ações, o percentual passa de 51,1% para 57,3%, razão que pode ser justificada pelo menor número de empresas que fazem da carteira do Ibovespa: 66 contra 59 em 2017.

Outra prova da maior concentração do índice na versão atual em comparação com 2008 é o número de ações com participação maior de 1% na composição. Naquele ano, 31 papéis detinham representatividade maior de 1%, enquanto em 2017 são 25 empresas.