No Brasil, robôs de investimento não conseguem bater melhores fundos

Muito tem se falado sobre os robôs que investem seu dinheiro para você, mas, por ora, parece ser muito barulho por pouco, já que os bons fundos de investimento têm apresentado rentabilidades bem superiores com a mesma comodidade

Lara Rizério

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SÃO PAULO – Você confiaria seus investimentos a um robô? Mesmo que de uma forma ainda tímida, a possibilidade de delegar suas escolhas sobre investimentos vem ganhando espaço entre os brasileiros, ainda mais em meio ao surgimento de diversas fintechs que utilizam essa proposta com a promessa de associar uma boa rentabilidade com a “frieza” das máquinas. Em torno dessa alocação automatizada há muito hype e matérias nos maiores veículos de imprensa. Mas os robôs realmente conseguem bater os humanos quando o assunto é rentabilizar seu dinheiro? Ao menos por ora no Brasil a resposta é não.

Os robôs nada mais são do que algoritmos que acompanham os movimentos de mercado e calculam a melhor alocação de recursos. Apesar de parecer algo um tanto “sombrio”, essa automatização vem chegando aos investidores pessoas físicas de modo simplificado. Na maior parte dos casos, para ajustar o perfil de risco do investidor ao portfólio recomendado, as empresas que prestam esse serviço pedem que os investidores respondam a um questionário de perfil. Após identificar o menor ou maior tolerância ao risco, define-se a distribuição dos ativos em uma carteira mais conservadora ou mais arrojada.

Por um lado, os que delegam seus investimentos a robôs destacam a praticidade e a saída de cena do “fator-emoção” na hora de investir. Por outro lado, há quem aponte que os robôs ainda têm dificuldades em superar os gestores “reais”, ainda mais por conta da carteira bastante simples que muitos deles montam, formadas em muitos casos apenas por ETFs e títulos do Tesouro Direto.

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Preferências subjetivas à parte, o que interessa para o bom investidor é a rentabilidade. E os números coletados pelo InfoMoney mostram que os bons fundos de investimento oferecem a mesma comodidade dos robôs na hora de investir, só que apresentam retornos bem mais elevados.

O primeiro quadro abaixo mostra a rentabilidade das principais empresas de robôs de investimento do Brasil, dependendo do perfil do cliente, enquanto a segunda tabela simula um perfil de risco parecido em fundos de investimento geridos por humanos. Os dados revelam que cestas de bons fundos de investimento são capazes não apenas de bater os principais índices de referência do mercado como o CDI mas também os robôs de investimentos.

Consultor-robô Nível de risco da carteira

       (volatilidade)

       Rentabilidade

janeiro a julho de 2017

Acumulado em

12 meses

Custo anual
Magnetis 1 (0,08) 6,75% 12,92% 0,85% em média (dependendo do 
perfil de risco e quantidade de dinheiro
aplicada pelo cliente)
3 (2,98) 8,19% 13,86%
5 (7,3) 11,03% 15,67%
Vérios 1 (1) 6,49% 11,66% máximo de 0,95%
3 (3) 7,25% 12,38%
5 (5) 7,88% 12,98%
Warren

1 (0,16) 6,31% máximo de 0,85%
3 (2,72) 8,41%
5 (5,28) 11,07%
Carteira gerida por humanos (com rentabilidade líquida de taxas)
Carteira conservadora (equivalente ao risco 1): Apenas fundos de renda fixa
Fundo gerido

por “humano”

