Governo celebra volta da concorrência em leilões e projeta apetite prolongado

Ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB) diz que maior competitividade deve ser a tônica dos próximos certames; pasta planeja outros 12 leilões em 2024

Marcos Mortari

O ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB), após encontro com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e o governador do Paraná, Ratinho Junior (PSD), no Palácio do Planalto (Foto: Valter Campanato/Agência Brasil)

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O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) realizou, nesta quinta-feira (11), seu primeiro leilão de concessão rodoviária de 2024, que abrange o trecho entre Belo Horizonte (MG) e Juiz de Fora (MG) da BR-040. Trata-se do terceiro leilão sob a nova versão do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a primeira relicitação desde que entrou em vigor a legislação (Lei nº 13.448/2017) que criou o instrumento há 7 anos.

A EPR, formada por Equipav e Perfin, foi quem venceu o leilão, com uma proposta de 11,21% de desconto sobre a tarifa de pedágio máxima prevista no edital. Também participaram do certame o Consórcio Vetor Norte, que ofereceu desconto de 0%, e a CCR, com a proposta de 1% de desconto. A concessão é pelo período de 30 anos e engloba um trecho de 232,1 km. São previstos investimentos de cerca de R$ 8,7 bilhões.

Quase 5 meses depois do último leilão de concessão rodoviária − da BR-381 (batizada de “Rodovia da Morte” pelo elevado número de acidentes registrados), entre as cidades de Belo Horizonte (MG) e Governador Valadares (MG) − ser cancelado após não receber nenhuma oferta (“dar vazio”, no jargão da área), é um alívio para o governo federal a alta demanda registrada na estreia em 2024.

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Para o ministro dos Transportes, Renan Calheiros Filho (MDB), a maior competitividade deve ser a tônica dos próximos leilões programados para o ano − a meta da pasta é destravar 13 projetos apenas em 2024 (com potencial de gerar R$ 122 bilhões em investimentos) e encerrar o mandato com 35 leilões executados. Segundo o político, neste ano já há 5 projetos aguardando análise do Tribunal de Contas da União (TCU), que deverão estar prontos para a abertura de edital em 2 meses.

Em entrevista concedida ao InfoMoney, na última quinta-feira (11), a poucas horas do leilão na sede da B3, em São Paulo (SP), Renan Filho disse que é preciso virar a página do baixo volume de certames para destravar os investimentos necessários em infraestrutura no País. E apontou o caminho das pedras do governo para atrair o interesse de cada vez mais atores, sejam eles concessionárias, construtoras e fundos − nacionais e estrangeiros.

“Neste ano, temos uma meta de 13 leilões e acreditamos que vamos fazer muito mais do que a média histórica. O governo do presidente Lula acredita que não adianta fazer um leilão por ano, porque isso não dialoga com a necessidade da nossa infraestrutura. E não devemos fazer leilão para atrair o investimento privado para dizer que fizemos; devemos fazê-lo para fortalecer a infraestrutura e aumentar a competitividade do país, a qualidade de vida das pessoas e gerar empregos”, disse.

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Veja a lista de trechos com perspectiva de leilão neste ano:

Renan Filho atribui parte da histórica lentidão nas concessões rodoviárias à velocidade da burocracia governamental. Ele conta que sua gestão à frente do Ministério dos Transportes − pasta recriada pelo atual governo a partir do desmembramento do Ministério da Infraestrutura − focou em melhorias mercadológicas para atrair novos entrantes, aprimoramentos na divulgação dos processos, na uniformização de projetos, na modernização de contratos e no diálogo com o setor privado e o próprio Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

“Nos últimos 6 anos, só disputaram uma ou duas empresas [nos leilões]. O ano passado [seguiu] a tônica dos anteriores. Mas as mudanças ocorreram no ano passado e neste ano já observamos um cenário diferente. Fazemos o leilão hoje com o maior número de participantes desde 2018. Isso é significativo − e acreditamos que teremos mais competição pela frente, mesmo com o pipeline mais arrojado”, pontuou.

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Dada a elevada dependência no passado de um número reduzido de “peixes grandes” no mercado de infraestrutura que abocanhavam boa parte das concessões, o governo agora mira em novos entrantes a partir de leilões menores (o leilão de relicitação de ontem, por exemplo, envolveu apenas parte de um contrato original, que foi dividido em três) e levanta a bandeira de modelagens mais modernas para atrair o apetite privado.

