O que o diretor da Kepler Weber fala da alta de mais de 150% da ação em 2013

Em entrevista exclusiva ao InfoMoney, Olivier Colas, vice-presidente da Kepler conta como a companhia deu a volta por cima após quase falir e hoje surpreende o mercado

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Há mais ou menos dez anos, a Kepler Weber (KEPL3) era uma empresa quase falida, com um nível de endividamento digno de assustar qualquer acionista da bolsa. Com uma série de mudanças que ganharam força no começo desta década, a Kepler conseguiu apagar a imagem de empresa problemática e neste ano já acumula alta superior a 150% (leia mais em: esquecida pelos analistas, Kepler Weber já subiu 130% no ano – e pode ir além).

Esse bom momento tem se consolidado a cada resultado trimestral. Nesta terça-feira (12), a companhia divulgou o balanço do 3º trimestre, no qual somou um lucro líquido de R$ 19,8 milhões, o que representa uma alta de 171,2% em relação aos R$ 7,3 milhões do mesmo período do ano passado. Após a divulgação dos números, as ações da Kepler saltaram 5,38%, fazendo com que a empresa alcançasse seu melhor fechamento da história, com seus papéis a R$ 30,56, enquanto o Ibovespa teve queda de 1,56%. Com essa alta, o ativo KEPL3 acumula ganhos de 156,21% em 2013.

Para explicar essa reviravolta e falar do que esperar para a companhia e o setor nos próximos anos, o InfoMoney entrevistou no começo de outubro o diretor vice-presidente da Kepler Weber, Olivier Colas. Confira abaixo a conversa na íntegra que o diretor da empresa teve conosco:

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InfoMoney – Enquanto o Ibovespa cai 15% no ano, a Kepler registra um crescimento de mais de 100%. A que se deve o bom momento da empresa na bolsa?
Olivier Colas – Basicamente a combinação de duas coisas: a primeira, eu diria, seria de ordem corporativa, e a outra, de ordem mercadológica. Do lado corporativo, a Kepler vem tomando, há um ano, uma série de medidas que tendem a agradar o mercado. A primeira foi eliminar as preferenciais, fizemos um grupamento para sair das negociações a centavos, temos um market maker e uma política de dividendos, que foi anunciada e ratificada em assembleia em 2013. Este é um pano de fundo importantíssimo para agradar o mercado. Do lado do mercado, a Kepler vem se preparando, desde 2010, para um crescimento, tomando uma série de medidas de reformulação de processos industriais e da área comercial, criação de centros de pesquisa para começar a ter novos produtos que se distanciem da concorrência, que fizeram com que, com o boom que o mercado agrícola está conhecendo agora, a Kepler esteja em condições não só de entregar o que o mercado está pedindo, mas também com margens melhores que o período anterior.

Até 2012, a Kepler ainda era vista como empresa problemática por conta das dificuldades da década anterior, mas hoje acho que conseguimos apagar essa ideia. O bom momento da companhia, combinado com o bom momento do mercado e com boas práticas de governança, fez com que o mercado refletisse com a Kepler onde que ela devia estar.

IM – Como a empresa atua no Brasil? Quais são as principais fontes de receita?
OC – Se você olhar o nosso portfólio, cerca de 70% do faturamento é formado pelo mercado de armazenagem no Brasil. Nós temos aproximadamente 22% de exportação – basicamente para América do Sul, África e Oriente Médio -, e o restante, na ordem de 8%, de movimentação de granéis, que são os equipamentos das áreas portuárias, e agora estamos entrando também na área de mineração. Acho que esse desenvolvimento que estamos fazendo nessa área nova, de movimentação de granéis, também agrada os investidores, no sentido de que a empresa fica menos dependente exclusivamente – ou quase exclusivamente – do mercado de armazenagem de grão no Brasil. O mercado percebe que tem um pouco mais de robustez e perenidade para a geração de resultado e caixa da companhia olhando para frente.

