Com turbulência global, Ibovespa cai 6,31% na semana; dólar acumula alta de 2,34%

SÃO PAULO – O Ibovespa começou 2016 com o pé esquerdo, renovando seus menores fechamentos desde março de 2009. Na primeira semana do ano, o índice acumulou perdas de 6,31%, a 40.612 pontos. Nesta sexta-feira (8), após chegar a esboçar um pregão positivo, tendo alcançado alta de 1,29% na máxima, o benchmark da bolsa brasileira zerou logo após a abertura das bolsas americanas e fechou com queda de 0,20%. No radar dos investidores, ficou o Relatório de Emprego dos EUA de dezembro, que mostrou a criação de 292 mil vagas, bem melhor do que as 200 mil esperadas. Diante disso aumentam as apostas de que em março deverá ocorrer uma nova alta de juros por lá. O dólar comercial terminou o dia com queda de 0,3%, cotado a R$ 4,0403 na venda, mas acumulou alta de 2,34% na semana.

Para o economista da Leme Investimentos João Pedro Brugger, o fato surpreendente não foi exatamente a repentina onda de pessimismo nos mercados, que provocou forte queda nos índices acionários globais e respingou no Ibovespa, mas sim o movimento não ter ocorrido imediatamente após a apresentação dos dados. “Surpreendeu a Bovespa não ter piorado quando saíram os dados de emprego nos Estados Unidos”, disse. A leitura que Brugger reforça é que os investidores estariam avaliando que os números vindos mais fortes trazem temores sobre a possibilidade de elevação nos juros americanos em um ritmo mais intenso que o esperado. Vale lembrar que, com isso, investimentos em renda fixa, indexados às taxas de juros, tornam-se mais atraentes e disputam recursos antes alocados em renda variável.

 Já, Luiz Felipe Mello, analista da Appia, diz que o movimento da Bolsa não teve a ver necessariamente com o relatório, mas com a baixa liquidez e a forte saída dos investidores estrangeiros nos últimos dois meses. “Teve saída de US$ 4 bilhões dos gringos. Os dados do payroll ratificam a volta da economia americana aos trilhos. Mas o mercado aqui continua com perspectivas muito ruins”, afirma. Durante a manhã o mercado avançava, já que depois de cair 7% duas vezes nesta semana e acionar o “circuit breaker”, a China desativou o mecanismo e interrompeu a desvalorização do yuan, de modo que suas bolsas subiram, limitando a histeria que tomou conta dos mercados nos últimos pregões.

Indicadores econômicos
Por aqui, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) avançou 0,96% em dezembro, frente à alta de 1,01% no mês anterior, informou o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O resultado ficou levemente abaixo do esperado pelo mercado. Com isso, em 2015, o IPCA teve alta de 10,67%, bem acima do teto da meta do governo de 6,5% e o maior valor desde 2002, quando atingiu 12,53%. Isso significa que o Banco Central terá de enviar uma carta ao ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, explicando o porquê do Brasil não ter terminado 2015 dentro da meta de inflação.

Já lá fora, os EUA criaram 292 mil vagas de trabalho em dezembro, muito melhor do que o esperado pelo mercado, informa o Departamento do Trabalho. Pesquisa da Reuters aponta para uma criação de 200 mil vagas de trabalho no período. Já a taxa de desemprego se manteve em 5%. Além disso, a criação de vagas em outubro e novembro foi revisada para cima. O Departamento de trabalho afirmou que foram criadas 252 mil vagas em novembro, ante 211 mil projetados inicialmente e 307 mil em outubro, ante projeção inicial de 298 mil, marcando o maior número de 2015. O salário médio pago por hora, por sua vez, surpreendeu, caindo um centavo, para US$ 25,24, mas teve alta de 2,5% no acumulado do ano.

Destaques do pregão
Uma das principais ações a ditar o movimento de reversão do Ibovespa foram os ativos da Petrobras (PETR3, R$ 7,86, +0,38%; PETR4, R$ 6,27, +0,16%), que viraram para queda depois de passarem a maior parte da manhã em alta. Segundo informações do Valor, a companhia pretende acelerar a venda de ativos para reforçar caixa, levantando pelo menos US$ 14 bilhões (cerca de R$ 56 bilhões) com operações de desinvestimentos. Além disso, a estatal informou que o pré-sal segue competitivo mesmo com petróleo em queda, informou o G1. Na véspera, o preço do barril fechou pela primeira vez em 11 anos abaixo de US$ 35 no menor nível desde junho de 2004.

Em queda também se destacaram as ações de educacionais, com matéria da Folha de S. Paulo de que quase metade dos devedores atrasa o pagamento do Fies (Fundo de Financiamento Estudantil). O dado inédito foi mapeado por auditoria da Controladoria-Geral da União concluída no fim do ano passado, com dados de 2014. “Há o risco de que esse percentual continue a aumentar devido à atual situação econômica do país”, diz a CGU. Estácio (ESTC3, R$ 12,65, -5,95%) e Kroton (KROT3, R$ 8,75, -5,61%) figuraram entre as maiores perdas do dia dentro do índice.

