Haddad minimiza “fogo amigo” e diz que arcabouço fiscal vai ao Congresso antes de LDO

Segundo ministro, Lula pediu aprofundamento de conversa com Arthur Lira, Rodrigo Pacheco e lideranças políticas antes do anúncio

Marcos Mortari

Diogo Zacarias/Ministério da Fazenda

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Em meio ao aumento da pressão dentro do governo e entre aliados sobre o novo arcabouço fiscal, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), reafirmou, nesta segunda-feira (20), que o projeto de lei complementar que vai tratar do assunto irá ao Congresso Nacional antes do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO), que, por lei, precisa ser encaminhado pelo Ministério do Planejamento e Orçamento até 15 de abril.

“A lei complementar tem que ir com a LDO, porque a LDO é uma lei ordinária. Não tem como ser depois”, disse em conversa rápida com jornalistas. “Uma coisa é o anúncio do arcabouço. Isso pode ser feito a qualquer momento, assim que eu tiver autorização do presidente Lula, que me pediu essas reuniões prévias preparatórias. Agora, a lei para o Congresso, a data limite dela é o 15 de abril, porque a LDO tem que estar baseada no novo arcabouço. Por isso que antecipamos, de agosto para março, a entrega para o Palácio do Planalto”.

O ministro também disse que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) mantém o objetivo de anunciar a medida antes da viagem oficial à China, marcada para sábado (25), mas orientou que fossem aprofundadas conversas com os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e lideranças políticas.

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“O presidente orientou que, antes do anúncio oficial, fossem feitas algumas conversas importantes com os presidentes das duas casas, com os líderes, com alguns economistas que não fossem de mercado, para evitar contágio, informação privilegiada. E também que pudéssemos falar com Jaques Wagner (PT-BA) [, líder do governo no Senado], [José] Guimarães (PT-CE) [, líder do governo na Câmara], com o líder do governo no Congresso [, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP)]. Vamos agendar hoje essas reuniões, que devem acontecer entre hoje e amanhã. O presidente mantém a intenção de anunciar antes da viagem à China”, disse o ministro.

Haddad avaliou como “muito proveitosa” reunião com Lula, o vice-presidente Geraldo Alckmin, que também é ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, e os ministros da Casa Civil, Rui Costa (PT), do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet (MDB), e da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, na última sexta-feira (17), no Palácio do Planalto.

Questionado se o anúncio do novo arcabouço fiscal será apresentado antes de o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central anunciar o novo patamar da taxa básica de juros (a Selic, hoje fixada em 13,75% ao ano), Haddad preferiu adotar tom mais cauteloso.

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“São agendas diferentes. O Copom tem sua dinâmica, não podemos também atropelar o processo de conversa, porque tem que sair uma coisa sólida, uma coisa sóbria, que faça sentido para as pessoas, e não vai ser o açodamento que vai nos levar a essa situação”, disse.

“Eu já antecipei de agosto para março. Não chegamos nem no fim de março ainda e já está entregue ao presidente Lula”, ressaltou.

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, que abriu espaço no Orçamento para a execução do novo Bolsa Família e de outras promessas de campanha do novo governo, estabelece que o Poder Executivo encaminhe ao parlamento a nova regra até 31 de agosto.

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Mas Haddad antecipou o calendário para março, em um aceno aos agentes econômicos e para que a LDO possa já incorporar aspectos da regra que deverá substituir o teto de gastos. O instrumento tem sido tratado pela equipe econômica como fundamental para viabilizar uma redução de juros pelo BC.

Após ter conhecimento ao plano do novo arcabouço, Lula pediu que Haddad intensificasse as conversas com o mundo político e recomendou que o Tesouro Nacional faça avaliações e simulações sobre os impactos da proposta.

O avanço das conversas dentro do governo ocorre em meio a um aumento da pressão do PT para que o instrumento não implique em cortes drásticos de despesas − fantasma conhecido durante o segundo mandato de Dilma Rousseff (PT), quando Joaquim Levy comandou a Fazenda.

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No sábado (18), a presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), publicou mensagem nas redes sociais defendendo a necessidade de aumentar investimentos públicos para fazer frente às expectativas de crescimento mais baixo em 2023.

“Se é verdade que a economia crescerá menos este ano, segundo indicadores divulgados pelo governo, precisamos então aumentar os investimentos públicos e não represar nenhuma aplicação no social. Em momentos assim, a política fiscal tem de ser contracíclica, expansionista”, argumentou.

Também pelo Twitter, o ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB), disse que “a nova regra fiscal deve corrigir erros do passado e retomar investimentos no país, na infra e no social”. “Nos últimos 4 anos, o teto de gastos apequenou o Brasil. Nosso vizinho, Uruguai, investiu igual com uma população 60 vezes menor. Exemplo pra nós”, disse.

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“O governo Lula começou a mudar isso com um volume de recursos que supera os últimos 4 anos, só em 2023. No mais, é seguir em frente na aprovação da nova regra fiscal, proposta pelo ministro
Fernando Haddad para abrirmos um caminho novo no desenvolvimento do país!”, prosseguiu.

Questionado por jornalistas sobre o “fogo amigo”, Haddad disse não ver divisão do governo entre alas política e econômica. “Nem sei do que se trata. Fui candidato a presidente da República pelo Partido dos Trabalhadores [em 2018], então sou de que ala? Não faz sentido esse tipo de divisão. E toda decisão é técnica e política. Ainda mais uma decisão desta importância, por isso que é o presidente da República que dá a última palavra”, disse.

Na rápida conversa, o ministro também defendeu uma “sintonia fina” entre responsabilidade social e equilíbrio fiscal e manifestou preocupação com as perspectivas de crescimento mais baixo da economia.

“Estamos todos preocupados com a questão da economia, porque, efetivamente, estamos tendo uma desaceleração. Mas essa desaceleração não tem nada a ver com essa discussão sobre o arcabouço, tem a ver com a herança que recebemos do governo anterior”, salientou.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.