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IM – Como foram sanados os problemas financeiros de 2005? Como anda a saúde financeira da companhia hoje? Tem dívidas?
OC – Em 2004/2005, a empresa decidiu fazer uma nova fábrica, antevendo um crescimento forte do mercado e alavancou bastante para isso. Infelizmente, o mercado não respondeu. A companhia estava com excesso de capacidade e dívida de razoavelmente curto prazo e, para sanar isso, ela fez um acordo com os credores e resolveu alongar o perfil da dívida, injetar dinheiro para o capital de giro, retomando, assim, rapidamente sua trajetória de crescimento. A segunda fábrica foi talhada para as condições atuais do mercado e hoje temos 2 fábricas modernas, operando com 70% de sua capacidade produtiva. Utilizando bem o ativo e não tendo mais dívidas pesadas e caras de curto prazo, a empresa anda bem.

IM – O boom do agronegócio brasileiro tem hora para acabar? O que vocês esperam do setor nos próximos anos?
OC – Eu costumo falar que temos 3 elementos que sustentam nosso crescimento: o primeiro é o tamanho da safra – e o que se vê é que a próxima safra vai estar de 5% a 10% superior à anterior, então ali, por si só, temos um indicador que diz que o mercado vai continuar bem orientado. O segundo indicador importante é a questão do preço das commodities, que continua alto – tem umas variações pequenas, mas continua, a grosso modo, em um patamar bastante alto -, então há um incentivo para o produtor investir. E o terceiro, que talvez seja hoje o mais importante, é o apoio que o governo federal dá a investimentos nessa área, com uma taxa de juro atual de 3,5%, podendo ir até 15 anos o prazo do empréstimo.

2014 eu não vejo por que seria um ano ruim. Obviamente que, na agricultura, você nunca pode dizer que não tenha uma nuvem negra que possa complicar o meio de campo, mas essa nuvem negra seria uma praga, uma seca – seria mais de ordem natural do que de ordem humana.

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IM – Como o cenário ruim para a economia brasileira pode ameaçar os negócios do campo? E a Kepler?
OC – Hoje, quem está puxando o PIB (Produto Interno Bruto) no Brasil, fora o consumo dos agentes econômicos, é a área agrícola. Independentemente do cenário político ou econômico, a área agrícola tem sua vida própria e não está sendo afetada por fatores momentâneos do brasil. Essa é a boa notícia. Acho que ele está razoavelmente imune e nós estamos surfando nessa onda. Para a Kepler, eu não vejo atualmente sinais de preocupação.

As preocupações que poderíamos ter seriam a partir de 2015. Primeiro, porque eu não sei qual seria o tamanho da safra, mas 2015, por ser um ano pós-eleitoral, a política monetária muda com um período de ajustes; se ali você tem potencialmente um momento de aumento/corte na taxa de juros, isso poderia comprometer os negócios por um período de tempo.

IM – Como as carências no setor de infraestrutura impactam no desenvolvimento do setor no Brasil? Quanto seria possível crescer em condições normais?
OC – Elas impactam positivamente e as correções que poderiam ter também. Ou seja, quando você não tem estradas ou ferrovias, você é obrigado a armazenar, porque os portos não dão conta de receber tudo ao mesmo tempo, e a forma mais rápida de resolver os problemas portuários ainda é a armazenagem perto do local de produção do grão.

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Na medida em que os gargalos da infraestrutura vêm se modernizando, você precisa de cada vez mais armazenagem, porque o problema que você tem de gargalo no porto é o mesmo do da ferrovia, hidrovia, portos e centros de transbordo. Ali, você precisa escoar ao longo do tempo, e não em um momento limitado da safra. Com isso, você obriga toda a cadeia a armazenar, em compensação, o custo de escoamento também fica mais barato. Então, independente se o setor se desenvolver, a demanda por soluções em armazenagem continua. Ela muda um pouco o perfil. Na medida em que o sistema vai fluidificando, cada vez mais, você vai armazenar perto do local de produção. Muda um pouco o perfil da demanda, mas ela continua.