Volatilidade Rentabilidade
janeiro a julho de 2017
Acumulado em
12 meses
BTG Pactual Crédito Corporativo I FIC FI RF Crédito Privado 0,53% 7,73% 15,39%
CA Indosuez Vitesse FIRF Crédito Privado 0,13% 7,33% 14,16%
Bozano Top Crédito Privado Renda Fixa FI LP 0,29% 7,19% 14,08%
XP Investor FI Renda Fixa Crédito Privado LP 0,61% 6,99% 13,39%
Resultado da carteira 1 0,39% 7,31% 14,26%
Carteira moderada (equivalente ao risco 3): fundos de renda fixa e multimercados
Bahia AM Maraú FIC de FIM 9,04% 14,77% 26,58%
Pimco Income FIC FIM IE 2,71% 10,17% 18,02%
BTG Pactual Crédito Corporativo I FIC FI RF Crédito Privado 0,53% 7,73% 15,39%
CA Indosuez Vitesse FIRF Crédito Privado 0,13% 7,33% 14,16%
Resultado da carteira 3 3,10% 10% 18,54%
Carteira agressiva ((equivalente ao risco 5): Fundos de renda fixa, multimercados e ações
BTG Pactual Crédito Corporativo I FIC FI RF Crédito Privado 0,53% 7,73% 15,39%
Bahia AM Maraú FIC de FIM 9,04% 14,77% 26,58%
Pimco Income FIC FIM IE 2,71% 10,17% 18,02%
XP Dividendos FIA 19,26% 17,24% 16,77%
Resultado da carteira 5 7,89% 12,48% 19,19%

“O Brasil é um país que tem muitas distorções e os robôs acabam por não capturá-las como um gestor profissional”, afirma Gustavo Pires, head de fundos da XP Investimentos. Entre as distorções, está o fato do mercado nacional ainda operar com base em muitas notícias -o que foi agravado pelas eleições de 2014 e pela crise política dos últimos anos. Pires compara o mercado brasileiro, não tão desenvolvido, com o americano, em que há muita dificuldade em bater os benchmarks, como o S&P 500. Assim, no caso dos EUA, justifica-se a atuação de robôs, já que a performance dos gestores e dos robôs é similar no exterior a um custo mais baixo com os chamados algoritmos.

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 Já no Brasil, mesmo levando em conta a queda recente dos juros, a volatilidade se torna muito maior, o que torna difícil para o robô ter um resultado melhor que o gestor. Além disso, conforme aponta Pires, no caso dos EUA, a economia real é muito materializada na bolsa, com todos os setores muito bem representados no mercado de ações. “No caso brasileiro, há diversos setores enormes pouco representados na bolsa, como telecomunicações e agronegócio”.

Porém, conforme afirmou em entrevista ao InfoMoney o diretor de Relações com Investidores da Magnetis, uma das pioneiras no avanço dos robôs no Brasil, a proposta da empresa é prover ao investidor uma carteira bem diversificada. E, segundo Vinícius Maeda, outra vantagem é oferecer uma carteira com “proteção contra emoções”. “Se eu bato o carro, por exemplo, não transmito esse sentimento para as carteiras dos clientes ou, até num movimento mais dinâmico da economia, não transmito ou absorvo o movimento de ganância ou pânico”, afirma.

De acordo com o executivo, outra vantagem é um balanceamento automático das carteiras. “Os clientes não possuem um gerente de conta – entendemos que isso geraria limitações para os clientes. Temos algoritmos que monitoram isso para os clientes e avisam se há alguma necessidade de rebalanceamento das carteiras. Outro fator é a renovação automática dos títulos: por exemplo, se vencer uma LCA, uma LCI, automaticamente o sistema busca nas opções disponíveis qual é aquele título que paga a maior rentabilidade líquida”, diz Maeda.

Mas é importante lembrar que os fundos dão ao investidor o mesmo conforto que os robôs: há um profissional tomando as decisões por você, ele entende muito mais de mercado financeiro que a média, um profissional dificilmente vai se deixar levar por ondas de euforia ou pânico e toda a parte operacional de compras e vendas é feita por essa equipe. A diferença é que os bons fundos com gestão ativa conseguem superar os principais indicadores de mercado com consistência e que são pessoas com histórico vencedor muito mais longo que o dos robôs, que estão apenas começando a dar os primeiros passos no mercado.

Barreiras no mercado

Mesmo nos mercados desenvolvidos, é recorrente encontrar notícias de que, apesar de os robôs serem um segmento representativo, têm encontrado algumas barreiras para seu crescimento. Uma pesquisa feita pelo instituto Gallup no ano passado mostrou que os investidores dos EUA não veem essas ferramentas como um substituto a um conselheiro financeiro confiável. Quando solicitados a escolher, o maior segmento de investidores, 49%, continua preferindo ter um relacionamento forte com um consultor financeiro pessoal, enquanto 24% dizem que as ferramentas digitais são seus principais recursos de investimento.

