Impeachment de Dilma com permanência de Temer coloca Aécio e Serra em disputa

Tensionamento da relação café com leite contemporânea, que guia boa parte das atividades do PSDB, chegou a um nível tão elevado que já provocou um racha no partido

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Enquanto as discussões sobre impeachment voltam a ganhar força na medida em que o governo apresenta mais dificuldades em administrar as crises econômica e política, movimentações na oposição já apontam para a evolução de uma disputa interna antiga entre tucanos paulistas e mineiros. De um lado do ringue, apresenta-se o senador Aécio Neves (PSDB), recentemente derrotado pela presidente Dilma Rousseff em disputa eleitoral. Na outra ponta, o incansável ex-governador paulista e também senador José Serra (PSDB-SP) cava relações que possam garantir, quem sabe, uma nova chance para ocupar o posto máximo da república.

Conforme afirmou o jornalista Kennedy Alencar em comentário à rádio CBN nesta sexta-feira, o tensionamento da relação café com leite contemporânea que guia boa parte das atividades do PSDB chegou a um nível tão elevado que já provocou um racha no partido com relação ao possível impeachment de Dilma Rousseff. Se, por um lado, para o mineiro o cenário ideal seria o afastamento da presidente e seu vice, Michel Temer, acompanhado da convocação de novas eleições, ao paulista interessa a permanência do peemedebista.

Para Aécio, seria indispensável que Dilma e Temer saíssem juntos. Quem assumiria nessa situação seria o presidente da Câmara dos Deputados, no momento, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), até a convocação de novas eleições. Com o recall da última disputa poucos meses atrás, Aécio não teria como ser vetado pelo PSDB e seria uma opção com mais chances que seus adversários internos. A opinião foi dada pelo cientista político e professor da Fundação Getulio Vargas Marco Teixeira, entrevistado pelo programa Na Real na TV, do InfoMoney.

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Caso as próximas eleições só ocorram em 2018, há chances de Serra crescer e entrar com força no páreo ou até para o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Por isso, talvez o tempo – ou a falta dele para os outros dois que disputam o mesmo espaço – seja vital para Aécio Neves em uma ofensiva pelo comando do Executivo. Foi neste contexto que o discurso curioso de Michel Temer acabou não agradando o tucano mineiro, já que um cenário com o vice assumindo suspenderia novas eleições. Conforme ressaltou Kennedy Alencar, os líderes do partido na Câmara e no Senado, respectivamente Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) e Carlos Sampaio (PSDB-SP) – muito ligados a Aécio -, defendem que as manifestações do próximo dia 16 de agosto incluam na agenda do movimento o pedido por eleições.

“A posição defendida pela ala do PSDB ligada ao Aécio está em minoria no campo dos que pregam, hoje, em Brasília, a hipótese de saída de Dilma do poder”, avaliou o jornalista, lembrando a posição de Fiesp e Firjan à retórica de Temer, além de alas rebeldes do PMDB da Câmara. Com isso, restou menos margem de apelo excetuando os organizadores das manifestações.

Para entender melhor o conflito interno no PSDB, é preciso lembrar das duas vertentes com mais chances de levar Dilma a um possível impeachment. São elas: a desaprovação de suas contas referentes a 2014 no Tribunal de Contas da União e uma rejeição formal das mesmas no Congresso; ou um eventual processo no Tribunal Superior Eleitoral que leve em conta uma possível irregularidade na campanha presidencial – mais atrasado e menos provável. O primeiro cenário daria possibilidades claras de Dilma sofrer impeachment com a alegação de crime de responsabilidade durante a gestão anterior e Temer ser poupado. A segunda hipótese é a que mais agradaria Aécio, já que atingiria a chapa Dilma-Temer e dificilmente pouparia o vice. Para o mineiro, o strike é o que interessa: nenhum pino pode sobrar.

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Nesta semana, a imprensa noticiou que os dois senadores teriam se reunido com o presidente da casa Renan Calheiros (PMDB-AL) e que o impeachment teria sido assunto. A conclusão teria sido de que o processo ainda não está maduro. Venceu o discurso de Aécio com um ator mais contido do que Eduardo Cunha, por exemplo. Renan pode ganhar relevância no trato do governo já que o presidente da Câmara anunciou rompimento e embarque na oposição.

Por fim, na véspera, a jornalista Mônica Bergamo disse que o vice-presidente da República Michel Temer já estaria se aproximando do senador José Serra para uma possível “dobradinha” em prol de governabilidade futura. De acordo com a jornalista, a aliança estaria chamando atenção tanto no PMDB quanto no PSDB e é entendida como um investimento. Em caso de impeachment de Dilma, o tucano se transformaria em ministro da Fazenda, o que poderia favorecer a governabilidade do governo com o apoio de parcela do PSDB. A estratégia de Serra seria, a partir de uma das pastas mais importantes do Executivo, lançar-se candidato à presidência em 2018.

Na mesma direção, Alckmin fez elogios a Temer, definindo-o como “um grande homem” que “trabalha pelo bem comum”. Em discurso feito na quarta-feira após reunião com Dilma, o vice afirmou que o país precisa de “alguém que tenha capacidade de reunificar a todos”. “Não vamos ignorar que a situação é razoavelmente grave, não tenho dúvida que é grave, e é grave porque há uma crise política se ensaiando, há uma crise econômica que está precisando ser ajustada, mas, para tanto, é preciso contar com o Congresso Nacional. (…) Como articulador político do governo, quero fazer esse apelo”, disse Temer a jornalistas.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.