Primeiras leituras: Dilma vai distribuir cargos para reconquistar aliados

Os planos da presidente para livrar-se das pressões do PMDB e mudar a correlação de forças no PT sucumbiram com a vitória de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara. Agora ela terá de apelar para as nomeações do segundo escalão para reorganizar sua tropa no Congresso.

José Marcio Mendonça

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A derrota do governo na eleição para a presidência da Câmara resultou também no sepultamento do nascituro plano político da presidente Dilma e de seus articuladores palacianos de livrar-se, no Congresso e de um modo geral em toda a administração, da dependência do PMDB e da influência de uma parte do PT – aquela do petismo dominante nas duas gestões Lula e na primeira gestão dela própria.

Na formação do ministério Dilma já tinha dado alguns passos nesse sentido. Na vertente PT, privilegiou no centro do poder outras alas petistas que não a majoritária Construindo um Novo Brasil (CNB), da qual fazem parte Lula e José Dirceu. E tirou lulistas do Palácio do Planalto.

Ainda nomeou para o Ministério da Educação, pasta cobiçadíssima e que nos governos petistas sempre foi petista, o ex-governador do Ceará, Cid Gomes, com a missão paralela de organizar, partir do Pros, um bloco de apoio ao governo pela esquerda. Era uma forma de neutralizar o PT mais insatisfeito.

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Não está vingando. O PT alijado reagiu com críticas à política econômica, tendo José Dirceu como um porta-voz. E com Lula recolhido ao silêncio e deixando vazar para a impressa sinais de sua insatisfação com os rumos que Dilma está dando ao Dilma II.

Traição sem disfarce

A reação ficou mais forte com alguns petistas – fato agora registrado por vários jornais – votando em Eduardo Cunha e não em Arlindo Chinaglia no domingo, sem fazerem muita questão de disfarçar a traição.

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Com a vitória de Eduardo Cunha, a turma do CNB, como registra o jornal “O Estado de S. Paulo” de hoje, tenta dar a volta por cima. O grupo passou a cobrar ontem o afastamento de dois dos articuladores e líderes do centro nervoso político de Dilma: o ministro das Relações Institucionais, Pepe Vargas, e o líder do governo na Câmara, Henrique Fontana.

Por coincidência, ambos gaúchos, como Dilma. O CNB é forte em São Paulo e há queixas dos paulistas de que Dilma formou desta vez um “gauchério” no lugar do “paulistério” de Lula e do dela própria no primeiro mandato.

Embora seus dirigentes neguem publicamente, há sim um confronto interno forte no PT, entre as alas e entre representações regionais. Embora o PT consiga quase sempre disfarçar para o público externo seus conflitos internos, há muita expectativa de como ele vai administrá-los agora, quando há sinais de uma tentativa de mais profunda de alterar as conformações de forças no comando partidário, com reflexos nas eleições municipais de 2016 e nas presidências de 2018.

Os sinais dos novos rumos petistas poderão aflorar na reunião do PT neste fim de semana em Belo Horizonte, convocada para comemorar os 35 anos de criação do partido, para a qual Lula e Dilma são os convidados de honra.

O “partido das secretarias”

Com o PMDB a manobra de Dilma foi idêntica. Embora ela tenha aumentado, de cinco para seis, a quantidade de ministérios do partido de seu primeiro para o segundo mandato, deu à legenda comandada por Michel Temes pastas de menor importância para desgosto do apetite peemedebista.

Tanto que os peemedebistas passaram a dizer-se um “partido de secretárias”, numa alusão à secretarias com status de ministério que ganhou. O PMDB de fato diminuiu na Esplanada dos Ministérios aparentemente crescendo.

E também do mesmo modo que fez com Cid Gomes e o Pros, agraciou o ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, dono do PSD, com o estratégico Ministério das Cidades, pasta maior que o cacife do partido, com a missão de criar um contraponto ao PMDB.

Kassab, coisa que ninguém fez questão de esconder, vem se dedicando mais do que se dedica ao ministério ao trabalho de criar um novo partido, o PL, porta para atrair parlamentares de outras legendas, principalmente do PMDB e da oposição, sem riscos de perda de mandato.

Em seguida, fundirá o PSD com a nova legenda Kassab teria um partido com tamanho bastante no Congresso ara fazer frente ao pouco confiável PMDB. No limite, poderia tornar o PMDB até dispensável na aliança. Porém, até gente da turma atual de Kassab traiu Chinaglia. A estratégia está em xeque.

Fisiologismo contra o fisiologismo

O plano de Dilma esboroou-se e agora ela tenta reconstruir as pontes queimadas por ela mesma. É urgente a recomposição para o governo não vir sofrer novas derrotas no Congresso – daqui para frente com graves consequências (ver “Primeiras” de ontem).

Inevitavelmente, ela terá de apelar para os dois grupos que quis alijar: o PMDB que é hoje liderado por Eduardo Cunha e a corrente CNB do PT.

Ontem Dilma telefonou para Eduardo Cunha, a quem sabidamente detesta e com quem não conversou durante a campanha. De acordo com o deputado, a conversa foi amistosa. Cunha também está conciliador.

Porém, já pisa nos calos do Palácio do Planalto. À “Folha de S. Paulo” disse que o PMDB vai contestar na Justiça a criação de partidos como o PL de Kassab. A “O Estado de S. Paulo” confirmou que vai lutar para aprovar rapidamente a emenda do Orçamento impositivo.