Outra questão ressaltou o quanto os investidores seguem cautelosos com os robôs: 62% dos entrevistados queriam apenas um “conselheiro humano ou a maior parte humano”; já 27% preferiam confiar em um robô para a maioria das decisões, mas com “humanos” de plantão. Apenas 9% dos questionados queriam apenas um conselheiro digital.

Nesse sentido, a americana Betterment, pioneira no segmento de conselheiros robôs e que começou a operar em 2010, destaca em seu site que, caso se queira um “conselheiro” de investimentos humano, isso é possível, de forma a assim conquistar a confiança mesmo entre aqueles mais reticentes com os robôs. “Se você está procurando uma relação individual com um conselheiro financeiro dedicado, contamos com um profissional CFP (Certified Financial Planner – Planejador Financeiro Certificado, em tradução livre) independente que pode fornecer um planejamento financeiro mais regular e abrangente”, aponta no site.

“É difícil para muitos investidores que geraram um patrimônio entender que é um robô que está gerindo essas economias. Muitas vezes o investidor quer conversar com alguém, olhar no olho. Esse tipo de situação ligada ao pessoal é uma barreira grande e é o que parece ter ocorrido no mercado americano. Pode ser que isso mude, uma vez que o mundo está cada vez mais robotizado mas, por enquanto, ainda há estas barreiras”, afirma Pires.

Em 2015, quando o mercado de robôs ainda estava bastante embrionário no Brasil, o Citi havia apontado uma série de ressalvas, como a concorrência com empresas estabelecidas e a barreira para ganhar a confiança de clientes acima de 50 anos, que, em geral, são os maiores investidores.

Olhando para o cenário atual, a Magnetis, atualmente com 40 mil cadastros, não abre o volume captado e quantos investem efetivamente por robô, mas traça um perfil sobre quem aplica mais através dessa nova modalidade. “A maioria dos investidores é formada por homens, mas temos observado um crescente número de mulheres investidoras. A faixa etária é entre 28 e 40 anos, com investimento médio de R$ 40 mil. Avalio que muitos investidores jovens têm bastante interesse em aplicar, mas uma barreira é o valor mínimo da aplicação, de R$ 10 mil. Temos esse valor como mínimo em meio à preocupação em fazer uma carteira diversificada”, aponta Maeda.

Já Pires, da XP, ressalta que os investidores através de robôs são aqueles que possuem um perfil sofisticado e ativo nos investimentos, acompanha mais o mercado, também está numa plataforma de investimentos independente e quer estar na vanguarda, aceitando os ‘solavancos’ do início.

De acordo com o head de fundos da XP, este é um segmento que está em desenvolvimento e que pode crescer mais caso o mercado brasileiro também se desenvolva. Isso pode ocorrer à medida que um maior número de empresas representativas da economia brasileira entre na Bolsa, o Brasil conquiste um patamar de juros mais civilizado e os aplicadores unam cada vez mais a tecnologia aos investimentos.

Um dia o robô tomará o lugar?

Porém, engana-se quem pensa que, mesmo se os robôs ganharem cada vez mais espaço, os seres humanos serão deixados de lado. “Apesar de ter toda essa questão de automatização, ela não se cria por si só. Temos uma equipe robusta, um comitê de investimentos, uma equipe de consultores que ajuda a executar a estratégia. A tecnologia entra muito mais no processamento de dados e na execução, mas temos uma equipe por trás que faz a modelagem da estratégia”, afirma Maeda.

Essa é uma observação recorrente entre planejadores financeiros, que avaliam que o gestor é essencial para ajustar o comportamento do robô. Nesse caso, contudo, também se faz uma ressalva: caso a “recalibragem” dos robôs seja feita em uma frequência bastante grande, a essência de haver um robô investindo também passa a fazer pouco sentido, uma vez que um humano estaria recorrentemente “ajustando” o comportamento do robô.

Os robôs advisors podem ter um grande espaço para crescer, já que principalmente os mais jovens vêm buscando automatizar seus investimentos. Porém, eles ainda têm alguns desafios a enfrentar – o que se torna especialmente verdadeiro levando em conta as características do mercado nacional. Enquanto os robôs não apresentarem resultados mais consistentes que os de fundos de investimento, dificilmente eles deixarão de ser um serviço de nicho.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.