Entre as altas, além das siderúrgicas, algumas gigantes do Ibovespa como a Ambev (ABEV3, R$ 17,07, +1,31%), com 7,9% de peso na carteira teórica do índice, tiveram sessão de recuperação. Elas ajudaram a limitar as perdas do benchamark.

As maiores baixas, dentre as ações que compõem o Índice Bovespa, foram:

As maiores altas, dentre os papéis que compõem o Índice Bovespa, foram:

As ações mais negociadas, dentre as que compõem o índice Bovespa, foram :

^* – Lote de mil ações
¹ – Em reais (K – Mil | M – Milhão | B – Bilhão) 

Dilma contraria PT
No cenário político do dia, a presidente Dilma Rousseff defendeu que a idade de aposentadoria seja elevada. Ela disse ser um absurdo que a idade média com que as pessoas começam a se aposentar no Brasil seja de 55 anos. “Vamos encarar a reforma da Previdência”, afirmou, ressalvando que é preciso criar um período de “transição”. Segundo Dilma, a alteração pode ser feita pela fixação de uma idade mínima ou de um instrumento que misture idade com tempo de contribuição, como ocorreu com a fórmula 85/95 móvel — que é a soma da idade com tempo de contribuição para mulheres e homens.

Quem não ficou feliz com o discurso de Dilma foi a base do PT. As redes sociais, tão logo encerrada a entrevista, ferveram de indignação. João Pedro Stedile, líder do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), prometeu ações de rua se as mudanças previdenciárias prejudicarem os trabalhadores rurais. Já Guilherme Boulos, chefe do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), ameaçou com um “levante popular” contra o governo.

A presidente deu apenas um sinal que pode ter agradado aos petistas: admitiu que a meta de inflação a ser perseguida pelo Banco Central este ano deve ser o teto superior de 6,5%, o que, em tese, permitirá que o Copom não eleve a taxa de juros em sua próxima reunião de 19 e 20 de janeiro, como vinha sinalizando que o faria

Fora isso, a liderança do PPS apresentará uma representação à PGR (Procuradoria-Geral da República) pedindo a abertura de inquérito no STF (Supremo Tribunal Federal) para apurar a relação do ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, com a empreiteira OAS. A companhia envolvida na Operação Lava Jato teria recebido ajuda de Wagner para negociar com liberação de pagamento com o Ministério dos Transportes em 2014. Também haveria tratativas envolvendo o financiamento de campanhas da eleição municipal de Salvador em 2012, época em que Wagner era governador da Bahia.

Semana caótica
A semana marcou forte onda pessimista dos investidores, na medida em que indicadores econômicos apontaram para piora ainda maior do quadro econômico na China. Por lá, intervenções do Banco Central sobre o yuan e dados ruins do PMI trouxeram maior aversão a riscos, que se espalhou pelo resto do mundo. Na segunda maior economia do planeta, por duas vezes a bolsa interrompeu atividade com o acionamento do mecanismo de “circuit breaker”. A primeira vez ocorreu na segunda-feira, com paralisação temporária. A outra foi na quinta-feira, no pregão mais curto da história do mercado acionário local. Também trouxe medo ao mercado o nebuloso anúncio da Coreia do Norte de que teria feito um teste “bem-sucedido” de bomba atômica, o que poderia provocar mudanças profundas nas relações diplomáticas regionais e globais.

Ainda do lado oriental, os investidores responderam negativamente ao aumento nas tensões no Oriente Médio, com o rompimento de relações diplomáticas entre Arábia Saudita e Irã após a execução de um líder religioso xiita. A sucessão de episódios conturbados trouxe um clima de ainda maior incerteza e volatilidade para os preços das commodities. Continuando a influência do exterior na semana da Bovespa, além dos dados do emprego que movimentaram a sessão de hoje, os Estados Unidos apresentaram detalhes da última reunião do Fomc, que culminou no aumento da taxa de juros por lá. O documento mostrou que, apesar de unânime, a decisão não foi tão simples e envolveu dúvidas entre alguns membros votantes.

No Brasil, os dados da indústria voltaram a decepcionar e mostraram em dezembro o 11º mês seguido de contração. Uma das poucas boas notícias, no entanto, veio da Balança Comercial, que superou as estimativas dos mais otimistas ao fechar 2015 com superávit de US$ 19,681 bilhões. Do lado político, merecem destaque os posicionamentos simétricos da presidente Dilma Rousseff e do ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, que disseram não terem “coelhos na cartola” para apresentar como solução para a economia, e deram apoio mais enfático às discussões sobre uma reforma na Previdência. Enquanto a pauta do impeachment arrefece novamente, os atritos com a base petista crescem devido à agenda econômica.