Governo Dilma tem “recaída” e volta à era Mantega com medidas para socorrer economia

Assim como em 2012, novas medidas foram anunciadas para recorrer o setor automotivo usando bancos públicos - o que não agradou o mercado

Lara Rizério

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SÃO PAULO –  “Eleição nova, governo novo, equipe nova”, disse a presidente Dilma Rousseff no dia 4 de setembro de 2014, um mês antes do primeiro turno das eleições presidenciais.

A frase foi pronunciada em resposta a um questionamento sobre se mudanças em ministérios seriam realizadas caso ela fosse reeleita, o que foi sinalizado por muitos que o ministro Guido Mantega, que ocupava a Fazenda, sairia do governo. Com isso, as sinalizações eram de que, mesmo se a presidente fosse reeleita, a política econômica iria mudar. 

Dito e feito. Apesar da presidente ter tentado desfazer o mal estar provocado pela sua fala, o ministro Mantega, que sempre foi muito criticado por suas políticas intervencionistas no governo Dilma I, passou a ser tratado como demissionário e a grande questão que guiou os mercados passou a ser quem seria o novo ministro, provavelmente mais pró-mercado.

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Em novembro, após Dilma ter sido eleita e depois de muito suspense, foi anunciado que o novo ministro seria Joaquim Levy, dando indicações de que a política econômica iria mudar e o governo passaria a intervir menos no mercado. A “nova matriz econômica” deu lugar as indicações de que haveria medidas mais pró-mercado mas, oito meses depois, o “espírito” Guido Mantega voltou para socorrer setores em meio ao cenário de crise econômica. 

Agora, em agosto, em um gesto de boa-vontade com os empresários, que levaram cerca de 50 empresários à Brasília para conter o aumento de impostos, a presidente ordenou aos bancos oficiais conceder créditos subsidiados às empresas. “A primeira beneficiada deve ser a indústria automobilística. A decisão, em linhas gerais, é do mesmo figurino de Mantega, ação muito criticada por Joaquim Levy quando assumiu a Fazenda”, conforme destaca o blog do InfoMoney Primeiras Leituras desta quarta-feira. 

O Banco do Brasil (BBAS3) anunciou que antecipará a fornecedores da cadeia automotiva R$ 3,1 bilhões até o final deste ano no âmbito do protocolo firmado com o segmento e que contempla 26 empresas. Além disso, a instituição anunciou ainda que, a partir da ampliação de acordos do gênero, pretende alcançar 500 empresas com desembolso de aproximadamente R$ 9 bilhões de diversos setores produtivos como cooperativas, incorporadoras e grandes empresas exportadoras. Em um dia negativo para a Bolsa, o BB vê seus papéis caírem ainda mais (cerca de 5%) que o Ibovespa.

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Além do BB, a Caixa Econômica Federal também firmou convênio com a Anfavea, o Sindipeças e a Fenabrave para apoiar o setor automotivo. A expectativa do banco é liberar aproximadamente R$ 5 bilhões até o fim de 2015 em linhas de capital de giro e de investimento com juros mais baixos e prazos maiores às empresas do segmento.

As medidas se assemelham às tomadas com o foco no setor industrial tomadas pelo governo em 2012, no auge do intervencionismo realizado pelo primeiro mandato do governo Dilma. Em meio à fraqueza da atividade industrial durante todo o ano, o governo atuou de diversas formas através da elevação de impostos de importação, redução de tributos internos, anúncio de pacotes de investimento e até mesmo através da desvalorização do dólar para que o setor tivesse um melhor desempenho. 

Relembre: de bancos ao setor de energia: veja as medidas tomadas pelo governo em 2012

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Dentre as diversas medidas tomadas pelo governo, estiveram os anúncios de desoneração da folha de pagamento (que está sendo revista agora, com o governo em busca da “reoneração como uma das medidas para promover o ajuste fiscal) pelo governo no início de março.

O Banco Central também foi utilizado para promover a indústria em 2012. O BC reduziu compulsórios e liberou R$ 18 bilhões para novas operações de crédito, cujo destino seria o financiamento de automóveis e de veículos comerciais leves. No mesmo período, foram anunciadas ainda a redução do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) para certas categorias de veículos, de modo a evitar demissões no setor produtivo, como afirmou Mantega. As medidas de estímulo culminaram com a compra de uma série de equipamentos e bens de capital pelo governo para estimular a indústria e alavancar o crescimento da economia no valor total de R$ 4,83 bilhões como parte do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), além de prorrogar a redução do IPI para diversos produtos e de outras ações que implicam uma renúncia final de cerca de R$ 5,5 bilhões

Voltando para 2015, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirmou que as novas linhas de crédito abertas pelo BB e pela Caixa ao setor automotivo, que podem ser estendidos a outros, não afetam o ajuste fiscal e não oferecem riscos. Porém, as medidas não repercutiram bem no mercado, em meio às indicações de que o governo volta a usar banco público contra a recessão.

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Com relação aos bancos públicos, a sensação é de contrassenso, apesar de agentes do governo indicarem que a medida vem para contribuir com alívio ao setor produtivo”, avaliam os analistas da Concórdia Corretora destacando que, novamente, o BB deve ser o mais impactado.

Assim, em meio à crise que deve levar o PIB, o governo volta a usar os bancos públicos contra a recessão. O pacote foi feito justamente após a Fierj e a Firjan, duas das maiores identidades industriais do País, terem divulgado apoio público à governabilidade, enquanto Confederações como a CNI (Indústria), CNA (Agricultura e Pecuária) e CNT (Transportes) preparam um manifesto contra o impeachment de Dilma e a favor de um pacto pela governabilidade.  Mas não é só isso.

Além disso, em um gesto para a população e sob pressão política, o governo voltou atrás e fez o Ministério da Fazenda manter o adiamento de metade do 13º salário aos aposentados e pensionistas. O pagamento havia sido suspenso pelo ministério com o argumento de falta de fluxo de caixa para bancar a despesa. Assim, o “espírito de Mantega” parece ter rondado de novo o governo da presidente. 

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.