Investidor brasileiro dará um “clique” sobre juros, diz Persio Arida

Para sócio do BTG Pactual, as pessoas vão entender que aplicações de renda fixa indexadas ao CDI só servem para "estacionar" o dinheiro

João Sandrini

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SÃO PAULO – Os investidores brasileiros ainda não se deram conta dos efeitos negativos da queda dos juros sobre o retorno das aplicações de renda fixa, mas, uma hora ou outra, ainda vão dar esse “clique”. A opinião é de Persio Arida, sócio e CEO do BTG Pactual Asset Management, a maior gestora brasileira de recursos independente de um banco de varejo, uma instituição que administra quase R$ 130 bilhões.

Arida, que também foi um dos pais do Plano Real, diz que existe no Brasil uma cultura muito forte de investimentos em renda fixa, indexados ao CDI e de curto prazo – o que fez muito sentido nos tempos de juros altos do Plano Real. No entanto, com juros reais negativos ao redor do mundo desenvolvido, é possível que, no Brasil, em breve as taxas pagas pelos títulos públicos mais conservadores também estejam próximas a zero quando descontadas da inflação pelo IPCA.

É provavelmente neste momento que o investidor brasileiro vai dar o “clique” e perceber que os investimentos de risco muito baixo servirão apenas para “estacionar o dinheiro” enquanto se decide onde aplicá-lo no longo prazo. Leia a seguir os principais pontos de uma palestra de Arida na Expert 2012, o congresso anual da XP Investimentos:

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O CLIQUE
Vai haver muita oportunidade de investimento se as taxas de juros convergirem para os patamares internacionais. Quando a inflação era de 20% ao mês, a taxa de juros era de 30% ao mês. Nesse cenário, acabava sendo muito arriscado investir em bolsa ou em papéis de longo prazo. É por isso que o brasileiro tem essa cultura de investimentos em renda fixa, indexados ao CDI e de curto prazo. Os 18 anos do Plano Real não foram suficientes para acabar com essa cultura.

O brasileiro sempre demonstrou uma grande passividade histórica. O País foi o último a acabar com a hiperinflação e com a escravidão. Então é natural que demore para entender a nova realidade dos juros, mas a experiência internacional mostra que isso vai acontecer. O Chile teve uma história econômica parecida com a brasileira, mas hoje eles investem predominantemente em ações. Em algum momento, o Brasil vai ter juro real zero. Hoje está em 2,5% ao ano. Ainda que seja um patamar elevado comparado ao de países desenvolvidos, essa taxa nunca foi tão baixa.

Uma hora ou outra, vai dar um clique na cabeça do brasileiro e ele vai perceber que o CDI é apenas para estacionar o dinheiro. A maior parte do dinheiro terá de ser investido em aplicações de longo prazo, crédito privado e ações. As pessoas não vão mais ficar felizes obtendo 90% do CDI com algum investimento. Vai acabar essa letargia.

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ECONOMIA BRASILEIRA

A economia brasileira tem um bom potencial, ainda que não seja algo brilhante. O Brasil não vai crescer 6% a 7%. O potencial é de 3% a 3,5% ao ano. Temos algumas vantagens. O Brasil é um país de pessoas otimistas, tem escala para produção, é homogêneo, não sofre com guerras nem atentados, há muitas riquezas naturais, há o pré-sal, somos ricos em energia limpa e celeiro do mundo.

Mas também há problemas, A carga tributária é a mais elevada dos emergentes, a legislação trabalhista atrapalha e há muitas taxas e burocracias sobre quem quer produzir. Tudo isso tem um custo que se reflete em um menor crescimento da economia. O governo não usou o aumento da carga tributária para 38% do PIB para elevar o investimento. Isso gera um custo que será pago pela sociedade.

BANCO CENTRAL
Dou nota 10 para o Banco Central. Eles estão reduzindo os juros e a inflação continua baixa. O que poderia ser feito é reduzir mais o centro da meta de inflação [que hoje é de 4,5%]. Entre todos os países que adotam o sistema de metas, a nossa é a mais alta do mundo.

O CENÁRIO GLOBAL
O mundo está em desaceleração. Os EUA devem crescer cerca de 1,5% neste ano. A Europa não vai estimular o crescimento econômico mundial. O Japão está estagnado. A China vai sair de um crescimento de 10% a 12% ao ano para uma taxa de cerca de 8%. A China ajudou muito o Brasil pelo aumento do preço das commodities. Eles, na verdade, foram protagonistas da maior história de crescimento da segunda metade do século 20. Cresceram investindo 40% a 50% do PIB ao ano. Nem durante a Segunda Guerra Mundial os EUA investiram tanto. O problema é que a China já não tem obras por fazer que gerem grandes ganhos de produtividade.

INFRAESTRUTURA
O Brasil fez exatamente o contrário da China. A infraestrutura está sempre atrasada em relação ao que deveria ter sido feito. A carga tributária poderia cair, mas, para isso, a sociedade tem que repensar se realmente vale a pena ter um Estado protetor que acaba cuidando de todo mundo. O eleitorado não demonstra querer menos gastos. Os políticos são gastadores por natureza e gastariam mesmo que a sociedade não demonstrasse querer isso. Só o eleitor pode pressionar os políticos a agir diferente.

ARGENTINA
O Brasil e a Argentina se espelharam durante muitos anos. No século passado, ambos tiveram governos populistas, ditaduras militares e dificuldades no combate à inflação. As coisas mudaram em 2001, quando a Argentina sofreu com o corralito [congelamento dos depósitos bancários], a corrida bancária e a moratória da dívida externa.

O governo brasileiro tem adotado uma postura de maior protecionismo e o intervencionismo, o que sempre atrapalha, mas não corremos o risco de virar uma Argentina. Tem principalmente o protecionismo com o setor de veículos, é algo que prejudica o consumidor. Quanto mais baratos são os carros, melhor seria para a sociedade.

Acho que a política correta que aumenta a produtividade de um país é reduzir as barreiras comerciais, principalmente no setor de informática. A Coreia do Sul e a Finlândia inovam, mas o Brasil, não. Acredito que a diferença seja a política de informática deles de tarifa zero para bens de informática. Um iPad custa o dobro no Brasil. O Peru e a Colômbia são os países que mais crescem na América do Sul. Ambos têm baixa carga tributária e políticas de redução das tarifas comerciais.

BRASIL X EUA
O Brasil é muito parecido com os EUA: tem dimensões continentais, uma classe média crescente que move a economia, uma população que sonha com a casa própria, pessoas de etnia europeia ou africana e sem civilizações indígenas organizadas. O que nos diferencia são os níveis de educação e proteção às patentes. Mas acredito que, como os Estados Unidos, caminhamos para juros reais zero e produtos de investimento mais estruturados.

IMÓVEIS
O volume de crédito no Chile equivale a 85% do PIB enquanto no Brasil não chega a 50%. É importante notar que a maior parte desse crédito é de curto prazo. O crédito imobiliário mostra isso. Era de 0,5% do PIB no início do Plano Real e agora está em torno de 4,5%. No Chile, o crédito imobiliário chega a 20%. Isso gera a possibilidade de estruturação de produtos financeiros ligados ao mercado imobiliário. Foi por isso que o BTG Pactual comprou a Brazilian Finance & Real Estate.