Depois da tempestade perfeita, veio a “euforia” na Bolsa; mas será que ela já passou?

O ano de 2014 começou extremamente negativo para a bolsa brasileira numa indicação de que a tempestade perfeita viria com força; já março foi positivo, apesar de fatores de pressão continuarem

Lara Rizério

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SÃO PAULO – O ano de 2014, que começou com o pé esquerdo para a Bolsa brasileira, pareceu ter passado por uma virada nas últimas três semanas, zerando as fortes perdas que obteve em pouco mais de dois meses. O rali eleitoral e uma bonança vinda do exterior deu uma certa pausa nos temores que vinham afetando negativamente o mercado acionário nacional, que passou de um dos piores do mundo para um dos de melhor desempenho entre os principais índices mundiais nas últimas semanas, com desempenho superior a 15%. 

Mas como essa virada aconteceu? Vale retomar, primeiramente, a já forte queda que o Ibovespa, principal benchmark da bolsa brasileira, registrou em 2013 – de 15,5%, sendo um dos piores desempenho do mundo. E a baixa se seguiu em 2014, com elementos que ultrapassaram a “tempestade perfeita” defendida pelo ex-ministro da Fazenda Delfim Netto, que se constitui em: simultânea deterioração das contas externas, perda de confiança na situação fiscal, aperto monetário nos EUA e depreciação do real.

O novo ano começou ainda pior do que se poderia esperar para o Brasil. Se, no final do ano de 2013, as perspectivas eram de que o próximo ano não seria positivo para os mercados pela combinação de um iminente rebaixamento da classificação de risco do País, um cenário de deterioração fiscal e a redução dos estímulos à economia norte-americana pelo Federal Reserve, elas azedaram ainda mais por uma série de fatores não antecipados pelo mercado. A expressão criada por analistas do Morgan Stanley, os “5 frágeis” – grupo composto por África do Sul, Índia, Indonésia, Turquia e Brasil – ganhou forças no mercado, ao destacar as economias que se tornaram demasiadamente dependentes de investimentos estrangeiros bastante instáveis para financiar as suas ambições de crescimento. 

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O primeiro foi uma readequação bem mais forte do que a esperada em meio à redução dos estímulos à economia norte-americana, associada a um cenário de maior temor em relação aos países emergentes, devido às perspectivas piores sobre a sustentação do crescimento econômico por diversos motivos: a desaceleração da economia chinesa, a falta de reformas estruturais, entre tantos outros. 

Neste cenário, o Brasil foi duramente atingido: até meados de março, o Ibovespa atingiu perdas de mais de 12%. E a crise dos emergentes afetou o País duramente no final de janeiro, com a queda se acentuando após a Pimco, gestora que detém o maior fundo de renda fixa do mundo, ressaltou que há falta de “Ordem e Progresso” no Brasil, numa alusão à bandeira nacional. Em relatório, Michael A. Gomez – co-responsável pela equipe de gestores do portólio de emergentes da gestora, avaliou que, embora existam ativos atrativos no Brasil, a instauração da “ordem” no mercado financeiro local é incerta a menos que políticas efetivas sejam restauradas.

E mais um golpe foi dado nos últimos dias de janeiro. Em meio à forte desvalorização de suas divisas, diversos bancos centrais de países emergentes – como Índia e Turquia – passaram a elevar os juros e aumentaram a pressão de que a autoridade monetária brasileira também subisse a taxa Selic, que já estava em um ciclo de alta. Enquanto isso, a balança comercial continuou registrando déficits atrás de déficits e aumentaram ainda mais a percepção de risco sobre o Brasil. 

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Somou-se a esse caldeirão de ingredientes e ao quadro de deterioração das contas públicas, o risco de rebaixamento de rating por importantes agências de classificação de risco em meio à combinação de um cenário de elevação de endividamento público e menor crescimento da economia nacional. 

Alívio até depois do rating…
Em meio a um cenário tão negativo, o Ibovespa chegou a ser negociado abaixo dos 45.000 pontos pela primeira vez desde abril de 2009. E o pior de tudo: em meio a um ambiente tão desalentador, poucas eram as perspectivas de que o índice se recuperasse, no máximo tendo leves correções técnicas. 

Mesmo com o cenário de maior “calmaria” nos emergentes no início de março, o Brasil continuou sofrendo, apesar de alguns dados sobre a economia brasileira terem vindo melhor do que o esperado, como o PIB (Produto Interno Bruto) de 2013, que registrou aceleração para 2,3%. Porém, a trajetória de crescimento nacional ainda parecia pouco confiável, associado ainda às incertezas em relação à China, o que trouxe perspectivas incertas para o fluxo de capital no País. 

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Contudo, a partir de meados do mês, a tendência negativa do Ibovespa pareceu ter chegado ao seu limite e encontrou o seu ponto de virada os rumores sobre as eleições presidenciais e o fato depois de precificado o boato: o rebaixamento de rating pela agência Standard & Poor’s. 

O “rali eleitoral” teve início a partir do dia 18,  quando se deu início as especulações sobre as próximas pesquisas eleitorais, que apontariam para queda da intenção de voto da presidente Dilma Rousseff para a sua reeleição nas eleições de outubro. Primeiramente, surgiram rumores de que a pesquisa Ibope apontaria para uma queda das intenções de voto na presidente Dilma Rousseff, o que impulsionou as ações das empresas estatais. Em meio às fortes intervenções da atual presidente nas estatais, os investidores registram maior apetite ao risco enquanto as chances de outros candidatos ganharam a eleição aumentam. 