IM – Você se arriscaria a dizer como seria se tivéssemos uma infraestrutura um pouco melhor em termos macroeconômicos?
OC – Seria um setor com mais rentabilidade, porque hoje uma parte do ganho no campo é jogada fora por uma infraestrutura inadequada e cara. Se este setor fosse mais rentável, ele seria muito mais competitivo. Sendo mais competitivo, ele iria buscar mais mercado, ou seja, o crescimento do agronegócio poderia se dar muito mais rapidamente no Brasil. Hoje, eu vejo uma trava: tem muita gente que faz grãos no centro-oeste, e no final das contas, com o custo que tem para escoar, não ganha muita coisa. Então, qual é o incentivo para esse pessoal crescer muito mais rápido? Uma forma de você dar muito mais gás a este setor é realmente acabar com os gargalos logísticos, reduzir os custos de escoamento e devolver parte desta ineficiência para o campo ou para a competitividade do Brasil lá fora.

IM – Em termos numéricos, você se arriscaria a dizer o tamanho do prejuízo?
OC – Eu posso dar exemplos. O que nós sabemos é que, para escoar do centro-oeste para Santos (SP), o custo é de US$ 120,00 por tonelada, e que, para o agricultor que fica no Illinois e vai até o porto de Nova Orleans, custa entre US$ 30,00 e US$ 40,00 – e lá a distância é muito maior que a de Sorriso (MT) a Santos. Estou falando aqui de US$ 80,00 por tonelada de diferença. E você admite também que a saca de milho, quando chega em Santos, tem mais custo de transporte do que de milho. Aí você percebe o tamanho da encrenca.

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IM – No começo de outubro, você disse que em entrevista ao podcast da Rio Bravo Investimentos que seria bom se preparar para um momento de “vacas magras”, tendo em vista o fato de o setor agrícola ser cíclico e já estar no caminho para acumular 5º ano de mercado bem orientado? Como a Kepler tem se preparado para esse novo cenário?
OC – O que eu quis dizer ali é que não estou antevendo já este momento, mas é o momento em que a empresa tem que se preparar para isso. Nós estamos em uma situação financeira confortável, dívidas de longo prazo e mais caixa do que dívidas. Não é o momento para ficar pensando que o mundo vai ser cor-de-rosa a vida toda, né? É agora que temos que nos preparar para esse momento. Os investimentos que estamos fazendo no momento obviamente procuram aumentar a capacidade para dar conta do crescimento do mercado, mas também visando reduzir o ponto de equilíbrio, que, para mim, é uma obsessão. A partir do momento em que estamos em um mercado altamente cíclico, nossa capacidade de reação tem que ser extremamente rápida. Não podemos ficar adormecidos ou anestesiados pelo momento.

IM – Como reduzir o ponto de equilíbrio?
OC – Tem duas coisas: a primeira, seguir revendo nossos processos industriais – nós temos um plano de 3 anos no processo industrial, e estamos no meio. Temos que continuar esse processo de especialização das linhas de produção, e vamos dar mais automação – este é o segundo ponto –, mais velocidade e menos gargalo. Com isso, a partir do momento em que você automatiza mais, você começa a pensar em séries mais compridas, repensa todos os seus equipamentos… Por exemplo: quando você olha a indústria automotiva, o espelho exterior de um Peugeot 308/408 é o mesmo – você faz economia de escala utilizando os mesmos componentes para os mesmos equipamentos.

Então, a resposta ao ponto é: automatização, séries mais compridas, e o outro tema é outsourcing – muitos componentes que a gente faz dentro de casa, a gente faria muito melhor de comprar de terceiros ou importar.

IM – Com mais de 100% de valorização em 2013, vocês acham que a ação chegou ao topo? Como continuar entregando bons resultados em um cenário que caminha para encontrar mais adversidades?
OC – (Risos) Eu já me surpreendi com a velocidade com a qual o papel subiu, então eu não me arrisco a nenhum prognóstico, mas acho que hoje há um reposicionamento do papel da Kepler no mercado. Um pouco acima ou abaixo, eu não sei te dizer, mas acho que a gente saiu definitivamente da linha dos R$ 12,00/R$ 13,00 e entrou nos R$ 20,00 e pouco. Agora, acho que o mercado hoje está comprando mesmo a nossa capacidade de crescer e de fazer resultado para a companhia – ou seja, acredito que o mercado está gostando da nossa estratégia e está dando um bônus positivo sobre a nossa capacidade de gestão. Ele vê que potencialmente uma empresa assim vai crescer e vai continuar rendendo bons dividendos com risco amenizado, comparado com períodos anteriores.

