Lista de Janot não é fim do mundo para reformas ou para Temer por simples motivo: “não há plano B”

Cientistas políticos consultados pelo InfoMoney apontam impacto negativo da lista de Janot para o governo, mas ressaltam que Temer deverá "sobreviver" no cargo até 2018

Lara Rizério

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SÃO PAULO – A tão famosa “lista de Janot” finalmente foi divulgada na tarde da última terça-feira (14), algo que já era bastante esperado pelos políticos (e também pelos mercados). Contudo, se o sigilo ainda não foi levantado, a divulgação pela mídia de que o nome de cinco ministros, os presidentes da Câmara Rodrigo Maia e do Senado Eunício Oliveira, seis senadores e os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff  estão na lista mostram que ela já está mexendo bastante com Brasília. 

Com tantos nomes do alto escalão, o mercado se pergunta: qual é a sustentabilidade do governo Temer e o impacto das delações sobre as reformas? De acordo com análises compiladas pelo InfoMoney, os analistas políticos reforçam: Michel Temer deve sobreviver a esse turbilhão e concluir o mandato, levando em conta um simples motivo: “ainda não há um plano B”, como ressalta um dos especialistas. Porém, os especialistas divergem sobre o impacto das delações nas votações de reformas como a da Previdência e Trabalhista e para os protestos de rua. Confira abaixo a opinião de analistas políticos e bancos sobre o assunto:

Barral M. Jorge

O analista político da Barral M. Jorge, Juliano Griebeler, destaca que já era esperado que ministros e parlamentares do alto escalão fossem alvos dos pedidos de inquérito. Porém, ainda assim, o grande impacto na opinião pública virá com a divulgação das delações premiadas, enquanto Michel Temer não deve ser investigado. “Como presidente, ele não pode ser julgado por atos estranhos à sua função”, afirma o analista. As delações da Odebrecht não mencionam fatos após a confirmação de Temer como presidente, mas ele pode vir a ser investigado quando seu mandato acabar.

Neste sentido, aponta Griebeler, muitos ministros devem ser substituídos em função das acusações, mas o cenário mais provável ainda é Temer concluir o  mandato. “Não há plano B para o governo, e mesmo que ocorra uma mudança, não teremos uma inflexão na política do governo como aconteceu do PT para o PMDB”, afirma o analista. Sobre as acusações contra membros do governo, Temer aguarda o teor das delações para avaliar se os ministros terão condição política de continuar no cargo. “Seus dois principais aliados estão envolvidos, Eliseu Padilha e Moreira Franco, e se eles forem retirados dos seus cargos atuais, Temer perderá dois de seus principais articuladores políticos em um momento em que precisará avançar com as reformas no Congresso”, avalia.

Na opinião do analista, são grandes as chances de um impacto na agenda de votações do governo após a revelação das delações.  “O governo tentou avançar com as reformas o máximo que pode, mas não conseguirá votá-las antes da revelação das delações. Isso exigira que ele concentre seus esforços nas propostas  tidas como mais importantes: reforma da previdência e reforma trabalhista. Dessa forma, as delações podem adiar a deliberação destas medidas, fazendo até com que o governo tenha que desistir de outras propostas para conseguir aprová-las, ou ceder em partes do texto”, afirma. Neste sentido, depende de quando a decisão do ministro Edson Fachin sobre os sigilos será tomada, para verificar se o governo terá tempo de trabalhar junto à opinião pública para reduzir os danos causados à sua imagem.  

As delações, por sua vez, podem dar uma nova força para os protestos de rua. “Entretanto, no atual momento, dificilmente teremos movimentos de rua do mesmo tamanho dos realizados em 2016 por vários motivos mas, entre eles, há  dois: o fato da oposição também estar envolvida nos escândalos e pelo fato dos setores produtivos não estarem apoiando os protestos contra o atual governo”, conclui o analista.