Após dois dias de fortes ganhos, a pesquisa não cumpriu as expectativas e mostrou que a atual presidente seria reeleita ainda no primeiro turno. Mesmo assim, as ações continuaram em alta. No último dia 27, outra pesquisa do mesmo instituto mostrou que a popularidade de Dilma caiu, e mesmo sem indicar intenções de voto, voltou a animar o mercado, levando as estatais a dispararem mais uma vez. Já no último sábado, a pesquisa Datafolha mostrou uma queda de 6 pontos percentuais nas intenções de voto de Dilma, que caiu de 44% para 38%. 

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Enquanto isso, o rating rebaixado pela S&P preocupou, mas foi apontado como já precificado pelo mercado. Mesmo surpreendendo depois de vir meses antes das eleições, o corte não abalou a renda variável de forma significativa e, na sessão seguinte após o acontecimento, do dia 25 de março, o índice subiu pelo sétimo dia seguido. 

O cenário se completou ainda com o comunicado da última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), que suprimiu do seu comunicado o trecho em que a autoridade afirmava estar “dando prosseguimento ao processo de ajuste da taxa básica de juros” – numa sinalização de que o ciclo de aperto está próximo de se encerrar. Com isso, a sinalização de fim de alta da Selic impulsionam setores como imobiliárias e varejistas, além de tornar o cenário mais atrativo para a renda variável. 

Além do cenário interno, exterior também contribuiu
Conforme destacou o analista sênior do Bradesco, Carlos Firetti, o movimento de forte alta da Bolsa brasileira, iniciada em 17 de março e que se estendeu em 12 de 16 pregões, veio diante da avaliação de baixa exposição de investidores a ações brasileiras em relação ao consenso. 

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O movimento, que Firetti definiu como “técnico” e “inesperado”, seguiu-se, além da decisão da S&P de colocar em “estável” a perspectiva da nota soberana do Brasil, à turbulência geopolítica que levou investidores a se retirarem de ativos da Rússia, em meio à crise com a Ucrânia.  Com isso, o movimento de compra de ações ganhou impulso no Brasil com o ingresso líquido de R$ 2,9 bilhões de recursos estrangeiros na Bovespa no mês passado, o maior volume desde setembro. Nos primeiros quatro dias de abril, o saldo externo na bolsa ficou positivo em R$ 1,4 bilhão e no acumulado do ano, em R$ 4,8 bilhões, segundo dados da BM&FBovespa. 

 Além disso, a percepção de risco para os emergentes também melhorou, como ressalta o Credit Suisse em relatório, destacando três fatores: fundos de hedge voltaram a comprar ações de países contidos nesta classificação depois da exposição ter se aproximado da mínima em três anos em meados de março, o quadro econômico começou a se estabilizar e as medidas utilizadas pela China começaram a surtir efeito nos mercados acionários. 

Fatores de risco volta a ganhar destaque; fôlego se manterá?
Contudo, logo após a euforia na segunda-feira após os dados do Datafolha, quando o Ibovespa subiu 2,10%, as preocupações com a economia brasileira voltaram à tona. As perspectivas para a economia do Brasil foram cortadas pelas principais instituições mundiais: o FMI (Fundo Monetário Internacional) cortou a previsão pela quarta vez para o o PIB (Produto Interno Bruto) de 2014, avaliando que a expansão neste ano será de 1,8%, menor do que em 2013, de 2,3%.

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Enquanto isso, o Banco Mundial para a economia brasileira apontou que o Brasil deverá crescer no máximo 2% este ano por não ter promovido reformas para impulsionar o crescimento, a poupança e os investimentos.

Além disso, houve até quem atribuísse a fala do ex-presidente Lula a blogueiros na última terça-feira, reforçando que Dilma será a candidata à reeleição e que ela é disparadamente a melhor para ganhar as eleições, aumentaria a aprovação de Dilma Rousseff, uma vez que Lula é um dos seus mentores. 

Soma-se a isso o resultado do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo)de março, de 0,92% no mês, que reforçou as expectativas de que a inflação utilizada como referência deve superar o teto da meta estabelecida pelo BC, de 6,5% ao ano. 

E, dentre as notícias pessimistas que seguem assombrando o Brasil, o Citi destaca os riscos de racionamento cada vez mais próximos, os temores de que as novas altas nos juros não seja suficiente para conter a inflação, o rebaixamento do rating anunciado pela Standard & Poor’s e a descrença de que a meta do superávit primário seja cumprida. Neste cenário, a atenção com os problemas brasileiros continua. 

Além desse quadro, o rali acionário ainda pode perder forças, conforme aponta o analista do Bradesco, por possíveis turbulências antes das eleições presidenciais de outubro. Enquanto isso, o Credit Suisse segue neutro com os emergentes e prefere escolher países em separado, sendo que o Brasil não está entre os destaques. 

Por fim, outra agência de classificação de risco – a Fitch Ratings -, afirmou em março que iria concluir a revisão do rating em julho, o que pode pressionar ainda mais o País, apesar de tranquilizar o mercado ao apontar que não haveria revisões neste momento. Contudo, os motivos de pressão continuam rondando o mercado, somados a isso ao movimento mais baixistas das boldas norte-americanas, que podem atingir o Brasil. Dentre tantos fatores negativos pesando do outro lado da balança, será que a euforia foi apenas um movimento passageiro? É esperar os próximos capítulos para saber. 

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.