IM – Quais são os principais riscos para o negócio da Kepler?
OC – O maior risco nosso eu diria ser a monodependência do mercado da agricultura e armazenagem no Brasil. A gente está reduzindo esse risco, aumentando a exportação e desenvolvendo o mercado de movimentação de granéis. Esse risco ainda existe, mas o impacto é de proporções menores. Ao longo do tempo, nós vamos, cada vez mais, reduzindo esse risco, não deixando de vender armazenagem, mas desenvolvendo exportações e movimentação de granéis.

O segundo grande risco, que vem por tabela, é uma mudança drástica da política governamental em relação ao apoio à armazenagem de um lado e ao desenvolvimento da infraestrutura no Brasil – são dois setores nos quais estamos apostando. Se você retira o apoio do governo e as privatizações nesse setor não andam, tudo para. Eu acho que o risco de o país parar é muito maior para o país do que para a Kepler, então é um problema muito grande para se materializar de vez. Ele pode ter seus altos e baixos no desenvolvimento da política, mas essa política tá aqui para ficar. Agora, se o mercado achar que a dívida brasileira não está sob controle e que precisa aumentar significativamente a taxa de juros, isso trava o desenvolvimento e também deveremos ser impactados.

IM – E as oportunidades?
OC – A gente posicionou a empresa para captar as oportunidades. A primeira era o crescimento da armazenagem – estamos prontos, estamos dando conta do recado –, e a outra era entrar no mercado de movimentação de granéis.

IM – Qual é o perfil do investidor da Kepler? Fomos informados que quase nenhuma corretora faz análise sobre a empresa. Como isso prejudica a companhia?
OC – Nós tínhamos dois investidores acionistas históricos – um é a Previ e outro, o Banco do Brasil, que se juntaram à Kepler quando a empresa deixou de ser familiar –, e, de um tempo para cá, a partir de 2009, 20 mil acionistas pequenos – família, pequeno fundo, clube de investimento – extremamente pulverizados. O que estamos percebendo de 2010 para cá, e com aceleração forte em 2012, é que o perfil vem se concentrando em fundos de investimento, mas nenhum deles tomou ainda posição forte na Kepler – tem um que está com 7% e teve até direito a indicar alguém para o Conselho, mas o resto são fundos bem menores, com o maior deles com algo em torno de 4%) –, e family office.

Nós mudamos a sede para São Paulo em maio e isso deu muito mais visibilidade à companhia. Então, de fato, essa visibilidade é necessária, seja através do nosso trabalho aqui com o RI, como também com o mercado acompanhando o papel – que acho que tem muita gente querendo acompanhar hoje. Como eu disse, nós passamos de uma época em que a empresa era vista como problemática para uma empresa de sucesso no momento, mas também com uma bela perspectiva pela frente.

IM – O que esse investidor pode esperar da companhia no futuro?
OC – Nos posicionando tanto no mercado agrícola, como no de movimentação de granéis, e com uma agenda um pouco mais agressiva na exportação, o acionista pode ver uma empresa que vai crescer de 8% a 10% no ano, ter uma empresa com um faturamento de midcap em 2017 [nesse ano, a companhia projeta sair do status de small cap para se tornar uma midcap] e com uma geração de caixa robusta.

Então, é uma empresa que não vai necessitar um nível de capex estúpido, vai ter muito autofinanciamento. Ou seja, uma empresa que vai crescer talvez dois dígitos, mas sem uma necessidade enorme de capital, que deve continuar satisfazendo os acionistas com um dividendo que vai acompanhar o crescimento da companhia. A nossa ideia é distribuir um pouco menos de 50% do lucro líquido.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.