“No passado, levava-se a leilão com Capex estimado em valor de 3 anos atrás, para depois reajustar tarifa. Estamos soltando todos os leilões com Capex atualizado − o que garante muito mais segurança para o privado”, explicou. O ministro também destaca novos contratos que permitem o compartilhamento de riscos entre os concessionários e o setor público, seja do ponto de vista geológico, seja por variações altas de demanda.

“Se a demanda estimada no projeto for frustrada em mais de 10%, esse risco é compartilhado entre público e privado. E se ela for subestimada, o privado também vai ter que compartilhar com redução de tarifa o ganho de faturamento”, disse o ministro, que sustenta que o movimento coloca o Brasil “na vanguarda” internacional.

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“O Brasil hoje é um país que tem segurança jurídica, bons contratos, que faz leilões na Bolsa de Valores com ampla transparência, acompanhamento da imprensa. Tem um ambiente regulatório que permite entendimentos consensuais − o que também facilita, porque o privado prefere isso do que a litigância no Judiciário”, destacou.

Em outro flanco, há um esforço por cada vez maior “financeirização” dos processos, com o ingresso de fundos de investimentos nacionais e estrangeiros nos certames. O ministro tem investido em roadshows pelo mercado e espera aumentar o ingresso de recursos de fundos soberanos nos projetos de infraestrutura brasileiros.

“No passado, uma construtora tinha que ir ao mercado captar o recurso com base no seu próprio histórico. Então, como conseguir se endividar tanto para fazer o investimento que o Brasil precisa? Muito difícil. Cria-se uma associação com vários perfis que facilita bastante”, avaliou.

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Além disso, Renan Filho vê o ciclo de cortes na taxa básica de juros (a Selic, atualmente em 10,75% ao ano), como elemento fundamental para gerar apetite de investidores e esquentar o mercado de infraestrutura no País, estimulando a retirada do capital dos mercados financeiros para a economia real em projetos de longo prazo. O mercado projeta que a Selic chegue a 9% em dezembro, segundo a última edição do Relatório Focus, divulgada pelo Banco Central nesta semana.

Questionado sobre as tentativas frustradas de conceder a BR-381 e o que tal experiência deixa de lição para os próximos leilões no pipeline, Renan Filho diz que sua gestão herdou um projeto mal desenhado, que não trazia uma relação de retorno proporcional aos riscos inerentes à operação.

“O projeto estava mal feito. Não compartilhava risco geológico, garantia uma taxa interna de retorno para o maior desafio de engenharia do Brasil igual ao da BR-040 (leiloada nesta quinta-feira), que é uma rodovia consolidada, com desafios geológicos e de engenharia menores”, afirmou.

“Você não pode leiloar 10 projetos, todos com a mesma taxa interna de retorno, tendo um deles um risco muito maior. Nós estamos adequando a rentabilidade do projeto ao risco inerente. Isso vai garantir que o próximo leilão da BR-381 seja bem-sucedido como este (da BR-040)”, disse.

O ministro contou que sua gestão tentou realizar adequações ao modelo em tramitação e que compartilhou com o TCU suas preocupações sobre o risco de o leilão “dar vazio”. “Não dá para o setor público achar que o mercado não percebe esses detalhes. Ele sempre perceberá, e, por isso, nós também temos que estar conectados com o comportamento mercadológico na hora de levar a leilão os nossos ativos. Um ativo muito bom e fácil também pode ter um retorno menor. Ativo muito difícil, muito complexo, com Capex muito grande também por conta disso, também precisa garantir retorno maior. Nós corrigimos isso”, pontuou.

O governo trabalhou em ajustes na modelagem e espera realizar um novo leilão para o trecho em agosto ou setembro deste ano. A ideia, além do compartilhamento de riscos geológicos, é deixar para o Poder Executivo algumas partes consideradas mais complexas no projeto, como a de desapropriações no trecho entre Belo Horizonte e Caeté (MG). Será um teste de peso para a capacidade da atual administração em atrair o apetite dos investidores privados.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.