MCM Consultores

O analista político da MCM Consultores, Ricardo Ribeiro, não acredita que a “lista de Janot” será uma ameaça tão grande às reformas de Temer. Para ele, a “lista não é um tsunami, nem o fim do mundo” que vá paralisar o governo e o Congresso. Isso porque tanto o governo quanto os parlamentares já esperavam que esta lista aparecesse e fosse divulgada. “Não vejo lógica de que, a partir dessa divulgação, o Congresso vá parar de trabalhar, os parlamentares vão continuar tocando a vida ‘como se nada estivesse acontecendo’, o que é uma estratégia, como a utilizada pelo próprio Executivo”. Neste mesmo sentido, está a “regra” do governo anunciada por Temer no mês passado, quando ele afirmou que só demitiria ministros que virassem réus. Com a demora dos processos no STF, o tempo joga a favor para os ministros e para o governo. 

Assim, a expectativa é de que o governo fique mais vulnerável, mas as reformas devem passar. No caso da reforma da Previdência, o analista político espera uma aprovação no Senado entre agosto e setembro. A expectativa é de que o governo ceda em alguns pontos; contudo, Ribeiro ressalta que há pontos cruciais, como a aprovação da idade mínima da aposentadoria para 65 anos. “O abrandamento pode acontecer, mas a variável é moderar o alcance da reforma até certo limite. Se abrandar muito, é a mesma coisa que nada, será uma reforma inócua”, aponta. 

Com relação aos protestos desta quarta-feira contra a reforma da Previdência, Ribeiro aponta que eles podem ser um “termômetro” do sentimento das ruas. As manifestações podem ser o risco mais imediato e devem ser
monitorados. “Há um risco de que ocorra um ‘curto-circuito nas ruas’, como ocorreu com os protestos contra Dilma em junho de 2013, levando a um ‘desarranjo político’, mas é algo que é bastante difícil de prever”. Já com relação aos protestos do próximo dia 26 organizados por movimentos como o MBL e o Vem Pra Rua, Ribeiro não vê tanto risco de que haja uma pauta “Fora Temer” e sim uma pauta a favor da Operação Lava Jato e contra às movimentações do Congresso para a anistia ao caixa 2. 

Eurasia

Para a consultoria de risco político Eurasia Group, o maior impacto da lista de Janot virá na corrida presidencial de 2018, mais do que na agenda de reformas de Temer. As reformas poderiam ser adiadas, não minadas. 

“Dado o papel de Padilha na negociação de reforma, provavelmente levará mais tempo para reunir uma maioria no Congresso para aprová-la”, apontam os consultores, ressaltando que não se surpreenderam que o próprio calendário do governo para aprovação da reforma da Previdência esteja mudando de abril para maio. Contudo, vale ressaltar que o ministro da Fazenda Henrique Meirelles negou mudanças no cronograma. 

  • Segundo a Eurasia, os líderes de partidos na lista de Janot provavelmente vão querer empurrar uma agenda positiva de reformas como estratégia de sobrevivência: a falta de reforma lhes custaria mais. Mesmo com a agenda de reformas prosseguindo, a Eurasia aponta que o governo sentirá o “baque”, com muitos ministros devendo cair em breve, “Algumas candidaturas, incluindo a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ficam mais instáveis juridicamente”, apontam. A Eurasia também ressalta que muitas personalidades do PSDB, incluindo os senadores José Serra e Aécio Neves, poderiam ser atingidas. 
  • Desta forma, a Eurasia reforça que a lista é suscetível de reduzir ainda mais número de candidatos viáveis para 2018, e desacreditar ainda mais a classe política, o que fortalece a percepção da visão de um campo aberto com uma forte demanda “anti-establishment” dos eleitores. 
  • Goldman Sachs

    Em relatório, o Goldman Sachs destaca esperar que o governo Temer aprove a reforma da Previdência até o segundo semestre, mesmo após a lista de Janot. A expectativa, contudo, é de que o governo Temer aprove a

    reforma após fazer “algumas concessões” durante o debate no Congresso.

    Contudo, o banco pondera: a divulgação das delações da Odebrecht e o início das investigações formais poderiam potencialmente aumentar o ruído político e a incerteza política e eventualmente reduzir o foco do Congresso na aprovação da reforma da Previdência Social. 

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.