Receita do Atmos, melhor fundo de ações da década: não errar, em vez de acertar na mosca

Atmos Ações acumulou retorno da ordem de 647% em 10 anos até 2019, quase dez vezes maior que o do Ibovespa no mesmo período

Mariana Segala

SÃO PAULO – Há certas palavras proibidas na Atmos Capital, gestora carioca criada em 2009. Uma delas é “convicção”. Fundadores da casa, Bruno Levacov e Lucas Bielawski são não-convictos com orgulho: eles raramente perseguem “a” grande aposta.

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A lógica é que a dúvida permanente em relação às próprias decisões de investimento afasta a rigidez e abre espaço para a flexibilidade nos investimentos, dando margem para que possam mudar de ideia sem peso na consciência. Gerar bons resultados ao longo do tempo, afinal, depende menos de fazer algo brilhante – e mais de não fazer nada estúpido, defendem.

Esse mantra, incomum em um ambiente competitivo como o mercado financeiro, conduziu a gestora a um feito e tanto: o Atmos Ações, principal fundo da casa, foi eleito o melhor fundo de ações da década pelo ranking InfoMoney-Ibmec 2020, com um retorno acumulado de 647,44%, quase dez vezes maior que o do Ibovespa no mesmo período.

A filosofia da Atmos de evitar riscos desproporcionais se reflete em alguns marcos conquistados pelo fundo. Historicamente, por exemplo, os maiores impactos negativos causados por maus investimentos não passaram de 2% da carteira. Das duas, uma: ou a equipe de gestores opta por papéis considerados mais seguros, ou compra uma posição pequena quando as ações envolvem um nível de risco maior.

A Atmos se tornou conhecida nos últimos anos por não se apegar a teses de investimento como se estivessem escritas em pedra. Entre 2013 e 2015, a Bolsa brasileira teve três anos de desempenho sofrível. O fundo, por sua vez, valorizou dois dígitos em todos eles. A estratégia foi mudar o foco. Embora normalmente permaneçam comprados em ações o tempo todo, os gestores não se encabularam ao buscar instrumentos alternativos durante o pior da crise.

Nesse período, investiram em títulos públicos de longo prazo atrelados à inflação. Alocaram parte do patrimônio em dólares. Compraram bonds no mercado internacional, e abriram até uma pequena exposição em ações globais. Mantiveram-se dentro dos limites da regulação, que obriga fundos de ações a investir pelo menos dois terços do patrimônio em ações de fato. Com o terço que sobrou, no entanto, fizeram combinações para reduzir as chances de perda – e com elas, acabaram ganhando bastante dinheiro.

Adotar esse tipo de proteção, é claro, teve seus custos. Enquanto o Ibovespa avançou 39% em 2016, o Atmos ganhou 26%. Em 2017, o placar foi de 27% a 21%, também em favor do Ibovespa.

Investimentos de valor

“A Atmos segue a escola do value investing. Os gestores procuram ações de empresas não tão óbvias e que, por isso, sejam menos visadas”, diz um analista de fundos. “Eles olham menos para o cenário macroeconômico e mais para os detalhes de cada papel. Com isso, não se deixam influenciar pelos grandes movimentos ao tomar suas decisões de investimentos.”

A origem dos fundadores ajuda a entender esse ponto. Levacov veio da Investidor Profissional, uma das primeiras gestoras de fundos do país. Bielawski era da Gávea Investimentos. Seus primeiros sócios também trabalharam nas mesmas casas.

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Hoje, com um total de 10 sócios, a Atmos é a oitava maior gestora de fundos de ações do país, com quase R$ 9 bilhões sob gestão, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

Cerca de dois terços desse patrimônio foi formado somente pela valorização dos investimentos. A captação de recursos responde por um terço, já que o fundo da casa está fechado para novos investidores há anos. Sempre operando uma só carteira, a Atmos é monoproduto por opção. “Quanto mais nosso sucesso depende de um só produto, mais chances de entregarmos um bom desempenho e mais leal nossa relação com os cotistas”, diz Levacov.

O fundo campeão tem uma carteira formada por cerca de 20 papéis. Eles raramente estão focados em um segmento específico da economia. Nos últimos dois anos, algumas das posições com melhor desempenho foram em ações de Alpargatas, Eneva e Equatorial Energia. Já tiveram também papéis da Cielo, da Lojas Renner e da Localiza.

“Em comum, são empresas mais ligadas ao desempenho da economia doméstica. A Atmos sobressaiu com ações de consumo e varejo, evitando as que pudessem sofrer o impacto dos preços das commodities ou de uma mudança estrutural de mercado, como as estatais”, afirma o analista de fundos.

Nova economia

Recentemente, o tema a que os gestores têm dedicado mais tempo de estudo é a “nova economia”, jovens empresas de base tecnológica com modelos de negócio muito distintos dos tradicionais grandes nomes da Bolsa. Em um ajuste de velas “tímido”, como diz sua mais recente carta a investidores, a Atmos tem hoje cerca de 10% do portfólio alocado em empresas como Stone, Mercado Livre e Banco Inter.

Não é um movimento trivial para um fundo como o Atmos, tão focado em equilibrar retorno e risco. Mas, na visão dos gestores, “ter um portfólio concentrado em declinantes incumbentes geradores de caixa, mesmo que estes estejam incrivelmente descontados, pode ser a verdadeira antítese da proteção de patrimônio”, como defendem na carta aos investidores. “Para complementar, a atual abundância de capital resulta na atribuição de múltiplos estratosféricos aos negócios maduros com algum crescimento, justamente quando estão mais próximos de serem disruptados.”

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Mariana Segala

Editora-executiva do InfoMoney