Em outra frente, a presidente passou a admitir abertamente que usará a distribuição dos cargos do segundo escalão para remontar sua base de apoio no Congresso. Aloizio Mercadante, um dos três operadores da articulação política mais próximos da presidente, contou no Congresso que Dilma vai comandar pessoalmente a divisão desses pontos.

Os critérios para a nomeação, de acordo com o ministro da Casa Civil, serão a competência técnica e o apoio que o partido do indicado dá ao governo no Legislativo. Ou seja, fisiologismo para combater fisiologismo.

Fim de linha

para Graça Foster?

A “Folha” traz hoje duas informações exclusivas que indicam que o governo pode estar próximo de iniciar uma reformulação da Petrobrás, independentemente das investigações internas e externas dos casos de corrupção ocorridos na companhia nos últimos anos, não apenas os já conhecidos na Operação Lava-Jato como também outros que não será surpresa se forem descobertos.

A presidente Dilma parece finalmente convencida de que o futuro da estatal como empresa de alta qualidade está em risco.

A primeira informação do jornal diz que o ex-presidente Lula vai aproveitar o encontro que terá com a presidente sexta-feira em Belo Horizonte para pedir a Dilma a substituição Graça Foster na presidência da empresa.

Segundo interlocutores de Lula ouvidos pela reportagem a intenção dele é convencer Dilma de que o impacto provocado pela exoneração será menor do que o desgaste que a Petrobrás vem sofrendo a longo prazo. Embora num momento de distanciamento, as opiniões de Lula têm peso para Dilma (ou tinham).

Já a coluna “Painel” noticia que Dilma deflagrou ainda no fim da semana passada o processo de seleção do substituto de Graça. O ministro Joaquim Levy, da Fazenda, esteve em São Paulo ontem com a missão de sondar nomes para ocupar o posto.

O plano inicial do Planalto, diz a nota, era usar as vagas de Míriam Belchior e Guido Mantega no Conselho de Administração da Petrobrás para nomear dois conselheiros e, depois, conduzir um deles à presidência da estatal, após um período de “aclimatação”.

Porém, a confusão em torno do balanço da empresa e os números desencontrados sobre o rombo causado pelos desvios investigados na Operação Lava-Jato tiraram a margem para uma transição lenta na estatal, segundo auxiliares de Dilma. Contribuiu também o rebaixamento de todas as notas de classificação da empresa na semana passada pela Moody’s. O “Valor Econômico” também tem reportagem dizendo que a substituição de Graça Foster já está decidida.

Empecilhos políticos

No mesmo “Valor”, contudo, há uma notícia que mostra como a presidente pode enfrentar obstáculos políticos para reformular a estatal. Um das mudanças para uma “nova” Petrobrás será o fim da influência político-partidária na escolha de seu corpo dirigente. E é aí que a vaca pode tossir.

O senador Renan Calheiros, reeleito presidente do Senado e do qual Dilma tornou-se mais dependente para tentar barrar ações contrárias aos interesses do governo gestada na Câmara de Eduardo Cunha, já está se movimentando para manter o afilhado Sérgio Machado na presidência da Transpetro. Ele foi citado pelo ex-diretor Paulo Roberto Costa, delator da Operação Lava-Jato, como um dos beneficiários do esquema.

Machado saiu de licença de 31 dias em novembro, quando a PricewaterHouse decidiu não assinar o balanço do 3º trimestre da empresa e um dos motivos apresentados foi a presença dele na direção da Transpetro. Esperava-se que nesse período ele pedisse demissão ou fosse demitido. De lá para cá, sempre por pressão de Renan, a licença já foi renovada duas vezes.

O caso Machado poderá ser um teste para os limites da renovação da maior estatal brasileira.

Outros destaques

dos jornais do dia

– COMÉRCIO EXTERIOR – A balança comercial brasileira registrou déficit de US$ 3,17 bilhões em janeiro. O resultado veio pior do que o esperado pela mediana dos especialistas, que projetavam déficit de US$ 3 bilhões. Este é o quarto ano seguido em que as importações superam as exportações no primeiro mês do ano. No mês passado, as exportações somaram US$ 13,70 bilhões e as importações, US$ 16,87 bilhões. Segundo o secretário de Comércio Exterior da pasta, Daniel Godinho, o crescimento das importações ocorreu porque as empresas começaram a repor os estoques. As exportações de produtos básicos caíram 19,7% pela média diária em janeiro sobre dezembro, com destaque para minério de ferro e carnes. Já a média diária das importações subiu 2,8% sobre o mês anterior e queda de 12% sobre um ano antes.

– ATIVIDADE ECONÕMICA – O mês passado foi o pior janeiro em vendas de veículos dos últimos quatro anos. Foram licenciadas 253,8 mil unidades, uma queda de 18,8% em relação ao mesmo mês do ano passado e de 31,4% na comparação com dezembro. Os números incluem automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus. O declínio nas vendas ocorreu mesmo com os pátios das concessionárias ainda lotados de carros cuja alta do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) não foi repassada ao consumidor e de várias promoções de lojistas, com descontos e taxa zero para financiamento

LEITURAS SUGERIDAS

1. Vinícius Torres Freire – “Boas notícias para 2016” – Folha

2. Ilan Goldfagn – “A trindade impossível em 2015” – Estadão

3. Editorial – “Uma enxurrada de aumentos” – Estadão

4. Celso Ming – “Quadro difícil” – Estadão

5. José Paulo Kupfer – “Vasos comunicantes” – Estadão

6. Raymundo Costa – “Política do tudo ou nada entram em xeque” – Valor 7.